Considerações da proposta de reforma da previdência dos servidores públicos do estado de Santa Catarina

03/08/2021 09:23

Por: Juliano Giassi Goularti[1]

Introdução

Este texto tem por objetivo fazer uma breve analise da reforma da previdência em Santa Catarina. Ao ser instituída no Brasil, a previdência social trouxe uma série de mudanças em termos quantitativos e qualitativos à vida dos beneficiários, o que a torna uma política essencial, contribuindo significativamente com a redução da desigualdade de renda no país. Se não fossem as rendas da previdência, os números de indigência e pobreza seriam maiores.

Ao contemplar um conjunto maior de políticas sociais, a previdência contribui com o crescimento econômico, uma vez que grande parte dos benefícios é destinada às pessoas mais empobrecidas. Isso faz com que uma quantia significativa desse valor permaneça no país. Com isso, há um aumento na geração de emprego e renda, no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), bem como na renda das famílias. Porém, o governo de Santa Catarina ao estabelecer uma tributação de 14% de aposentados e pensionistas que ganham até o teto do INSS (hoje estipulado em R$ 6.433,57 mil)[2] que estão há anos sem qualquer aumento salarial ou mesmo correção inflacionária, gerando ao longo do tempo perda de poder aquisitivo, menor poder de consumo e a consequente desaceleração da economia, irá rebaixar o poder de compra dessa massa de servidores, retardando ainda mais a retomada do crescimento econômico.

Dentro do objetivo do texto, apresentar alguns pontos centrais da reforma da previdência, pontos do substitutivo global reforma encaminhada pelo governador Carlos Moisés da Silva (Sem partido) ao Parlamento, também será apresentado um breve histórico das reformas passadas, com destaque para as realizadas no governo Luiz Henrique da Silveira (MDB), em 2007, e de Raimundo Colombo (PSD), em 2015, apresentação o cronograma de tramitação da reforma, breve passagem do déficit financeiro para depois falar da tributação de aposentados e pensionistas que ganham até o teto do INSS.

  1. Breve histórico das reformas da previdência dos servidores públicos estaduais de Santa Catarina

O Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina (Iprev), antigo Montepio dos Funcionários Públicos do Estado de Santa Catarina, instituído pela lei nº 825, de 1909, e depois modificado pela lei nº 369, de 1949, que passou a ser denominação de Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina (Ipesc), é o responsável por administra previdência dos servidores públicos estaduais.

Antigamente, Montepio contemplava plano de benefício de pensão por morte, sendo ampliados os beneficiários na linha descendente, ascendente e de dependentes designados pelo empregado público. Os recursos do Montepio eram ainda utilizados para empréstimo pessoal, financiamento habitacional, assistência médica, auxílios natalidade, casamento, farmácia e auxílio funeral. Por longos anos os recursos previdenciários não serviram somente para o pagamento de aposentadoria e pensão, mas custeavam benefícios distintos aos de previdência social. Foi somente em 1988 o estado de Santa Catarina adotou medidas de contenção e redução de benefícios “agregados e estranhos” ao conceito de previdência.

Embora a exigência para que os regimes próprios de previdência passassem a ser contributivo tenha ocorrido com a Emenda Constitucional nº 20, de 1998, no estado somente em 2004, ocorreu esta adequação, fixando alíquotas de contribuição para o custeio do Regime Previdenciário dos servidores ativos, inativos e pensionistas. Até o início dos anos 1990, a despesas financeira da previdência dos servidores estava vinculada ao Tesouro, de forma que no governo Kleinübing foi separada nunca conta própria. Quanto a alíquota, em 110 anos de previdência, a mínima do servidor foi de 5% e a máxima de 14%, enquanto a patronal 0% e 28%.

Quadro 1: Alíquotas previdenciárias

Q1

Fonte: Iprev. Elaboração do autor.

No quadro 1, observa-se que a alíquota do servidor, quando a patronal, nunca foi progressiva, isto é, não distinguindo a faixa salarial do servidor. No entanto, em perspectiva histórica, a lei nº 825, de 1909, criou o Montepio dos Funcionários, depois em 1962 a lei º 3.138 reformulou o Montepio criando o Ipesc (intervalo de 53 anos), mais tarde, no ano de 1994 leis complementar nº 129 (32 anos depois), em seguida, em 1999 a lei complementar nº 179 novamente reformou o Ipesc (intervalo de cinco anos) e, em 2004 (dez anos depois) uma nova lei complementar modificou o Ipesc. Depois de 2004, uma nova reforma foi realizada através da lei complementar nº 412, de 2008, isto é, quatro anos depois. Por fim, a última reforma foi realizada em 2015. Em 106 anos foram sete reformas estruturais, desconsiderando as mudanças pontuais.

