Razões para Florianópolis apresentar a cesta básica mais cara dentre todas as capitais do país

14/10/2020 17:53

Por: Lauro Mattei[1]

No dia 06/10/20 o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) divulgou os novos valores da Cesta Básica pesquisada em 17 capitais do país[2]. A pesquisa revelou que, além dessa cesta apresentar variações percentuais expressivos dos preços em todas as capitais consideradas, Florianópolis apresentou o maior valor absoluto, além de ser a capital com as maiores variações percentuais de preços dos alimentos que metodologicamente compõem tal cesta alimentar (9,80%). Por isso, é importante discutir possíveis razões que podem explicar tal comportamento, especialmente durante esse cenário de pandemia em que a capital catarinense é uma das cidades mais afetadas pelo desemprego no estado. Antes, porém, vamos apresentar algumas informações básicas sobre essa pesquisa.

O que é e o que representa a pesquisa da Cesta Básica do DIEESE

É importante registrar que o artigo segundo do Decreto Lei número 399, de 30/04/1938, regulamentando a Lei número 185, de 14/01/1936, estabeleceu que o Salário Mínimo (SM) deveria ser a remuneração que fosse capaz de satisfazer as necessidades da família de um trabalhador adulto[3] em cada região do país com gastos em alimentação, habitação, higiene e transporte. Foi nessa época também que se criou a chamada “Cesta Básica de Alimentos” composta por quantidades balanceadas de proteínas, calorias, ferro, cálcio e potássio.

A partir de janeiro de 1959, o DIEESE começou a calcular o Índice do Custo de Vida (ICV-DIEESE)[4] na cidade de São Paulo. Para tanto, desde então são coletados os preços de 13 alimentos que compõem a Cesta Básica e que dão mensalmente a dimensão do custo com alimentação de um trabalhador. A partir daí é feito um conjunto de cálculos para se chegar ao Salário Mínimo Necessário estimativa feita pelo DIEESE com base no artigo quarto da Constituição Federal de 1988 visando atender as seguintes necessidades: alimentação, habitação, vestuário, saúde, educação, transporte, lazer e previdência social. A segunda capital a ser pesquisada foi Porto Alegre (RS), cujas ações iniciaram em janeiro de 1977. Já Florianópolis teve sua primeira pesquisa realizada no mês de maio de 1985. Desde então os valores da cesta básica vêm sendo pesquisados mensalmente na capital catarinense.

De um modo geral, a pesquisa acompanha mensalmente a evolução de 13 preços dos produtos de alimentação, assim como o gasto que o trabalhador teria para adquiri-los. A partir daí o DIEESE calcula as horas de trabalho necessárias ao trabalhador que recebe o salário mínimo para comprar sua cesta alimentar. Decorre daí o conhecido Salário Mínimo Necessário embasado nos preceitos legais, conforme mostraremos mais adiante. Todavia, como o Brasil é um país continental, os preços variam muito em cada região. Por isso, a Cesta Básica do DIEESE, além de conter um valor médio para todo território nacional, é estruturada em três regiões: Região 1 (SP, RJ, ES, MG, GO e DF); Região 2 (AL, BA, CE, MA, PB, PE, PI, RN, SE, AC, AP, AM, PA, RO e TO); Região 3 (RS, SC, PR, MS e MT). Os dados são coletados semanalmente em quatro grupos de locais de comércio de alimentos: supermercados, feiras livres, açougues e casas de carnes e padarias e confeitarias.

Por fim, é importante observar a composição e a quantidade da cesta básica na região 3 que engloba as capitais dos três estados da região Sul mais as capitais do Mato Grosso do Sul e Mato Grosso: carne (6,6kg), leite (7,5L), feijão (4,5kg), arroz (3kg), farinha (1,5kg), batata (6kg), tomate (9kg), pão francês (6kg), café (600grs), banana (90unidades), açúcar (3kg), óleo de soja (900ml), manteiga (750grs).

O comportamento recente da Cesta Básica em Florianópolis

Para entender melhor as razões que podem estar explicando o valor expressivo da cesta básica do último mês de setembro que colocou a capital catarinense em primeiro lugar no ranking dentre as 17 capitais pesquisadas, vamos apresentar a evolução dos preços da cesta básica em três períodos distintos (no mês da pesquisa, no ano de 2020 e nos últimos 12 meses). Essa temporalidade é importante para se observar a trajetória dos preços dessa cesta, bem como possíveis elementos que possam estar influenciando determinados comportamentos dos preços.

