Novas empresas e empresas de grande porte foram as principais responsáveis pela recuperação recente do emprego formal em Santa Catarina

26/11/2021 18:37

Por: Victor Hugo Azevedo Nass e Vicente Loeblein Heinen

Nas nossas análises sobre o emprego formal durante a crise da Covid-19 e sua recuperação, uma variável que recebeu pouco destaque foi a do tamanho das empresas, que não é disponibilizada no Painel de Informações do Ministério da Economia. Para cobrir essa lacuna, o presente texto se propõe a analisar o comportamento dessa variável desde o início de 2020, visando investigar como cada porte de empresa foi impactado pela crise e em que medida se recuperou de tais impactos.

Para isso, o texto se dividirá em três partes. Buscando identificar a importância de cada faixa de tamanho das empresas para o mercado formal de trabalho catarinense, a primeira parte compara a distribuição do estoque de empregos formais por porte de empresas no Brasil e em Santa Catarina. Tendo em vista que as séries históricas mais atuais – provenientes do Novo Caged (Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) – não oferecem informações sobre tais estoques, nesta parte são usados os dados da última RAIS (Relação Anual  de Informações Sociais), referentes a 2019. Em seguida, parte-se para uma análise do saldo de empregos formais por porte de empresa no período de janeiro de 2020 a setembro de 2021, a partir dos dados do Novo Caged. Por fim, a terceira parte junta as análises anteriores ao estabelecer um índice que permite acompanhar o crescimento relativo de cada  faixa de tamanho de empresas durante a pandemia.

A Tabela 1 apresenta o estoque de postos formais de trabalho distribuídos pelo tamanho das empresas no Brasil e em Santa Catarina de acordo com os dados da RAIS 2019. Tanto no âmbito nacional quanto regional, a faixa que mais aglutina trabalhadores é a de empresas com mil ou mais trabalhadores. O Brasil concentra 24,4% do estoque de vagas formais em empresas desse tamanho, enquanto em Santa Catarina essa participação é de 17,4%. Chama a atenção a diferença dessa concentração, uma vez que o Brasil aparece com 7 p.p. (pontos percentuais) a mais que o estado catarinense. No mesmo sentido, nota-se que o mercado formal de trabalho brasileiro também é mais concentrado na faixa das empresas com entre 500 e 999 funcionários (8,2%, contra 7,2% de Santa Catarina).

Tabela 1 – estoque de postos de trabalho formais por tamanho de estabelecimento (Brasil e Santa Catarina, 2019)

estoque de empregados - rais - 2019

Fonte: Rais

Mas essa diferença vai sendo invertida nas menores faixas. Santa Catarina supera a concentração nacional nas primeiras 6 faixas, isto é, empresas que têm de 0 a 249 trabalhadores, onde o país concentra de 58,9% dos seus trabalhadores formais, enquanto Santa Catarina, 67,1%, uma diferença de 8,2 p.p a mais para o estado. Esses dados mostram que o mercado formal de trabalho catarinense é muito mais concentrado em empresas de menor porte. Já no que se refere às empresas da faixa de 250 a 499 trabalhadores, a distribuição é a mesma em ambas regiões (8,2%).

Agora que já está clara a importância de cada faixa do emprego formal em Santa Catarina, pode-se analisar o comportamento do estado de janeiro de 2020 até os últimos dados disponíveis, isto é, setembro de 2021. O primeiro dado a ser destacado na Tabela 2 é que em todos os meses os novos estabelecimentos – isto é, aqueles que possuíam nenhum vínculo no início de cada ano civil – lideraram os saldos. Esse resultado não chega a ser uma surpresa, uma vez que essas firmas tendem a não apresentar grande volume de desligamentos, justamente por terem começado a contratar há pouco tempo. O único mês em que o resultado dessa faixa não foi positivo foi precisamente o momento mais crítico da crise, ou seja, em abril de 2020, quando seu saldo foi negativo em 263 vagas, revelando que sequer as empresas recém-abertas escaparam ao cenário generalizado de fechamento de vagas.

Tabela 2 – saldos por tamanho de estabelecimento (Santa Catarina, 2020 e 2021)

todos os saldos

Fonte: Novo Caged (2021); Elaboração: NECAT/UFSC

Nota: O tamanho da empresa se refere ao número de vínculos ativos que ela possuía em janeiro de cada ano.

Na sequência, as faixas que menos sofreram com a crise foram as de mil ou mais (que só em abril de 2020 teve saldo negativo) e de 500 a 999 funcionários (que teve 3 meses de saldo negativo). A faixa de 250 a 499 empregados, mesmo com mais meses de saldo negativo, conseguiu recuperar suas perdas ainda em 2020. Com isso, essas faixas fecharam 2020 com saldos de 16,9 mil, 5,3 mil e 9,4 mil vagas, respectivamente.

Os bons resultados das grandes empresas se mantiveram nos três primeiros trimestres de 2021, quando foram registrados novos saldos positivos, agora de 13,4 mil, 12,2 mil e 10,7 mil vínculos, nesta ordem.