As alterações no regime de previdência, que vão desde adequações até reestruturação, foram no sentido de ampliar direitos sociais como também retirar direitos sociais, como por exemplo a que tramita no Parlamento catarinense que pretende tributar aposentados e pensionistas que ganham acima de 1 (um) salário mínimo nacional (SM).

  1. Breve histórico das últimas duas das reformas da previdência: de 2007 e 2015

A reforma da previdência de 2007, governo Luiz Henrique da Silveira, foi apresentada no dia 18 de dezembro de 2007 e aprovado no dia 17 de junho de 2008, por 24 votos sim, 13 votos não e 0 abstenções. Em síntese, tramitou por um semestre na Alesc, sendo realizadas audiências públicas em todas as Secretarias de Desenvolvimento Regional, hoje extintas.

Com a aprovação da reforma, a lei complementar nº 412, de 2018, que dispõe sobre a organização do Regime Próprio de Previdência dos Servidores de Santa Catarina, o regime de previdência foi organizado em dois fundos distintos: fundo financeiro e fundo previdenciário. No primeiro estariam vinculados os servidores que ingressaram no serviço público estadual antes do início da vigência da lei e no segundo os servidores que ingressaram após o início da vigência da lei.

A reforma de 2015, governo Raimundo Colombo, foi apresentada no dia 24 de novembro de 2015, e aprovada no dia 10 de dezembro, por 30 votos sim, 08 votos não e 0 abstenções. Em síntese, foi uma tramitação célere. Com a “nova reforma” foi extinto o fundo previdenciário e incorporado ao fundo financeiro e implicou na reunião das massas de segurados. Além da fusão do fundo financeiro, que era deficitário, ao fundo previdenciário, superavitário, o governo elevou de forma gradual a contribuição dos servidores de 11% para 14%, e o aporte do governo estadual de 22% para 28% no mesmo período. O reajuste se deu de forma gradual, tanto para os servidores (12%, em 2016, 13%, em 2017 e 14%, em 2018) quanto para o estado (24%, em 2016, 26%, em 2017 e 28% em 2018).

Com isso, no mês de dezembro de 2015 e no exercício de 2016, foram utilizados recursos do extinto fundo previdenciário para o pagamento de benefícios de segurados vinculados ao fundo financeiro, acabando por reduzir significativamente as reservas financeiras até então acumuladas. Ou seja, o Iprev utilizou-se o montante de R$ 70 milhões no mês de dezembro de 2015 e de R$ 518.761.476,89 milhões no exercício de 2016, totalizando R$ 588.761.746,89 milhão vinculados ao fundo previdenciário, para pagamento de inativos e pensionistas vinculados ao fundo financeiro.

Mesmo com as reformas de 2007 e 2015, o passivo atuarial calculado para o exercício de 2010 foi de R$ 33,93 bilhões, para R$ 118,29 bilhões, em 2015, e R$ 217,83 bilhões, em 2020.

  1. Objetivo da proposta da reforma da previdência do governador Carlos Moisés da Silva

De acordo com o governo, o objetivo da reforma da previdência resume-se à redução do déficit atuarial e dos aportes do Tesouro estadual para a cobertura da insuficiência de financiamento do sistema previdenciário. Do somatório de receitas de contribuição e projetada a compensação, o déficit atuarial previsto é de R$ 149,5 bilhões. Com a reforma, o governo projeta reduzi-lo para R$ 112 bilhões, uma economia de R$ 37,5 bilhões, que viria de duas formas: tributação de aposentados e inativos que ganham até o teto o INSS e postergação do tempo de permanência do servidor na ativa.