Do ponto de vista da pesquisa do mês de setembro de 2020, nota-se que Florianópolis foi a capital com o maior valor real, ou seja, R$582,40, representando um aumento de 9,80% em relação ao mês anterior. Salvador apresentou o segundo maior aumento percentual em relação ao mês anterior (9,70%), enquanto Aracaju apresentou o terceiro maior aumento (7,13%).

O Quadro 1 apresenta a variação agregada dos preços da cesta básica nas quatro capitais pesquisadas na região 3. Inicialmente chama atenção o expressivo percentual de aumento em Florianópolis, comparativamente às demais capitais pesquisadas, cuja composição da cesta é idêntica. Portanto, torna-se necessário averiguar os elementos que podem estar explicando esse fato, alertando desde logo que as explicações não podem ficar restritas ao que vem sendo tratado nacionalmente, ou seja, procura-se explicar esse movimento de preços apenas pelo comportamento de dois produtos: arroz e óleo de soja, assunto que retomaremos mais adiante. Além disso, a pesquisa do DIEESE mostrou que os aumentos em alguns produtos, como pão, banana, açúcar e manteiga, foram praticamente inexpressivos, sendo que Florianópolis não faz parte do grupo de capitais que apresentaram as maiores oscilações no caso desses quatro produtos. Por fim, destaca-se que a batata e o café apresentaram reduções de preço em Florianópolis, sendo Campo Grande a capital com a maior variação negativa no caso da batata (-26,73%).

Quadro 1: Comportamento dos preços da cesta básica na região 3 em setembro de 2020 e percentual do SM gasto para aquisição da cesta alimentar

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Fonte: Pesquisa da Cesta Básica/DIEESE; * Em relação ao mês anterior.

O Quadro 2 apresenta  o comportamento dos preços em algumas capitas, tanto no acumulado de 2020 como nos últimos 12 meses. No conjunto do país, nota-se que as maiores variações no ano de 2020 ocorreram exatamente em três capitais da região 2 (Norte e Nordeste), sendo todas elas localizadas no Nordeste do país. É importante observar que, tanto Salvador como Aracaju, mesmo apresentando os maiores percentuais de elevação dos preços dos alimentos da cesta básica no último mês, em valores absolutos se situaram em um patamar muito inferior ao verificado em Florianópolis. Em valores absolutos, a cesta básica em Salvador ficou 21% inferior ao valor praticado em Florianópolis, enquanto em Aracaju ficou 27% menor e em Recife 20%. Isso indica que o patamar dos preços da cesta básica de Florianópolis já tinha atingido um nível elevado antes mesmo do início da pandemia. Por outro lado, mesmo que a variação dos preços no acumulado do ano em Curitiba tenha sido levemente superior ao movimento verificado em Florianópolis, ainda assim a capital paranaense manteve um valor absoluto da cesta básica em patamares bem mais baixos. Ainda na região 3, deve-se destacar o comportamento dos preços, tanto em Porto Alegre como em Campo Grande, cujas oscilações ficaram abaixo de 10% no acumulado do ano.

Já em relação ao comportamento dos preços da cesta básica nos últimos 12 meses, observa-se que Florianópolis faz parte do grupo das quatro capitais com os maiores percentuais de aumentos, sendo Salvador com 33,12%, Aracaju com 29,87%, Florianópolis com 28,02% e Recife com 26,46%. Esse é mais um indicativo de que a aceleração dos preços da cesta básica em Florianópolis já vem ocorrendo há tempos, de tal forma que o aumento expressivo que acabou de ser verificado no mês de setembro não pode ser creditado apenas às oscilações recentes dos preços de arroz e óleo de soja.

Quadro 2: Comportamento dos preços da cesta básica na Região 3 e em outras capitais no ano de 2020 e nos últimos 12 meses

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Fonte: Pesquisa da Cesta Básica/DIEESE.

Assim, parece ser necessário se buscar outras explicações para além das que já estão postas (aumento do arroz, do óleo de soja e do trigo) e que, a nosso ver, não são suficientes para justificar a disparada dos preços da cesta básica alimentar no mês de setembro na capital catarinense, uma vez que é amplamente conhecido o fato de que a cidade não produz a grande maioria dos itens que fazem parte da referida cesta.

