Santa Catarina foi um dos estados que menos fez testes para Covid-19 em 2020

15/01/2021 00:35

Por: Lauro Mattei [1]

Desde o mês de março de 2020, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou a COVID-19 como uma pandemia, a testagem rápida da população foi sempre colocada como uma ação estratégica para combater a doença. Isto porque “as informações sobre testagem são de extrema importância para a avaliação da epidemia e possibilitam entender como a doença está se disseminando. Do ponto de vista epidemiológico, é uma das ferramentas mais importantes para conter, desacelerar e reduzir a propagação da Covid-19” (FIOCRUZ, 2020, p. 03).

A testagem pode identificar rapidamente a parcela de pessoas contaminada em uma determinada cidade, região ou país, possibilitando a adoção de mecanismos adequados e eficazes para controlar a doença, ao mesmo tempo em que permitem às autoridades públicas a adoção de medidas relativas aos demais setores de atividades econômicas e sociais também afetados pela pandemia.

Nesta direção, nota-se que muitos países que adotaram um bom planejamento de testagem são exatamente aqueles mais exitosos no controle da pandemia. Já o Brasil faz parte do grupo de países que menos testes realizou para detectar a presença da doença em sua população, sendo superado por países com o Chile e a Eslováquia, que realizam quase quatro vezes mais testes que os realizados no país. 

Diante dessa realidade, O IBGE implementou, em plena pandemia, a PNAD COVID19 com o objetivo de obter informações sobre os sintomas referidos da síndrome gripal, bem como disponibilizar mais um instrumento de acompanhamento e avaliação dos efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho brasileiro.  Neste sentido, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD COVID19 é uma versão da PNAD Contínua, com coleta de dados por telefone. Seus objetivos incluem estimar o número de pessoas com sintomas referidos associados à síndrome gripal e obter informações sobre a procura por estabelecimento de saúde, por tipo de estabelecimento procurado. Adicionalmente, a pesquisa pretende monitorar as transformações ocorridas no mercado de trabalho brasileiro durante a pandemia[2].  

Para a realização da PNAD COVID19, foi utilizada como base a amostra de domicílios da PNAD Contínua do 1º trimestre de 2019. Essa amostra foi submetida a um processo de pareamento para integração com outras bases de dados, buscando-se obter números de telefone para cada domicílio. Esse procedimento resultou em uma amostra com ao menos um telefone disponível de 193.662 domicílios, representando cerca de 92% da amostra-base, os quais foram distribuídos em conjuntos de cerca de 48 mil domicílios por semana. A amostra da PNAD COVID19 é fixa, ou seja, os domicílios entrevistados no primeiro mês de coleta de dados permanecerão na amostra dos meses subsequentes até o fim da pesquisa. 

O questionário da pesquisa, na sua primeira edição, se dividia em três partes, sendo uma direcionada a questões dos sintomas associados à síndrome gripal, a segunda, a questões de trabalho e, a última para questões de rendimento de outras fontes. Nas questões de saúde, investiga-se a ocorrência de alguns dos principais sintomas da COVID19 no período de referência, considerando-se todos os moradores do domicílio. Para aqueles que apresentaram algum sintoma, perguntam-se quais as providências tomadas para alívio dos sintomas; se buscaram por atendimento médico devido a esses sintomas; e o tipo de estabelecimento de saúde procurado. Nas questões de trabalho, busca-se classificar a população em idade de trabalhar nas seguintes categorias: ocupados, desocupados e pessoas fora da força de trabalho. Investigam-se, ainda, os seguintes aspectos: ocupação e atividade; afastamento do trabalho e o motivo do afastamento; exercício de trabalho remoto; busca por trabalho; motivo por não ter procurado trabalho; horas semanais efetivamente e habitualmente trabalhadas; assim como o rendimento efetivo e habitual do trabalho. Por fim, visando compor o rendimento domiciliar, pergunta-se se algum morador recebeu outros rendimentos não oriundos do trabalho, tais como: aposentadoria, BPC-LOAS, Bolsa Família, algum auxílio emergencial relacionado à COVID19, seguro desemprego, aluguel e outros.  

Em julho de 2020 novos temas foram introduzidos, entre eles a realização de algum teste para identificar COVID19 e o resultado do exame; existência de comorbidades; comportamento diante do distanciamento social; existência de material de higiene e proteção; aquisição de empréstimos; e sobre a frequência à escola e realização de atividades da escola.

Em 19.10.2020 o IBGE informou que a última pesquisa seria realizada no dia 11.12.20, quando se encerraria o ciclo da pesquisa, cujo planejamento inicial previa um caráter temporário para tal atividade. Com isso, a edição relativa ao mês de novembro da PNAD Covid contempla um período de sete meses (maio a novembro), tempo em que foram produzidas diversas informações sobre os impactos da pandemia no país em distintas esferas, destacando-se os problemas relativos à saúde da população, bem como os impactos da pandemia sobre o sistema de saúde.  Neste caso particular, destacam-se os resultados de acompanhamento de testagem da Covid-19 em todas as unidades da federação, bem como a evolução das pessoas contaminadas.

Tomando como referência as informações da última PNAD Covid-19, seção saúde, divulgadas em 23.12.2020, esse artigo analisa apenas as informações relativas ao tema da testagem da população para a COVID-19 no estado de Santa Catarina, à luz da realidade do país nessa esfera mesma área.