Seguindo os mesmos parâmetros da reforma apresentada pelo governo federal (Emenda Constitucional nº 103, de 2019), e tendo em vista que a expectativa de vida de um catarinense é de 76 anos, o tesouro estadual desembolsa para cada servidor, em média, 23 anos em benefícios de aposentadoria, o governador destaca:

“A Reforma da Previdência é fundamental para o futuro de Santa Catarina. Essa adequação vai corrigir um problema histórico, o déficit financeiro crescente, e evitar que a situação se torne mais grave. Só assim conseguiremos garantir o pagamento dos benefícios aos servidores e atender às demandas básicas da população.”[3]

Assim, o texto da reforma encaminhado ao Parlamento inclui adequações na idade mínima para aposentadoria, tempo de contribuição, alíquotas, limite de isenção, cálculos do benefício da aposentadoria e da pensão e regra de transição. Além do critério do aumento da longevidade, as adequações para retiradas de direitos e garantias se justificam pelo momento histórico e conjuntural de ataque aos trabalhadores do serviço público ao longo dos últimos anos. Porém, considerando que o somatório de todos benefícios para aposentados e pensionistas resultou num desequilíbrio fiscal que vem exigindo do estado o aporte de recursos para cobertura da insuficiência financeira do sistema de previdência social estadual, o que dizer da dívida ativa dos devedores contumazes que soma R$ 21 bilhões[4] e dos privilégios fiscais estimados em R$ 14 bilhões[5] para 2020?

Além disso, algumas das alterações que se pretende introduzir com a reforma estão relacionadas com: impossibilidade de utilização do tempo de contribuição ficto para fins de aposentadoria; novas regras sobre acumulação de benefícios; regra permanente de aposentadorias voluntárias com elevação da idade mínima para concessão do benefício; previsão de modalidades voluntárias especiais para professores, policiais civis, agente penitenciário ou socioeducativo, assim como para segurados cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos; regras de transição para os servidores que ingressaram no serviço público até a edição da Emenda Constitucional nº 41, de 2003; nova metodologia para o cálculo da pensão por morte; concessão de pensão por morte com critérios diferenciados nos casos de óbito de policial civil e agente penitenciário ou socioeducativo em serviço, bem como para os dependentes portadores de deficiência; nova disciplina do abono de permanência e manutenção do pagamento para os segurados que já cumpriram os requisitos para a inativação; fixação de vacatio legis para o início dos efeitos das modificações estruturais nas regras de benefícios. Sendo esses os pontos da reforma, o governo está criando uma “categoria de inaposentaveis”.[6]

Portanto, a proposta visa aliviar a “pressão fiscal sofrida pelo estado”, uma vez que o envelhecimento da massa de servidores demonstra que Santa Catarina deverá continuar buscando alternativas de outras fontes de receita para a constante busca do equilíbrio financeiro e atuarial. E a primeira providência exigida é a fixação da idade mínima, conforme propõe a presente Proposta de Emenda à Constituição do estado de Santa Catarina.

  1. Tramitação da reforma da previdência do governador Carlos Moisés da Silva

Alinhado com as diretrizes estabelecidas na Emenda Constitucional nº 103, de 2019, em 29 de junho, o governo do estado de Santa Catarina encaminhou para o Parlamento catarinense uma proposta de reforma da previdência. Alterando a lei complementar nº 412, de 2008, que dispõe sobre a organização do Regime Próprio de Previdência dos Servidores, reforma foi oficializada através da proposta de emenda à constituição (PEC nº 0005.3, de2021) e do projeto de lei complementar nº 0010.9, de 2021.

Sob pressão para aprovar logo a reforma, o Parlamento montou um cronograma de tramitação célere com apenas uma audiência pública, realizada no dia 19 de julho, e a votação do parecer conclusivo da reforma no dia 03 de agosto e votação em plenário no dia seguinte. Os representantes de sindicatos, associações, federações, Poderes e órgãos interessados fizeram uso palavra na audiência pública criticando a reforma, com destaque para a retirada de direitos e a manutenção dos privilégios fiscais na forma de renúncia de receita que foi estimada, para 2022, em R$ 14 bilhões, crescimento de 120% em relação ao ano de 2021.

Com tramitação em conjunto, nas Comissões de Constituição e Justiça, de Finanças e Tributação e de Trabalho, Administração e Serviço Público, no dia 28 de julho foi apresentado o parecer preliminar da reforma na qual foram apresentadas 69 emendas de autoria parlamentar e de Bancadas e uma emenda substitutiva global pelo Poder Executivo.