Ampliando as explicações sobre a elevação dos preços da cesta alimentar em Florianópolis

Inicialmente é necessário retornar aos produtos e quantidades que compõem a cesta básica, conforme quadro 3. Do ponto de vista agregado, a pesquisa DIEESE informa que a variação mensal dos preços em setembro de 2020 foi da ordem de 9,8% em relação ao mês anterior. Conforme mostramos no quadro 1, esse é o maior percentual em relação às demais capitais integrantes da região 3. No ano essa variação acumulada atingiu 13,82% e nos últimos 12 meses 28,02%. Se levarmos em conta o índice oficial da inflação do país auferido pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) nos mesmos períodos, verifica-se que esses valores foram de 0,64%, 1,34% e 3,14%, respectivamente. De um modo geral, essas expressivas diferenças percentuais evidenciam o alto custo da cesta alimentar em Florianópolis, padrão que já vem se mantendo em patamares elevados há muito tempo. Especificamente em relação ao aumento de 9,8% verificado no mês de setembro, para além das explicações corriqueiras, observa-se que houve uma recomposição de alguns preços diante da trajetória recentemente, especialmente durante os meses de abril a agosto, quando a variação dos preços foi negativa em alguns meses e próxima a zero em outros. A partir da flexibilização das medidas de isolamento social e com aquecimento da demanda, os preços voltaram a se expandir em agosto e tiveram um salto pouco justificado no mês de setembro, a não ser pelo desejo especulativo de manutenção e/ou ampliação das margens de lucro de alguns setores da indústria alimentar que, de longe, foi o setor de atividades econômicas menos afetado durante a pandemia.

Quanto à composição da cesta básica, nota-se que há três grupos distintos de produtos quando se considera a variação anual. Um primeiro deles, composto pela carne, leite, arroz, feijão e óleo, que apresentou percentuais bastante elevados, que variaram entre 30% e 65%. Neste caso, é importante verificar os impactos desses aumentos cotejando pela participação do preço individual no conjunto do preço da cesta alimentar. Assim, nota-se que o óleo, com variação anual de 65,81% – a maior variação dentre todos os 13 produtos -, representou apenas 1,3% do custo total da cesta em setembro de 2020. Já a carne, com variação anual de 59,58%, representou 42,9% do custo total no mesmo mês. Finalmente, o feijão com variação de 54,76%, representou 6,6%, enquanto o arroz, com variação anual de 51,05%, representou apenas 2,59% do custo total. Esses percentuais indicam que um aumento mínimo do preço da carne provoca um impacto expressivo no valor total da cesta. Segundo a pesquisa nacional do DIEESE, no mês de setembro Florianópolis foi a capital que registrou o maior aumento do preço da carne (14,88%), enquanto Brasília apresentou o menor aumento (0,66%) e Porto Alegre variação negativa de 0,49%.

Portanto, fica evidente que dentre os 13 produtos pesquisados, a carne é de longe aquele alimento que mais impacta o crescimento do custo da cesta alimentar, em função de ser o produto com maior quantidade na composição da referida cesta, além de que seu nível de preço se situa num patamar bem mais elevado, comparativamente aos demais produtos. Esse parece ser o caminho mais adequado e capaz de oferecer melhores explicações pelo ocorrido, tendo em vista que tal produto apresentou duas oscilações extremas: Porto Alegre (-0,49%) e Florianópolis (+14,88%), capitais situadas na mesma região de aferição/ponderação dos preços.

Quadro 3: Composição dos preços da cesta básica em Florianópolis e variação % anual

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Fonte: Pesquisa da Cesta Básica/DIEESE, Florianópolis, setembro de 2020.

Desta forma, entendemos que as explicações para o comportamento do preço da carne podem ser as mesmas utilizadas para o caso do arroz e do óleo de soja. A alta demanda no mercado internacional, aliado à desvalorização do Real frente ao Dólar e inexistência de uma política de estoques reguladores, criou as condições para os agentes econômicos exportar mais carnes, ao mesmo tempo em que procuram manter seus ganhos no mercado interno praticando preços domésticos influenciados pelo nível dos preços externos. Informações da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) do Ministério da Economia revelaram que as exportações de carne bateram recorde em agosto de 2020, uma vez que aumentaram 19% em relação ao mesmo mês do ano anterior. Somente a China já comprou mais de 800 mil toneladas de carnes do Brasil em 2020, mas Egito e Chile também são outras duas importantes praças desse comércio brasileiro. Com isso, entre janeiro e agosto o país já tinha exportado 2,5 milhões de toneladas de carne bovina, ante 2,3 milhões de toneladas exportadas em todo ano de 2019. Assim, a carne bovina representa mais de 17% de todas as exportações do agronegócio do país no ano de 2020, enquanto a soja representa 43%[5]. É praticamente consenso entre os analistas que esse movimento acelerado de procura da carne no mercado externo acabou se revertendo também em elevações expressivas dos preços no mercado doméstico, ou seja, ocorre um alinhamento dos preços no mercado interno relativamente aos preços aferidos no mercado internacional. Assim, o aumento verificado em Florianópolis, capital que teve o maior percentual no mês de setembro, é reflexo direto desse cenário globalizado.

