Produção industrial catarinense apresentou forte queda no mês de agosto de 2022

26/10/2022 14:03

Matheus Rosa*

Os resultados da Pesquisa Industrial Mensal do IBGE (PIM-PF/IBGE) referentes ao desempenho de agosto/22, recentemente divulgados, mostraram um quadro de manutenção da tendência de estagnação do setor industrial em nível nacional com quedas dispersas em algumas Unidades da Federação (UFs). Em Santa Catarina, especialmente, registrou-se a considerável retração de -4,3% em relação ao nível de julho/22, anulando uma sequência expansiva que estava consolidada desde maio/22 na série mensal com ajuste sazonal.

No cenário regional ocorreram fortes disparidades entre os estados, com o registro de 7 expansões e 7 retrações. Os melhores resultados se concentraram no Amazonas (7,0%), Rio de Janeiro (3,3%), São Paulo (2,6%) e Mato Grosso (2,1%), enquanto as variações registradas no Pará (-6,2%), em Santa Catarina (-4,8%), no Espírito Santo (-3,9%) e na Bahia (-2,8%) caracterizaram as maiores retrações.

Em síntese, os números da produção industrial de agosto/22 mostram a manutenção de um ritmo produtivo arrefecido, o que pode ser consequência dos números ainda elevados do desemprego e da inflação e da continuidade da política monetária restritiva, fatores que deprimem a demanda agregada e desestimulam a realização de novos investimentos. Além disso, a expansão dos estoques que se verificou nos últimos meses pode também estar atuando como elemento negativo, uma vez que a existência de produção não escoada condiciona uma redução do ritmo produtivo.

No texto que segue são analisados os resultados da PIM-PF/IBGE referentes a agosto/22, com foco no cenário nacional e catarinense. Para além dos dados agregados, destacar-se-á também o cenário entre os setores de atividades da indústria, por Grande Categoria Econômica (CGCE) e pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2.0).

Mais do mesmo: produção industrial no Brasil se mantém desaquecida em agosto de 2022

O Gráfico 1 apresenta a trajetória da produção física industrial no Brasil desde janeiro de 2020. Após mais de dois anos de pandemia, num período com tendências distintas que se intercalaram no bojo das oscilações macroeconômicas, o índice de atividade industrial se encontra em patamar bastante similar ao verificado no início de 2020, sendo a tendência de 2022 relativamente estável, porém com uma característica marcante: crescimento quase nulo no ano. Com a retração de agosto, o índice retornou a um nível inferior ao patamar pré-pandemia, uma vez que a comparação com fevereiro de 2020 ficou negativa em -1,5%.

Gráfico 1: Índice de produção física industrial, Brasil (2020, ago/2022).

Fonte: PIM-PF/IBGE. Elaboração: Necat/UFSC.

Os resultados da produção física nos últimos doze meses constam na Tabela 1, a partir das distintas séries cultivadas pela PIM-PF/IBGE. Em agosto, o resultado da série mensal com ajuste sazonal foi retrativo em -0,6% na comparação com julho. Com isso, essa série apresenta registro de 5 expansões e 3 retrações ao longo do ano, sendo todas, contudo, de baixa magnitude, indicando uma certa estabilidade do ritmo produtivo pela perspectiva mensal.

Já pela ótica mensal interanual, o resultado é positivo, sendo de 2,8% a expansão a partir da base de agosto de 2021. Esse é o primeiro dado claramente expansivo registrado na série no ano, o que mostra que se pode estar iniciando uma reversão de tendência em direção a um melhor cenário na comparação interanual, ainda que durante os seis primeiros meses do ano a série tenha ilustrado um quadro distinto. Regionalmente, por fim, o saldo nessa série foi de 9 expansões e 5 retrações, sendo os destaques positivos localizados em Mato Grosso (29,9%), Amazonas (13,4%) e Rio de Janeiro (6,4%). Espírito Santo (-12,2%), Pará (-8,7%) e Ceará (-4,7%), por outro lado, registraram os piores resultados.

Tabela 1: Variação da atividade industrial no Brasil em diversos períodos

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat-UFSC. 

Em relação aos saldos acumulados, houve retrações nas duas séries disponíveis. Pela perspectiva anual, a retração foi de -1,3% na comparação com o acumulado do mesmo período de 2021, resultado que mantém o registro negativo nessa série que ainda não apresentou expansões no ano. A comparação com o acumulado dos últimos doze meses, por sua vez, consolidou retração de -2,7%, mantendo a sequência de retrações que se verifica desde abril, porém regredindo em um ritmo menor daquele registrado em julho/22.