  1. Apontamentos gerais do substitutivo global da reforma da previdência apresentado pelo governador Carlos Moisés da Silva

A redação proposta pelo substitutivo não trouxe mudanças significativas. A redação original foi mantida em grande parte, com pequenas mudanças para manter razoabilidade, entre as quais se destacam:

1) supressão da alíquota extraordinária; 2) instituição de isenção de contribuição previdenciária para beneficiários acometidos por doenças graves; 3) suavização das regras de transição de pontuação; 4) supressão de requisitos específicos de idade para fins de usufruto do benefício previdenciário com integralidade e paridade; 5) criação de nova regra de transição com a redução de tempo de idade para cada ano excedente de tempo de contribuição; 6) suavização da regra de transição do pedágio com a diminuição do pedágio de 100% para 50% do tempo faltante; 7) concessão de aposentadoria especial com paridade e integralidade para servidores civis da segurança pública com ingresso no serviço público em data anterior a 2004; 8) manutenção da forma de cálculo com base na média aritmética das 80% maiores salários de contribuição para os servidores com ingresso no serviço público até 1º de janeiro de 2022; 9) aperfeiçoamento da forma de cálculo proporcional de aposentadoria, partindo de 60% da média aritmética, com acréscimo de 1% (um ponto percentual) para cada ano completo de contribuição; 10) aumento da cota familiar de pensão por morte, e; 11) adequação de matérias com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.[7]

Para tanto, o governo manteve a intenção de cobrar os 14% de alíquota dos segurados e pensionistas que ganham a partir de um SM, retirando a isenção que era até o teto do INSS. O governador acatou ainda as emendas que beneficiam os grandes salários, pois, estes já contribuem com estes valores por ganharem mais que o teto do INSS, e sofrerão impacto menor em seus salários, isto é, foi suspensa a alíquota extraordinária. Ademais, o § 2º do art. 65 do art. 28 do PLC, que era somatório de pontos de 100 e 105 anos para homens e mulheres respectivamente foi modificado para 95 e 100 pontos, além de garantir que no cálculo dos benefícios do RPPS/SC da média será sobre 80% dos maiores salários de contribuição de todo o período contributivo do servidor, para quem ingressar até 1º janeiro de 2022 e 100% para quem ingressar a partir daí.

O governo acatou ainda a emenda dos servidores das forças de segurança: que tenham ingressado no serviço público por meio de cargo de provimento efetivo até 31 de dezembro de 2003, que não tenham feito a opção de que trata o § 16 do art. 40 da Constituição da República, e que venham a preencher os requisitos deste artigo. Será garantido o direito de se aposentar com proventos equivalentes à totalidade da remuneração do cargo efetivo em que se der a aposentadoria. Relativo aos servidores da segurança, decorrente do falecimento de servidor ativo, causada por acidente no exercício da função ou por agressão sofrida em razão de sua atividade, a pensão será vitalícia para o cônjuge ou companheiro.

Não obstante, também acatou emenda que alterou o caput do §4º do art. 70 no art. 32 do PLC nº 0010.9/2021, mantendo 60% da média aritmética e diminuindo para um 1% (um ponto percentual) para cada ano completo de contribuição do tempo todo e não só depois de 20 anos. Do substitutivo do governo, vale destacar que estipulou período adicional de contribuição correspondente a 50% do tempo que, em 1º de janeiro de 2022, faltaria para atingir o tempo mínimo de contribuição de 30 anos de contribuição, se mulher, e 35 anos de contribuição, se homem. Antes era 100%.

  1. Déficit financeiro da previdência

Em 10 anos, a insuficiência do Iprev cresceu 612,39%, saindo em 2009 de R$ 784 milhões para mais de R$ 4,8 bilhões, anuais. No total, em valores atualizados (IPCA), foram carreados para a previdência R$ 36 bilhões, no período. Segundo estudos atuariais, a reforma poderá promover uma economia de R$ 4,2 bilhões nos primeiros cinco anos ao tesouro estadual. Com o substitutivo, a economia gerada em relação à proposta original será menor, contribuindo para evolução sistemática do déficit da previdência, exigindo assim aporte de recursos para cobertura da insuficiência financeira, comprometendo a execução de políticas públicas basilares.