As faixas que abrangem de 1 a 249 vínculos, ou seja, as principais empregadores do estado, foram as que mais registraram quedas em 2020, principalmente entre março e junho. Mesmo com cinco ou seis meses de resultados positivos, todas essas faixas fecharam 2020 ainda com saldos negativos, com destaque para a perda de aproximadamente 19 mil vínculos nas empresas com de 5 a 19 funcionários. Em grande medida, esse resultado também é enviesado pela metodologia da base de dados, uma vez que esses déficits podem ter sido cobertos por novas pequenas empresas criadas. Contudo, esse não parece ser o caso, uma vez que a participação das empresas com até 249 funcionários no total de admissões em 2020 foi de cerca de 75%, ficando significativamente abaixo dos 82% registrados no Caged antigo tanto em 2018, quanto em 2019[1].

Já em 2021, o cenário tem sido significativamente distinto, tendo em vista a forte retomada do emprego formal na faixa de 20 a 49 vínculos (15,8 mil novas vagas); de 1 a 4 vínculos (15,7 mil); e de 50 a 99 vínculos (13,2 mil). Isso indica que é precisamente a recuperação dos estabelecimentos de pequeno e médio porte – muito vinculados ao setor de serviços – que tem puxado o crescimento do mercado formal de trabalho catarinense ao longo deste ano.

No total geral (acumulado do início de 2020 até setembro de 2021), os novos estabelecimentos (sem vínculos) foram responsáveis por mais da metade do saldo do período. Naturalmente, esse resultado é enviesado pelo fato dessas empresas registrarem poucos desligamentos. Entretanto, se considerarmos somente as admissões, nota-se que seu desempenho se mantém em linha com as tendências prévias à pandemia, o que revela que a abertura de vagas em novas empresas foi relativamente pouco prejudicada[2], além de ter sido fundamental para a expansão do emprego formal em 2021.

O Gráfico 1 permite visualizar melhor essas tendências, ponderando o saldo de cada faixa de tamanho de empresa pelo seu estoque de empregos formais. Com o início da pandemia, as empresas com menos funcionários foram as que mais fecharam postos formais de trabalho, enquanto que as maiores, que ocupam a faixa de mais de 500 funcionários, mantiveram a estabilidade no período mais grave da crise, passando a expandir-se  na segunda metade de 2020 e seguindo trajetória de crescimento em 2021.

Gráfico 1 – índice dos saldos por tamanho de estabelecimento (Santa Catarina, dez.19 = 100)*

grafico-tam-estab-novo-caged

Fonte: Rais(2019); Novo Caged (2021); Elaboração: NECAT/UFSC

* Para criar esse número índice foram cruzadas as bases da RAIS com as do Novo Caged, juntando assim os estoques de dezembro de 2019 e os saldos de janeiro de 2020 para frente, de acordo com as faixas de tamanho das empresas.

As faixas de 50 a 499 funcionários também sofreram bastante no início da pandemia, com uma queda bem acentuada, mas que foi revertida muito antes e muito mais rápido do que as faixas menores.

Como  resultado final do período analisado temos que as empresas com menos de 50 funcionários cresceram de 1 a 3%, as de 50 até 499, 6% e as com mais de 500 funcionários 9%, aumentando sua participação no agregado total. Embora não seja possível estabelecer uma medida de crescimento relativo para as novas empresas, vale destacar que elas intensificaram o crescimento das empresas de menor porte, provavelmente aproximando-as dos resultados das empresas maiores em 2021.

Considerações finais

As empresas de pequeno porte foram as que mais sentiram os impactos macroeconômicos causados pela pandemia do coronavírus. No que diz respeito ao mercado formal de trabalho, essa tendência se refletiu no fato de que só em 2021 essas empresas conseguiram retornar aos níveis de emprego pré-pandemia. Por outro lado, elas também foram as principais responsáveis pela expansão do emprego formal nos últimos meses, juntamente com os novos estabelecimentos, que tiveram os maiores saldos acumulados desde o início da pandemia. Já as grandes empresas, não apenas quase não perderam postos formais de trabalho em 2020, como conseguiram até mesmo aumentar o número de funcionários, destacadamente entre aquelas que possuíam mais de mil funcionários. Sendo assim, o resultado final é o de as maiores empresas aumentaram a sua participação no agregado total de empregos formais do estado durante o período analisado.


[1] CAGED. Caged Estatístico ID. PDET, 2020.

[2] Embora a versão antiga do Caged não informasse o número de admissões em empresas sem vínculos, vale notar que a participação daquelas que possuíam até 4 funcionários no total de admissões foi de 22% tanto em 2018, quanto em 2019. Considerando os dados do Novo Caged para a mesma faixa, obtém-se um percentual levemente inferior, de 21%. Para mais detalhes, ver SANTOS; ARUTO. O Novo CAGED e o emprego formal em Santa Catarina em 2020: uma análise a partir das categorias de emprego e de tamanho dos estabelecimentos. TD 01/2021, SDE/SC, 2021.