Resultado acumulado da indústria catarinense nos sete primeiros meses de 2020 continua negativo

30/09/2020 20:56

Por: Lauro Mattei[1], Lilian de Pellegrini Elias[2] e Matheus Rosa[3]

A trajetória da indústria de Santa Catarina no ano de 2020, em linhas gerais, tem acompanhado as variações observadas em nível nacional*. Como ilustra o Quadro 1, nos dois primeiros meses foram registradas pequenas variações positivas, sendo 1,1% em janeiro e 1,7% em fevereiro. O comportamento da indústria catarinense, portanto, assim como no país, não apresentava nenhum sinal de retomada para um nível maior de crescimento no período imediatamente anterior à eclosão da pandemia da Covid-19.

Quadro 1: Produção Física Industrial em SC, 2020 – Variação (%)

Q1

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat/UFSC.

Em consonância com o quadro nacional, a pandemia causou impactos a partir de março, quando a variação da produção física industrial caiu -17,7% em relação ao mês anterior. No mês de abril ocorreu nova queda, porém em menor magnitude (-14,2%). Já nos meses seguintes (maio, junho e julho) houve uma mudança na trajetória, uma vez que os resultados mensais passaram a ser positivos da ordem de 5,7%, 10,3% e 10,1%, respectivamente. No entanto, essa recuperação ainda não foi suficiente para recompor as perdas ocorridas nos meses de março e abril. Com isso, o comparativo com o desempenho de 2019 segue sendo negativo.

Ao analisarmos a produção física industrial mês a mês de 2020 em relação a 2019, apenas em fevereiro houve uma variação positiva. Neste indicador, a taxa de maior recuo aconteceu no mês de abril, quando foi registrada uma variação de -30,9% em relação ao mesmo mês de 2019. Em julho, esse mesmo indicador mostra seu melhor desempenho desde o início do impacto da pandemia, com uma variação de -4,9%, indicando que também em nível estadual começa a se estabelecer uma tendência de equiparação com os níveis de produção de 2019.

Cabe ressaltar que a variação de julho em relação ao mês anterior foi maior em Santa Catarina do que em nível nacional. Enquanto no Brasil a alta foi de 8%, em Santa Catarina o desempenho de julho registrou 10,1%. Contudo, a variação de julho comparada com o mesmo mês de 2019 representa um maior recuo no estado, comparativamente ao país (-4,9% em SC e -3% no Brasil), indicando que ainda há um caminho mais longo no estado para que se retorne ao patamar de 2019.

Lembrando que o cenário apresentado pela indústria catarinense em 2019 já não era favorável. Como podemos observar no Gráfico 1, o ano de 2019 foi de fraco desempenho, a produção industrial catarinense apresentou comportamento próximo à estagnação ao longo de todo o ano, tendo indicadores positivos tímidos em apenas cinco dos doze meses. O crescimento acumulado de 2019 foi de 2,2%.

Gráfico 1: Produção Física Industrial em SC – Variação (%) no mês (com ajuste sazonal) – 24 meses

G1

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat/UFSC.

O desempenho mensal da indústria catarinense em 2020

No que se refere ao acumulado no ano de 2020 – janeiro a julho – Santa Catarina apresenta retração de 13,4%. Desempenho que, na comparação com as outras Unidades da Federação, situa Santa Catarina numa posição desfavorável. Como aponta o Gráfico 2, Santa Catarina fica atrás de pelo menos 9 estados no desempenho acumulado em 2020. Apenas os estados do Espírito Santo (-19,7%), Ceará (-18,2%), Amazonas (-15,9%) e Rio Grande do Sul (-14,5%), apresentaram resultados piores do que os níveis de Santa Catarina (a Pesquisa Industrial Mensal só conta com informações de 14 Unidades da Federação). A comparação com o resultado do Brasil, de -9,6%, também é desfavorável, indicando que os impactos da crise econômica e da pandemia incidiram de forma mais aguda na produção industrial de SC do que na do Brasil.