Portanto, não podemos aceitar acriticamente os argumentos expostos por algumas autoridades, como no caso do aumento recente do arroz. Por um lado, o Secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, relacionou de forma simplificada o aumento do produto ao fato de que o governo colocou dinheiro nas mãos dos pobres e estes passaram a comer mais e, por outro, a Ministra da Agricultura, Tereza Cristina, justificou o aumento afirmando que os produtores de arroz perderam muito nos últimos e que agora tiveram oportunidade de recuperar seus ganhos. Infelizmente, uma parte importante de analistas e dos meios de comunicação seguiram essas explicações simplistas profanadas pelos neoliberais de carteirinha e sequer se dispuseram a entender minimamente a importância dos instrumentos clássicos da política de abastecimento alimentar de um país, especialmente do papel dos estoques reguladores. Portanto, o que ocorreu foi muito simples: tradicionais países exportadores, sobretudo asiáticos, durante a pandemia retiveram suas exportações reduzindo a oferta mundial, fato que somado à desvalorização da moeda, tornou os preços muito atraentes no mercado externo. Com isso, os agentes brasileiros do setor direcionaram suas ações para esses mercados, elevando brutalmente as exportações. Dados da Comex/Ministério da Economia revelam que somente entre janeiro e agosto de 2020 o Brasil exportou 1,153 milhões de toneladas de arroz, enquanto durante todo o ano de 2019 exportou apenas 600 mil toneladas. Além disso, de janeiro e julho as exportações do país cresceram 6,8%, sendo o agronegócio o responsável pela grande maioria desse crescimento. Como a lógica neoliberal em curso não destina recursos para formação de estoques reguladores, nota-se que os mesmos caíram de 1.629.000 toneladas (2016) para 22 mil toneladas (2020). Esse fato também colaborou para que houvesse a explosão dos preços no mercado interno.

Por outro lado, causa espanto se aceitar acriticamente que a simples transferência de recursos emergenciais pelo governo seja responsável pelo aquecimento da demanda, sobretudo procurando responsabilizar a parcela mais pobre da população – que vive em estado falimentar – pelos aumentos dos preços do arroz e do óleo. Estudo recente da FGV/RJ, com base nos dados da PNAD Contínua para o primeiro semestre de 2020, revelou que a renda do trabalhador caiu 20,2% no primeiro semestre do corrente ano, ou seja, passou de R$ 1.118,00 para R$ 893,00. Isso fez com que os 50% mais pobres da população tivessem uma queda de 27,9% em sua renda nesse período. Em grande medida, essa queda ocorreu em função dos elevados índices de informalidades existentes anteriormente ao início da pandemia e aos mecanismos de redução dos salários devido à política governamental de enfrentamento da pandemia. Já a parcela dos 10% mais ricos teve uma queda de apenas 17% no mesmo período.  Resultado: se houve algum impacto de aumento do consumo alimentar durante a pandemia, certamente esse não adveio das classes populares com menores níveis de renda. Outros dados que corroboram com nossa argumentação advêm das pesquisas mensais do comércio realizadas pelo IBGE. Entre março e julho ocorreram quedas generalizadas em diversos subsetores, destacando-se o setor de supermercados, hipermercados, produtos alimentícios e bebidas, que somente voltou a ter resultados positivos no mês de agosto, porém ainda permanecendo com déficit no acumulado do ano de 2020.

Desta forma, podemos sintetizar as explicações para o aumento recente da cesta básica em Florianópolis a partir de algumas premissas essenciais:

a) As condições naturais (parte da cidade é uma ilha) fazem com Florianópolis não produza praticamente nada dos produtos que compõem a cesta alimentar, ao mesmo tempo em que a produção agropecuária catarinense se encontra cada vez mais atrelada aos mercados nacional e internacional;
b) O nível de preços da cesta básica em Florianópolis já se situava em patamares bastante elevados há tempos, comparativamente a diversas capitais do país, sendo que desde o mês de janeiro de 2020 a capital catarinense já se situava dentre as mais caras do país;
c) Esse patamar de preços foi afetado pela retração da demanda durante a pandemia, especialmente no período entre abril e julho, ocasionando inclusive desaceleração dos preços como foi observado no mês de junho (-1,35%);
d) Com a flexibilização e o relaxamento do isolamento social, observaram-se alguns impulsos de consumo doméstico a partir do mês de agosto. Tal contexto se revestiu em uma expectativa interna favorável que induziu a aumentos expressivos dos preços já no mês seguinte (setembro);
e) Que os produtos que tiveram as maiores altas são commodities cujos preços seguem, em grande medida, uma lógica definida no mercado internacional, com efeitos diretos transmitidos sobre os preços dos mesmos no mercado doméstico.

