Dez perguntas que o governador ainda precisa responder aos catarinenses

17/04/2020 10:00

Por: Lauro Mattei ¹

Desde que surgiu a epidemia provocada pelo novo coronavírus, na China no final de 2019, diversas medidas vêm sendo adotadas para combater a doença, denominada de COVID-19. Assim que se transformou em pandemia global, a Organização Mundial da Saúde (OMS-ONU) anunciou que a melhor forma de controlar a expansão dessa pandemia, dado a inexistência de um medicamento eficaz para seu tratamento, é a adoção do distanciamento e isolamento social.

Para a OMS, a definição de pandemia é utilizada quando uma doença infecciosa se espalha rapidamente e afeta um grande número de pessoas em todo globo terrestre. Essa decretação de pandemia, na verdade, serve para alertar os chefes de Estados sobre a gravidade do problema, bem como sugerir a necessidade de se fazer investimentos e melhorias na infraestrutura de saúde para evitar a sobrecarga dos sistemas públicos que prestam esse serviço num período de tempo bastante curto, fato que poderia provocar o caos social.

Após o surgimento dos primeiros casos no Brasil (final de fevereiro de 2020), o Ministério da Saúde decidiu seguir os protocolos internacionais e as próprias recomendações da OMS, cujo foco de ação é voltado à contenção da curva de crescimento do contágio epidêmico. Para tanto, a medida indicada – e que está sendo adotada pela maioria dos países afetados pela pandemia – foi a do isolamento e distanciamento social. Registre-se que este assunto se transformou em um grave caso político no país, sobretudo em função do posicionamento contrário a essa medida por parte do ignóbil presidente da república.

Desde o momento da confirmação dessa epidemia, dois movimentos comportamentais opostos de autoridades mundiais são perfeitamente observáveis. Por um lado, temos o caso italiano – país que adotou medidas de contenção de contágio pouca abrangentes e as flexibilizou antes mesmo da ascendência da curva da doença – e o caso dos EUA, cujo presidente fez desdenhas em relação à doença, chegando ao cúmulo de afirmar que a recessão econômica provocada pelas medidas de isolamento social adotadas por diversos governadores iria provocar mais mortes que o novo coronavírus. Hoje a realidade está sendo cruel com a população norte-americana decorrente dessa insanidade do presidente Trump, uma vez que milhares de mortes estão ocorrendo todos os dias naquele país.

Por outro lado, temos o caso da cidade chinesa de Wuhan (epicentro inicial da doença) que impôs um controle extremamente rigoroso de distanciamento e isolamento social como forma de controlar a epidemia, o que ocorreu durante três meses após o surgimento dos primeiros casos. Além disso, temos o caso da Coreia do Sul que, além de adotar as medidas recomendadas pela OMS, rapidamente adotou um sistema de testagem em massa de sua população, medidas estas que colocaram a situação sobre controle naquele país.

De um modo geral, o que esses exemplos mundiais estão nos ensinando é que o custo econômico e social poderá ser maior no futuro, caso medidas de distanciamento e isolamento sejam insuficientes e/ou revogadas antecipadamente sem qualquer garantia que a epidemia esteja sob controle das autoridades sanitárias.

Santa Catarina foi uma das primeiras unidades da federação a seguir, ainda em 17.03.20, as recomendações da OMS e do Ministério da Saúde do Brasil. Após três semanas de distanciamento e isolamento social, observa-se que ainda não houve um impulso expressivo do número de pessoas infectadas. Esse fato não quer dizer, em hipótese alguma, que a doença está sob controle, uma vez que não existe uma testagem mais ampla da população, ao mesmo tempo em que as informações disponíveis são bastante precárias, conforme demonstrou estudo recente em todas as unidades da federação².

Diante do fato de que o governo catarinense vem, desde o início do mês de abril, flexibilizando as medidas adotadas com base em reivindicações de setores econômicos específicos e sem respaldo do que é preconizado também por entidades científicas do próprio estado catarinense, formulamos um conjunto de questionamentos que gostaríamos que fosse respondido pelo senhor governador o mais breve possível. Eis a lista de questões:

1) Quantos leitos hospitalares existia em SC antes do início da quarentena e quantos existem atualmente?

2) Quantos leitos hospitalares dotados com equipamentos de respiração existiam em SC antes da quarentena e quantos existem atualmente?

3) Quantos servidores da área de saúde (médicos, enfermeiros, atendentes de enfermagem e demais profissionais vinculados aos serviços públicos de saúde) existiam antes da quarentena em SC e quanto existem atualmente?

4) Quantos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) existiam antes da quarenta em SC e quantos existem atualmente?

5) Quantas máscaras para os profissionais de serviços de saúde foram adquiridas durante a quarentena no estado de Santa Catarina?

6) Quantos kits para a realização de exames da população de SC foram adquiridos durante a quarentena?

7) Quantos testes massivos foram feitos durante a quarentena em SC, a exemplo do que vem ocorrendo em outras unidades da federação?

8) Quantos postos drive thru foram implantados em SC durante a quarentena para medir, pelo menos, a temperatura corporal das pessoas, a exemplo do que vem sendo feito em outras unidades da federação?

9) Qual o montante de recursos financeiros do governo de Santa Catarina foi destinado às ações específicas de combate à COVID-19 durante a quarentena?

10) Qual o montante de recursos financeiros foi aportado ao estado de SC durante a quarentena, por parte do governo federa?

Entendemos que respostas objetivas e efetivas a esses questionamentos são essenciais para se entender melhor o reposicionamento do governo estadual em relação às medidas de distanciamento e isolamento social implementadas a partir de 17/03/20 e que começaram a ser flexibilizadas à luz do lobby de diversos segmentos econômicos e sociais.

Por fim, esperamos que os equívocos italianos e a desgraça norte americana não sejam o caminho que Santa Catarina terá de seguir brevemente.


¹ – Professor da UFSC. Email: l.mattei@ufsc.br

² – Estudo está disponível em: Textos para Discussão (Texto para Discussão n. 036/20)