A reforma da previdência de 2021, governo Carlos Moisés da Silva, tem como objetivo reduzir o déficit atuarial e os aportes do Tesouro estadual para a cobertura da insuficiência de financiamento do sistema previdenciário. A suposta economia viria da tributação em 14% de aposentados e pensionistas. Aprovando a reforma, todos os servidores inativos e pensionistas que recebem acima de 1 SM serão forçados a contribuir. Mas a nova mudança no sistema previdenciário terá dificuldades em amenizar o déficit financeiro, pois além de excluir os militares, que representam 21,6% da despesa previdenciária, sua contribuição é de apenas 10,5%, contra 14% do pessoal civil.

Segundo estudos atuariais, a reforma poderá promover uma economia de R$ 4,2 bilhões nos primeiros cinco anos ao tesouro estadual. Possibilitando ao Estado a aplicação de referidos recursos em outras áreas sensíveis de atuação. Em relação ao déficit financeiro da previdência, o artigo “A reforma da Previdência em Santa Catarina: uma análise das questões financeiras” publicado no Blog do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense (NECAT) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) traz maiores informações.[8]

  1. Tributação de aposentados e pensionistas que ganham até o teto do INSS

Acompanhada da exposição de motivos, subscrita, conjuntamente, pelos titulares da Secretaria de Estado da Administração e do Iprev, o “Estudo Referencial – Reforma Previdência” aborda as questões que influenciam o déficit financeiro e atuarial. Para tanto, com a reforma o governo busca a adoção de medidas para garantir, de forma gradual, a sustentabilidade do sistema atual, permitindo a construção de um novo modelo evitando custos excessivos e comprometimento do pagamento dos benefícios dos aposentados e pensionistas.

Para isso, o art. 17 define que a contribuição previdenciária dos inativos e pensionistas será de 14% calculada sobre a parcela dos proventos e das pensões por morte que supere 1 SM. Segundo dados do Iprev, hoje 0,18% dos aposentados do Poder Executivo ganham 1 SM e 5,58% dos pensionistas, também do Executivo, ganham 1 SM. Ampliando a faixa de remuneração de 1 até 3 SM, são 10,99% dos aposentados e 29,27% dos pensionistas. Considerando a faixa remuneratória entre 3 e 6 SM, são 63,82% dos aposentados que estão dentro dessa faixa e 42,23% dos pensionistas. A tributação abaixo do teto do INSS irá atingir 74,99% dos aposentados e 77,08% dos pensionistas do Poder Executivo.

Em valores, o servidor que for aposentado ou pensionistas e ganhar 1 SM e recolher 14% estará contribuindo com R$ 154,00, ficando com uma renda líquida de R$ 946 mil. Ao longo do ano, considerando o décimo terceiro salário, esse servidor irá contribuir com R$ 2.002,00 ao Iprev. Isso quer dizer que ao final do ano esse servidor que antes não era tributado, irá contribuir com aproximadamente 2 SM ao Iprev. Já o servidor que recebe o teto do INSS, irá contribuir com R$ 900,69 mês e R$ 11.709,09 mil/ano, também considerando a tributação sobre o décimo terceiro salário. Isto é, a tributação em 14% não distingue se a renda mensal é baixa ou não: o tributo pago por um servidor que ganha 1 SM é justamente o mesmo que é pago pelo servidor que ganha R$ 39,2 mil, que é o teto dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Muito diferente do trabalhador da iniciativa privada, que consta com três percentuais de contribuição para o INSS, de acordo com a renda, 8%, 9% e 11%, com a alíquota uniforme de 14%. No fim, quem ganha menos sai mais prejudicado pelo modelo de tributação que, por isso, é chamado de regressivo, podendo ser caracterizado como injusto. Assim, o governo de Santa Catarina, ao ter uma alíquota única, impõe ao servidor público aposentado e pensionista uma carga tributária cada vez maior à medida que sua renda diminui.

Partindo do princípio de que o SM proposto pelo governo federal para 2021 terá o mesmo poder de compra do piso salarial de 2014, o peso da tributação na carteira do trabalhador – que além de ganhar menos e ter seu poder de compra rebaixado – será proporcionalmente maior do que o servidor que ganha acima do teto do INSS, ou mesmo o teto dos ministros do STF.