Gráfico 2: Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física – Resultados Regionais Acumulado no Ano – Julho/2020 – (Base: igual período do ano anterior)

G3

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat/UFSC.

Podemos também observar as variações nos setores que mais afetaram a taxa acumulada. Como apresenta o Gráfico 3, apenas o setor de Produtos Alimentícios apresentou taxa positiva, com uma expansão de 2,5%. Todos os demais setores apresentaram taxas negativas, sendo a mais expressiva registrada no setor de Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias (-34,3%). As indústrias de Artigos de Vestuário e Acessórios (-31%), Metalurgia (-30,1%), Produtos Minerais não-Metálicos (-21%), e Produtos Têxteis (-12,8%) também apresentaram taxas expressivas de retração.

Gráfico 3: Produção Física Industrial em SC, acumulado em 2020 por setores

G2

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat/UFSC.

Em linhas gerais, os resultados mostram que em Santa Catarina as indústrias com pior desempenho foram aquelas concentradas nos setores de Bens de Capital e de Consumo Duráveis, repetindo o quadro verificado nacionalmente e reafirmando a tendência dos anos anteriores. Nota-se, ainda, que o impacto da pandemia da Covid-19 afetou de forma aguda todos os setores da planta industrial do estado, com exceção do setor de Produtos Alimentícios que apresentou recuo na produção apenas no mês de abril.

O acompanhamento da indústria catarinense ao longo do tempo permite perceber que poucas das seções e atividades apresentavam bom desempenho nos meses imediatamente anteriores a pandemia (janeiro e fevereiro) em relação aos mesmos meses do ano anterior. Este foi o caso da Fabricação de produtos de borracha e de material plástico e Fabricação de produtos têxteis, que cresceram acima dos 10% em janeiro e 7% e 8,5% em fevereiro, em relação aos mesmos meses do ano anterior. As duas atividades foram impactadas pela pandemia e apresentaram quedas consecutivas de março a junho, voltando a crescer, mesmo que timidamente, apenas em julho. Na Quadro 2 é possível observar de maneira mais detalhada o comportamento dos setores industriais de Santa Catarina nos meses de março a julho de 2020 em relação aos mesmos meses de 2019. Os meses selecionados foram aqueles mais atingidos pela pandemia da Covid-19.

A Fabricação de máquinas e equipamentos e de produtos de madeira, por sua vez, já iniciaram o ano em queda, 10,7% e 0,7%, respectivamente, em janeiro, e 8,7% e 4,2% em fevereiro em relação aos mesmos meses do ano anterior. Com o início da pandemia ambas viram aprofundar suas quedas para cerca de 20% entre março e maio. Em junho apresenta se aproxima da estabilidade e em julho máquinas e equipamentos recompõe parte das perdas com crescimento de 20,4%.

Os meses de março, abril e maio foram os meses cujos resultados da indústria de Santa Catarina ficaram mais prejudicados em função da pandemia quando comparado com os mesmos meses de 2019. O mês de maio apresentou indicadores negativos para todas as seções e atividades industriais catarinenses. Nos meses de março e abril apenas o indicador de Fabricação de produtos alimentícios foi positivo, 4,9% e 3,1% respectivamente, mas em maio o recuo desse setor foi de 6%.

Quadro 2: Produção Física Industrial de Santa Catarina, variação dos meses de 2020 em relação ao mesmo mês do ano anterior (2019), por seções e atividades industriais

Q2

Fonte: PIM-PF/IBGE; Elaboração: Necat/UFSC.

