872 mil pessoas acima de 50 anos de idade estão com dose de reforço atrasada em Santa Catarina

14/03/2022 09:22

Por: Lauro Mattei[1]

Desde o início da pandemia da COVID-19 o país tem convivido com muitas contradições, especialmente em relação às medidas necessárias para combater a doença. Foi assim quando ainda não existia qualquer antídoto para frear a contaminação das pessoas e continuou sendo da mesma maneira após a descoberta e fabricação das vacinas necessárias para controlar a pandemia. Passado mais de um ano do início da imunização da população, ainda persistem dúvidas e inverdades sobre os efeitos dos imunizantes que estão sendo utilizados no país. Sem dúvida, tais fatos têm atuado negativamente no combate à doença, situação que pode ser observada em alguns indicadores específicos do processo imunizatório no estado de Santa Catarina que reportaremos na sequência.

Antes, porém, é importante frisar que a insistência para que o conjunto da população se mantenha imunizado mostra que é necessário pavimentar esse caminho (imunização geral) para se ter a chance concreta de controlar em definitivo a atual pandemia. Por isso, a ciência tem seguidamente confirmado a necessidade de doses de reforço dos imunizantes visando manter o maior número possível de pessoas protegidas, passo considerado essencial para cortar o círculo virtuoso do novo coronavírus. Além disso, a ciência também confirmou que as pessoas mais idosas e com comorbidades são os grupos sociais mais vulneráveis ao novo coronavírus. Por isso, esse público foi priorizado desde o início do programa de imunização da população do país.

Neste sentido, o objetivo do presente artigo é apresentar o cenário atual da vacinação das faixas etárias mais vulneráveis, à luz das informações disponíveis no Vacinômetro da Secretaria Estadual de Saúde (SES-SC) até o dia 12.03.2022, conforme Tabela 1. Inicialmente é importante enfatizar que o ponto de referência analítico de cada faixa etária específica é a quantidade de pessoas imunizadas com a primeira dose em cada uma das faixas consideradas, uma vez que a população alvo de cada uma dessas faixas estava assentada em estimativas populacionais, as quais foram realizadas devido à ausência de um Censo Demográfico atualizado. Além disso, é importante destacar, ainda, que a população acima de 60 anos foi o primeiro grupo prioritário, sendo que a maioria recebeu as duas doses até o mês de setembro de 2021. Como o prazo do reforço é de 4 meses, significa que todas as pessoas que fazem parte das faixas etárias consideradas como idosas já deveriam ter recebido a dose de reforço. Além disso, a última faixa etária considerada (50 a 59 anos) também já deveria ter concluída a aplicação da dose de reforço, conforme calendários de vacinação da Secretaria Estadual da Saúde.

Analisando as informações no sentido em que se iniciou o processo de imunização, verifica-se que na faixa etária de 80 anos ou mais de idade aproximadamente 97,6% do público alvo (143.870 pessoas) tomou a primeira dose. Já o percentual vacinado com a dose de reforço caiu para 74,5%, significando que mais de 34 mil pessoas dessa faixa etária podem não estar mais imunizadas e sujeitas aos efeitos de uma nova contaminação.

A faixa etária de 70 a 79 anos de idade teve um desempenho acima do programado em relação à primeira dose, uma vez que atingiu 103,9%, implicando na imunização de 331.123 pessoas. Já o percentual com a dose de reforço caiu para 84,3%, significando que mais de 62 mil pessoas dessa faixa etária também podem não estar mais imunizadas e sujeitas aos efeitos de uma nova contaminação.

Tabela 1: Evolução percentual da vacinação das pessoas com idade acima 50 anos no estado de Santa Catarina até 12.03.2022, segundo as diferentes dosagens.

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Fonte: Vacinômetro – SES/SC. Elaboração do autor

Já na faixa etária entre 60 e 69 anos de idade observa-se um problema, uma vez que das 657.060 pessoas que tomaram a primeira dose (104,5%) apenas 61,3% delas receberam a dose de reforço, implicando em um quantitativo de mais de 271 mil pessoas que podem não estar mais imunizados.

Finalmente, na faixa etária entre 50 e 59 anos de idade localiza-se um grave problema, uma vez que das 880.114 pessoas que tomaram a primeira dose (97,2%), apenas 41,5% receberam a dose de reforço até o momento, implicando em um quantitativo de mais de 500 mil pessoas que não estão completamente imunizados, transformando-se em potenciais vetores de circulação do coronavírus.

Em síntese, os dados analisados anteriormente revelam que do público acima de 50 anos de idade (composto por 2.012.167 pessoas), aproximadamente 43% está com processo imunizatório em atraso, podendo se transformar em vetor potencial de transmissão, fato que contribui para impedir o controle efetivo da pandemia no estado.

As consequências desse cenário ficaram visíveis nos meses de janeiro e fevereiro de 2022. Pelos registros oficiais constata-se que nesses dois meses ocorreram 1.182 óbitos no estado por Covid-19. Quando se estratifica essas informações por faixas etárias, nota-se que a grande maioria dessas mortes (90%) ocorreu exatamente nas faixas etárias de 50 anos de idade ou mais. Além disso, dados extraoficiais revelam que a maioria desses óbitos (1.057) era de pessoas não vacinadas e/ou com dose de reforço em atraso.

Considerando-se que a população catarinense ainda está sob os efeitos da nova onda de contágio provocada pela variante Ômicron e que recentemente camadas protetivas de prevenção à doença foram flexibilizadas pelas autoridades estaduais, torna-se cada vez mais difícil visualizar um cenário favorável ao controle efetivo da pandemia no estado.


[1] Professor titular do curso de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador geral do Necat/UFSC, Pesquisador do OPPA/CPDA/UFRRJ e membro da Comissão de Monitoramento da Covid-19 da UFSC. E-mail: l.mattei@ufsc.br. Artigo escrito em 13.03.2022.