  1. Alíquota previdenciária nos estados

A maioria dos estados brasileiros já aprovou a alteração da alíquota previdenciária em percentual mínimo de 14%. Porém, destaque para a alíquota progressiva do estado do Maranhão que vai de 7,5% até 22%, Rio Grande do Sul, que vai de 9% até 14%, e alíquota única de 14,5% em Goiás.

Quadro 2: Alíquota previdenciária nos estados brasileiros

Q2

Elaboração do autor.

No Quadro 2, observa que nenhum estado da federação mantém uma alíquota menor de 14%. Santa Catarina foi pioneiro em elevar a alíquota previdenciária de 11% para 14%. Relativo à tributação de inativos que ganham abaixo do teto do INSS, destaca-se o estado do Alagoas que não tributa professores aposentados e pensionistas, Ceará que tributa em 14% inativos que ganha acima de 2 SM, e Mato Grosso e Paraná que tributam em 14% inativos que recebem acima de 3 SM. Em meio a tantos projetos de reforma, a previdência dos servidores públicos estaduais de Santa Catarina, assim como de alguns estados brasileiros, é injusta na sua tributação.

Considerações finais

No debate constitucional, o legislador constituinte estabeleceu um sistema de seguridade social universal, solidário e baseado em princípios redistributivos. Contrariando a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, inegavelmente, a proposta de reforma ao tributar servidores ativos e inativos que ganham 1 SM, ou até 2 SM ou 3 SM, irá aumentar o contingente de trabalhadores que terão sua renda rebaixada e dificuldades para mandar as necessidades básicas de uma mínima qualidade de vida.

Considerando a previdência como o principal mecanismo de proteção social, a reforma do governador Carlos Moisés da Silva, como suposto antídoto para o “rombo” previdenciário e presumida vacina contra a crise das finanças públicas, na sua essência e prática, trata de punir servidores aposentados e pensionistas que recebem abaixo do teto do INSS. Neste sentido, está se realizando uma reforma para excluir, e não para incluir.

Diante disso, podemos dizer que a tributação para essa camada de trabalhadores irá colocar uma parcela expressiva da população catarinense em condições de vulnerabilidade e de total (des)proteção social, isso porque estão há anos sem reajuste salarial, a inflação já corroeu parte expressiva de sua renda disponível e, agora, a tributação de 14% irá rebaixar ainda mais sua renda.


[1] Doutor pelo Instituto de Economia da UNICAMP e pesquisador do NECAT/UFSC.

[2] O teto do INSS é reajustado tendo como base o INPC, Índice Nacional de Preços ao Consumidor.

[3] Cf: https://www.sc.gov.br/noticias/temas/desenvolvimento-economico/governo-do-estado-encaminha-projeto-de-reforma-da-previdencia-a-assembleia-legislativa

[4] Quando empresas sonegam impostos, a população é diretamente prejudicada, pois são perdidos valores essenciais para a realização de investimentos fundamentais. Fortunas estão sendo constituídas e multiplicadas por poucas e grandes empresas com o não recolhimento do tributo, isto é, do dinheiro público. Desta forma, este artigo faz uma analogia aos poucos e grandes devedores do fisco como “barões da dívida”, uma designação aplicável de modo geral aos capitalistas contemporâneos, aos grandes devedores do fisco estadual. Estes “barões da dívida”, termo aplicado a ricos e poderosos empresários que devem bilhões de reais ao fisco, os homens de negócios erguem impérios, livravam-se da concorrência, mantém preços elevados e pagam salários baixos por estabelecer relações de poder dentro e fora das instituições estatais que abrem possibilidades de concessão de apoio financeiro para realização lucrativa dos negócios.

[5] Cf: https://revistanecat.ufsc.br/index.php/revistanecat/article/view/4660

[6] Cf: http://agenciaal.alesc.sc.gov.br/index.php/gabinetes_single/naeo-podemos-criar-a-categoria-dos-inaposentaveis-diz-luciane-em-ap-sobre-r

[7] Mensagem nº 781, de 2021, da emenda substitutiva global ao projeto de lei complementar nº 0010.9/2021, que altera a lei complementar nº 412, de 2008, que dispõe sobre a organização do regime próprio de previdência dos servidores do estado de Santa Catarina.

[8] https://necat.ufsc.br/a-reforma-da-previdencia-em-santa-catarina-uma-analise-das-questoes-financeiras/