Nestas condições, nota-se que o setor industrial nacional apresentou nos primeiros oito meses do ano uma clara tendência de estagnação, com variações de baixa magnitude na série mensal com ajuste sazonal e perdas acumuladas em relação a 2021. É nítido que a conjuntura de demanda arrefecida em consequência dos juros elevados, do desemprego e da inflação – estes dois últimos que se mantém elevados a despeito das recuperações nos últimos meses – está se refletindo num ritmo produtivo reduzido e que esboça poucos sinais de sustentação de crescimento para os próximos meses. Soma-se a isso, ainda, o aumento nos níveis de estoques que se verificou em julho e agosto, fator que também desestimula o nível produtivo e contribui para a debilidade dos resultados agregados. (IEDI, 2022).

Setorialmente, esse contexto se dá como é ilustrado pela Tabela 2, a partir da CGCE. Em agosto/22, as indústrias produtoras de bens de capital e de bens de consumo duráveis expandiram frente aos resultados de julho, com expansões de 5,2% e 6,1%, respectivamente. Esse resultado é positivo, pois se concentra em dois setores que usualmente são mais capazes de gerar impactos em cadeia a partir de seu incremento produtivo. Bens intermediários e bens de consumo não duráveis, por outro lado, regrediram com retrações de -1,4% em ambos os casos. O quadro anual por essa mesma classificação, contudo, mostra um cenário eminentemente negativo: todos os setores regrediram, sendo a maior perda registrada em bens de consumo duráveis, com variação de -7,2%, o que indica que a expansão de curto prazo registrada nesse macrossetor, ainda que positiva, se situe no contexto de um ano de perdas.

Tabela 2: Variação da atividade industrial do Brasil em vários períodos, por Grande Categoria Econômica, em agosto de 2022

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

A Tabela 3 apresenta uma visão complementar ao quadro setorial, a partir dos setores de atividades categorizados na CNAE 2.0. Dos 25 setores da indústria de transformação, 18 apresentaram expansões na série mensal com ajuste sazonal em agosto/22, consolidando um cenário positivo que teve como principais motores as variações de fabricação de máquinas e equipamentos (12,4%), veículos automotores, reboques e carrocerias (10,8%) e produtos farmoquímicos e farmacêuticos (9,9%). Entre os sete setores que regrediram, destacam-se as retrações de produtos têxteis (-4,6%), coque, produtos derivados do petróleo e de biocombustíveis (-4,2%) e produtos alimentícios (-2,6%), este última que contribuiu para o fraco resultado agregado por conta de sua razoável participação no parque industrial nacional.

Tabela 3: Produção Física Industrial do Brasil por Setores de Atividades, mês a mês com ajuste sazonal

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Já no escopo anual, o desempenho dos setores de atividades da indústria de transformação é sintetizado pelo Gráfico 2. Dos 25 grupos presentes na pesquisa, apenas 9 possuem acumulados positivos na comparação com os acumulados do mesmo período de 2021, sendo as atividades de coque e derivados do petróleo (9,4%), produtos de fumo (7,2%) e outros equipamentos de transporte (6,7%) as mais expansivas. Por outro lado,  Móveis (-18,5%), produtos têxteis (-13,4%) e máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-12,1%) lideram o movimento de retração que está consolidado na maior parte dos setores.

Gráfico 2: Produção física industrial no Brasil, por setores de atividades, acumulado no ano (2022)

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Por fim, pode-se também observar a composição das taxas de crescimento a partir dos setores de atividades da indústria de transformação, conforme mostra a Tabela 4. Pela perspectiva anual, se destaca a contribuição de coque e produtos derivados do petróleo, que contribuiu com 1,04 p.p. para a consolidação do resultado acumulado da indústria geral, se situando bastante a frente dos demais. Fabricação de bebidas (0,17 p.p.), outros produtos químicos (0,14 p.p.) e produtos alimentícios (0,12 p.p.) também contribuíram para a formação da variação expansiva. Negativamente aparecem em maior magnitude as participações de produtos de metal (-0,37 p.p.), Metalurgia (-0,31 p.p), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-0,29 p.p.) e produtos de borracha e material plástico (-0,26 p.p).[1] A composição da taxa de crescimento na série mensal interanual e no acumulado de doze meses também pode ser consultada na Tabela 4.