Por fim, os meses de junho e julho apresentam uma mudança no cenário na comparação com o ano anterior. As seções e atividades industriais apresentam crescimento em relação aos meses anteriores, o que recompõe parte das perdas. Fabricação de máquinas, aparelhos e materiais elétricos cresce 7,6% em junho e 27,7% em julho. A Fabricação de máquinas e equipamentos que apresentou quedas nos primeiros seis meses do ano, cresceu 20,4% em julho. No entanto, algumas atividades seguem apresentando em junho e julho fortes quedas na produção industrial em relação aos mesmos meses de 2019, como são os casos da Fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias; Confecção de artigos do vestuário; e acessórios e Metalurgia. Em junho apresentaram quedas de 48,0%, 38,5% e 44,9%, respectivamente, e em julho, 31,8%, 32,3% e 9,8%. A Confecção de artigos do vestuário e acessórios chama particular atenção, pois, junto da Fabricação de produtos têxteis, faz parte do setor Têxtil e Confecção que é responsável por 21% dos empregos em Santa Catarina.

Considerações Finais

Inicialmente é importante destacar que o cenário da produção industrial do país no início de 2020 já era complicado, mesmo antes da ocorrência da pandemia provocada pelo novo coronavírus. Contudo, é inegável que a pandemia catalisou um processo de perdas generalizadas em praticamente todos os setores da planta industrial. Esse “efeito pandemia” pode ser visualizado tanto em nível nacional quanto estadual, especialmente nas retrações da produção nos meses março e abril – os dois primeiros meses após a confirmação do primeiro caso de Covid-19 no Brasil.

Quanto ao desempenho da indústria de Santa Catarina, verifica-se que, tanto os impactos da pandemia bem como as tendências observadas a partir do mês de maio, são muito similares ao quadro nacional. Todavia, deve-se registrar que o estado catarinense obteve a quinta pior taxa acumulada dentre todas as unidades da federação, uma vez que seus níveis de produção ainda são baixos, comparativamente aos resultados obtidos no ano de 2019.

Tal desempenhado não pode ser atribuído exclusivamente à pandemia, uma vez que nos meses de janeiro e fevereiro de 2020 a produção industrial catarinense apresentou baixas taxas de crescimento, inclusive sem mostrar qualquer sinal de recuperação em relação aos níveis do ano anterior, que também não foram nada excepcionais. Já o período entre os meses de março e julho mostrou dois comportamentos distintos: por um lado, altas taxas negativas em março (17,7%) e abril (14,2%) e, por outro, um lento processo de recuperação nos meses seguintes (maio a julho). Todavia, essa recuperação foi insuficiente para compensar as enormes perdas ocorridas durante os dois primeiros meses da pandemia. Com isso, o resultado agregado dos primeiros sete meses de 2020 continua negativo.

No caso da indústria catarinense, da mesma forma que na maioria das unidades da federação, os maiores impactos da pandemia ocorreram justamente nos grupos de bens de capital e de bens de consumo duráveis. Neste caso, verifica-se que as maiores perdas ocorreram nos setores de metalurgia; veículos automotores, reboques e carrocerias; produtos minerais não metálicos; e produtos têxteis. Apenas o setor da indústria de alimentos apresentou resultados positivos em praticamente todo o período de maior incidência da pandemia.

Diante do cenário de uma desaceleração da pandemia no estado, levando a um relaxamento das medidas de isolamento social, delineia-se para os próximos meses uma tendência de retomada das atividades industriais. Todavia, resta saber se essa retomada terá fôlego suficiente para impulsionar a recuperação de setores-chave das áreas de bens de capital e de consumo duráveis, ou se continuará concentrada apenas nos setores menos competitivos, especialmente nos bens de consumo não duráveis.


[1] Professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais e do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador Geral do Necat/UFSC e Pesquisador do OPPA/CPDA/UFRRJ. Email: l.mattei@ufsc.br

[2] Economista com doutorado em Ciências Econômica pela Unicamp. Pesquisadora do Necat/UFSC. Email: lilianpellegrini@gmail.com

[3] Estudante de Economia na UFSC e bolsista do Necat/UFSC. Email: matheusrosa.1917@gmail.com

* Este artigo faz parte de uma seção de um estudo dos impactos da pandemia sobre a indústria brasileira e catarinense publicado pelo Necat/UFSC como Texto para Discussão Nº 43.