Por fim, é importante mencionar que a cesta básica no patamar atual (R$ 582,40) representa aproximadamente 56% do valor atual do salário mínimo (R$ 1.045,00), sendo que um trabalhador que recebe o SM no valor nominal vigente terá disponível apenas R$ 462,60 para todas as demais despesas (habitação, saúde, educação, transporte, higiene, vestuário e lazer). Na verdade, esse é o drama de uma parcela expressiva da população que se reproduz socialmente com esses valores. Ao mesmo tempo, é essa condição que talvez melhor retrate a situação de pobreza e de exclusão social que cada vez mais está afetando a população catarinense e brasileira. Por isso, o DIEESE afirma que o salário mínimo, para cumprir seus desígnios legais, deveria ter o valor de R$ 4.892,75, ou seja, 4,68 vezes o valor corrente.

Para além dos preços da cesta básica alimentar

Outra característica relevante a se discutir sobre Florianópolis é seu elevado custo de vida, que mensalmente é calculado pela ESAG/UDESC. A composição de tal índice está assentada em nove grupos de setores, sendo que apenas quatro deles são responsáveis por 64,78% do custo de vida dos cidadãos (alimentação 20,86%; habitação 13,31%; transportes 19,17% e saúde 11,44%).

O ICV Esag/Udesc em setembro foi de 0,34%, enquanto o acumulado até o mesmo de setembro foi de 2,59% e o acumulado dos últimos 12 meses 3,77%. Segundo essa fonte, as maiores altas em setembro foram puxadas pelo setor de alimentação no domicílio, com destaque para os aumentos de óleos e gorduras, cereais e carnes. Além disso, aumentos importantes também foram verificados no setor de transportes, com destaque para elevações dos preços do transporte público e dos combustíveis.

            Outro indicador relevante nesses tempos de pandemia é o custo habitacional. Ao longo dos últimos anos Florianópolis figura dentre as capitais do país com os maiores preços por metro quadrado. Em 2019 ficou em terceiro lugar no ranking nacional com um preço médio de R$ 7.027,00 ao metro quadrado. Em agosto de 2020 esse valor passou para R$7.278,00, fazendo com que a cidade passasse a ocupar a quinta posição no ranking que possui os seguintes valores: 1)Rio de Janeiro (R$ 9.311,00); São Paulo (R$ 9.210,00); Brasília (R$ 7.418,00); Balneário Camboriú (R$ 7.355,00). Todavia, na dinâmica interna da cidade existem alguns locais cujos preços são superiores aos verificados no Rio de Janeiro. Neste caso, destacam-se o bairro de Jurerê Internacional, Praia Brava, Beira Mar Central, etc.

Em síntese, além de evidenciar os movimentos de preços dos produtos que, de uma maneira geral, explicam o elevado custo da cesta alimentar em Florianópolis, procuramos mostrar que o custo de vida na cidade continua sendo um dos mais caros dentre todas as capitais do país. Esse será um dos grandes desafios no pós-pandemia, especialmente em função de que atualmente Florianópolis é a cidade do estado com os maiores percentuais de desemprego.


[1] Professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais e Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador geral do NECAT-UFSC e Pesquisador do OPPA/CPDA/UFRRJ. Email: l.mattei@ufsc.br

[2] Artigo revisado com base nas sugestões da equipe do DIEESE, em particular do Carlindo, a quem deixamos nossos agradecimentos, reafirmando que possíveis erros ainda existentes são de responsabilidade do autor.

[3] Considera-se um grupo familiar de 4 pessoas, sendo dois adultos e duas crianças.

[4] Todos os aspectos atualizados relativos à metodologia da pesquisa podem ser obtidos no site do DIEESE. Recomendando-se utilizar o documento publicado em 15/02/2016, o qual contém todas as alterações promovidas no mês de janeiro de 2016.

[5] Esses dados também ajudam a entender o aumento do preço de óleo de soja.