Tabela 4: Composição da taxa de crescimento da indústria geral, agosto de 2022

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Na contramão dos últimos meses, produção industrial catarinense regride expressivamente em agosto/2022

A produção física industrial em Santa Catarina se destacou, em relação a maior parte das UFs e ao agregado nacional, por ter esboçado uma trajetória acelerada de recomposição das perdas provocadas nos meses de março e abril de 2020, além de ter se mantido acima do nível pré-pandêmico na maior parte do tempo desde a deflagração da pandemia. Todavia, é sintomática a constatação de que após setembro de 2020, mês no qual o setor retomou o nível produtivo de fevereiro, apenas em dois meses (outubro/21 e março/22) o índice de produção física retornou para níveis inferiores ao pré-pandemia. O saldo dessa trajetória hegemonicamente positiva, contudo, não foi livre de instabilidades e tendências retrativas localizadas, conforme bem ilustra o Gráfico 3, principalmente no período entre janeiro/21 e outubro/21. Já no ano de 2022 o setor apresentou uma reação, esboçando novos resultados positivos, com expansões na maior parte dos meses, porém ainda se mantendo distante do teto de atividade do período da pandemia que foi registrado em janeiro de 2021.

Gráfico 3: Índice de produção física industrial, Santa Catarina (2020, ago/2022).

Fonte: PIM-PF/IBGE. Elaboração: Necat/UFSC.

A Tabela 5 elenca os resultados da produção física catarinense nos últimos doze meses. Em agosto/22, o dado da série mensal com ajuste sazonal foi retrativo em -4,8% frente o ritmo produtivo de julho, encerrando um movimento positivo que se sustentava desde abril. Com isso, foram registradas 6 expansões e 2 retrações mensais nos primeiros oito meses de 2022, o que situa o índice atual em 1,9% acima do nível de janeiro. O saldo das variações mensais durante a pandemia pode também ser visualizado pelo Gráfico 4.

Na comparação com agosto de 2021, o dado registrado foi característico de estagnação, com variação de 0,7%. Por essa perspectiva, o setor mantém resultados positivos desde junho, indicando que o segundo semestre do ano atual pode ser positivo na comparação com o ritmo produtivo do mesmo período em 2021. Ainda assim, nos cinco meses anteriores foram registradas retrações, caracterizando o contexto negativo na maior parte do primeiro semestre.

Tabela 5: Variação da atividade industrial em Santa Catarina em diversos períodos

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Em relação às taxas acumuladas, o setor continua no vermelho, com retrações de -3,6% e -4,5% na série anual e de doze meses, respectivamente. Pela perspectiva anual, o setor ainda não registrou nenhuma expansão no ano, corroborando com o cenário também registrado na mesma série em âmbito nacional. Entre as UFs, a retração catarinense de -3,6% é a quinta mais negativa do país, atrás apenas de Pará (-8,1%), Ceará (-4,6%) e Espírito Santo (-3,7%) e no mesmo nível de Pernambuco (-3,6%). Na base de comparação de doze meses, por sua vez, as retrações se repetem desde maio com tendência consolidada de aumento de ritmo. O resultado de -4,5% é o quarto mais negativo do país, superior apenas às quedas de Ceará (-8,0%), Pará (-7,9%) e Pernambuco (-4,6%).

Gráfico 4: Produção física industrial em SC, mensal com ajuste sazonal (2020, ago/2022).

Fonte: PIM-PF/IBGE. Elaboração: Necat/UFSC.

Entre os setores de atividades da indústria catarinense a tônica foi de resultados desiguais, como mostra a Tabela 6. Na comparação com o nível produtivo de agosto de 2021, apenas 4 dos 12 setores presentes na pesquisa regional registraram expansões, sendo as mais representativas localizadas nas atividades de máquinas e equipamentos (19,2%), produtos alimentícios (15%), produtos de metal (3,8%) e celulose, papel e produtos de papel (2,9%).[2] Entre os resultados negativos se destacaram as retrações de produtos têxteis (-16,9%), produtos de madeira (-14,3%), produtos de minerais não-metálicos (-13,8%) e máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-10,4%).[3]

Tabela 6: Produção Física Industrial de Santa Catarina por Setores de Atividades, variação mensal em relação ao mesmo mês do ano anterior

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFC.

A expressão desses resultados setoriais no acumulado do ano é ilustrada pelo Gráfico 5. Apenas as indústrias de produtos alimentícios (7,2%) e produtos de metal (1,2%) registraram expansões na comparação com o acumulado do período jan-ago/2021. Entre as demais, foram destaques negativos os acumulados de produtos têxteis (-19,9%, corroborando os dados mensais já destacados), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-13,2%) e produtos de borracha (-7,8%). Novamente, é o bom resultado de produtos alimentícios que puxa (quase exclusivamente) o dado agregado para cima, evitando-se um registro negativo ainda maior na comparação com o saldo de 2021.

Gráfico 5: Produção física industrial em SC, por setores de atividades, acumulado no ano (2022)

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Considerações Finais

O quadro ilustrado pelos resultados da produção física industrial em agosto é de desaceleração, tanto em nível nacional como estadual. Nacionalmente, a variação negativa de -0,6% na série mensal mantém a debilidade do ritmo produtivo que tem se apresentado desde janeiro/22 e que situa o índice de produção física abaixo do nível de fevereiro de 2020, último mês do pré-pandemia. Em Santa Catarina, a forte retração de -4,8% interrompe a sequência expansiva que estava instalada desde abril, relegando um sinal negativo para os próximos meses. Ainda assim, o índice catarinense continua acima do patamar de fevereiro de 2020 e encontrando-se em melhor posição na comparação com o índice nacional. Com isso, se mantém a tônica que se apresentou na maior parte do período da pandemia.

Em âmbito nacional, merece destaque positivo entre os setores de atividades o desempenho da indústria de produtos derivados do petróleo, a qual representa a maior expansão no acumulado anual e a maior contribuição para a formação da taxa acumulada agregada, puxando consideravelmente esse resultado para cima. As atividades da indústria moveleira e das indústrias têxteis, por outro lado, representam preocupações, uma vez que os acumulados anuais são negativos e os registros mensais de agosto foram novamente de retração, delineando uma trajetória negativa para os próximos meses.

Já em Santa Catarina, apenas a indústria de produtos alimentícios apresenta resultados positivos e relevantes, uma vez que a expansão de produtos de metal é de menor expressão e sua participação no parque industrial catarinense é menos importante. Sem o desempenho positivo da indústria alimentícia a retração da produção física catarinense pela ótica anual seria bem superior aos -3,6% registrados. Na linha do resultado nacional, é bastante preocupante o resultado do setor de produtos têxteis, uma vez que não apresentou até o momento nenhum indicativo de reversão tendencial. A retração de máquinas, aparelhos e materiais elétricos também é preocupante, uma vez que o setor possui a segunda maior participação no valor da transformação industrial no estado, atrás apenas de produtos alimentícios.

Para os próximos meses, é de se supor que a manutenção do ciclo recessivo da política monetária continue restringindo os resultados da atividade econômica e, consequentemente, da produção física industrial. Os desafios do desemprego e da inflação, da mesma forma, devem continuar como entraves, mesmo considerando suas tendências de redução. Por sua vez, a ampliação dos benefícios governamentais de estímulo à demanda pode ser um fator condicionante da expansão do ritmo produtivo, resta saber se em nível suficiente para balancear os demais fatores desestimulantes.

Referências

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física (PIM). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, agosto de 2022.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física Regional (PIM Regional). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, agosto de 2022.

IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. Entre altos e baixos. Carta IEDI: edição 1165. Disponível em: <https://www.iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_1165.html>. IEDI, agosto de 2022.


* Graduando em Ciências Econômicas na UFSC e bolsista do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense (Necat/UFSC). E-mail: matheusrosa.contato@outlook.com

[1] A composição da taxa de crescimento mostra a participação dos setores de atividades na taxa final, a partir da ponderação pelo peso das atividades no total da indústria geral. O cálculo da composição segue a fórmula , onde C = Participação da atividade na formação do total da taxa de crescimento, Ig = Indicador de atividade e K = Peso da atividade no total da indústria geral. (IBGE, 2022).

[2] O peso considerável da indústria de produtos alimentícios no parque industrial catarinense foi o que propiciou o saldo positivo de 0,7% no agregado dos setores nessa série, mesmo no contexto de hegemonia de retrações.

[3] Vale destacar a trajetória de perdas reiteradas que se localiza nas atividades têxteis no estado: em todos os meses foram registradas retrações na comparação com os meses do ano passado, indicando claro descompasso do ritmo produtivo na comparação entre 2022 e 2021.