Informações gerais sobre o novo coronavírus e sobre a testagem para a doença

Após a confirmação da doença em Wuhan (China), em dezembro de 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) a denominou, em março de 2020, de Coronavírus Disease 2019 (COVID-19). Tal doença é provocada pelo coronavírus do subtipo 2, passando a ser denomina de SARS-CoV-2[3]. A partir de então todos os países passaram a desenvolver mecanismos de controle e tratamento da doença, dada a gravidade da situação pandêmica em todo o mundo. Neste caso, um dos campos que ganhou muita atenção foi o desenvolvimento de novos métodos para diagnosticar rapidamente a doença devido ao grande número de variáveis envolvidas (material biológico a ser coletado, metodologia de coleta, momento ideal para coleta, amostra ideal, eficácia dos testes, etc.). Além disso, a disponibilidade de insumos para realização dos testes também foi um problema no início da pandemia, sobretudo nos países com baixa capacidade de importações desses materiais.

O diagnóstico positivo da COVID-19 é definido quando se detecta o material genético do vírus por meio de amostras de sangue, urina e até mesmo fezes, porém com menor resposta comparativamente aos testes de coletas respiratórias. Segundo a FIOCRUZ (2020: 02), “os testes atuais para a detecção da presença de Sars-CoV2 em humanos se diferencia pela estratégia de detecção e por sua sensibilidade e especificidade em relação ao vírus. Há duas estratégias principais para os testes: detectar efetivamente a presença do vírus em uma amostra (teste RT-PCR – Reverse transcription polymerase chain reaction) ou detectar traços deixados pelo vírus no sistema imunológico (testes para a presença de anticorpos). Essas diferentes estratégias apresentam algumas particularidades sobre a interpretação de seus resultados”. 

Até o momento a testagem mais segura para confirmação da SARS-CoV-2 diz respeito ao teste RT-PCR feito com cotonete de algodão (swab) na via nasal. Tal procedimento geralmente detecta resultados positivos nos primeiros dias dos sintomas e resultados negativos após o 15º dia dos primeiros sintomas. Em geral, esse tipo de teste apresenta qualidade maior comparativamente aos testes rápidos. Todavia, além de ser de custo econômico mais elevado e demorar mais tempo para obtenção do resultado, essa testagem exige equipes técnicas com maior qualificação, tanto para coleta quanto para análise das amostras.

Além deste existem outros métodos para pesquisar a presença da Covid-19 baseados na análise de anticorpos no sangue, servindo tanto para indivíduos sintomáticos como assintomáticos. São os chamados testes imunoenzimáticos, pois permitem a identificação precisa de anticorpos específicos em cada pessoa. São os conhecidos “testes rápidos”, os quais possuem a vantagem de detectar rapidamente a presença do vírus, além de ser um método de baixo custo. Todavia, apresentam uma importante restrição que diz respeito à possibilidade de respostas cruzadas com outros vírus que causam sintomas parecidos (resfriados, febres, tosses, etc.), principalmente de vírus da mesma família que também causam doenças respiratórias.

Em síntese, a principal a principal diferença entre essas duas formas de testagem mostra que, enquanto o teste RT-PCR revela se a pessoa está portando o novo coronavírus no momento da testagem, os testes rápidos informam se a pessoa já foi infectada em um determinado período de tempo, ou seja, se ela portava o vírus no passado recente.

Breve panorama da testagem do novo coronavírus realizada no país

Inicialmente é importante apresentar os procedimentos metodológicos adotados pela PNAD COVID19 específicos à temática discutida neste artigo (testes Covid-19). Para tanto, são destacados a seguir os principais indicadores de cada um dos três itens inicialmente pesquisados. 

1)Sintoma: neste caso perguntou-se aos moradores do domicílio se, na semana de referência, semana anterior à semana de coleta, tiveram determinados sintomas associados à síndrome gripal: febre; tosse; dor de garganta; dificuldade de respirar; dor de cabeça; dor no peito; náusea; nariz entupido ou escorrendo; fadiga; dor nos olhos; perda de cheiro ou de sabor; ou dor muscular. As repostas podiam ser: sim, não ou não sabe. 

2)Estabelecimento de saúde: aos moradores que tiveram ao menos algum dos sintomas na semana de referência e procuraram estabelecimento de saúde para tratamento, foi pesquisado o tipo de estabelecimento procurado, assim classificado: posto de saúde, Unidade Básica de Saúde (UBS), ou Equipe de Saúde da Família; pronto socorro do SUS/UPA; hospital do SUS; ambulatório ou consultório privado ou ligado às forças armadas; pronto socorro privado ou ligado às forças armadas; ou hospital privado ou ligado às forças armadas. O morador poderia responder positivamente a mais de uma opção. 

3)Providências para alívio dos sintomas: aos moradores que tiveram ao menos algum dos sintomas na semana de referência e não procuraram estabelecimento de saúde para tratamento, é perguntado que providências tomou para alívio dos sintomas, assim classificadas: ficou em casa; ligou para algum profissional de saúde; comprou ou tomou remédio por conta própria; comprou ou tomou remédio por orientação médica; recebeu visita de algum profissional de saúde do SUS (equipe de saúde da família, agente comunitário etc.); recebeu visita de profissional de saúde particular; ou outra providência. O morador poderia responder positivamente a mais de uma opção.

4)Testes de COVID-19: a partir do mês de julho foram introduzidas perguntas sobre a realização de testes para diagnóstico da COVID19. Foi perguntado a cada morador se ele havia realizado algum teste (que poderia ser o exame com material coletado com cotonete na boca e/ou nariz – teste SWAB; com coleta de sangue através de furo no dedo; ou com coleta de sangue através da veia do braço) para saber se estava infectado pelo novo Coronavírus. Caso tivesse realizado, era perguntado o resultado, que poderia ser: positivo, negativo, inconclusivo ou ainda não havia recebido. 

Embora o foco do presente artigo seja o último desses itens, é importante registrar que a última pesquisa divulgada em 23.12.2020, relativa ao mês de novembro, constatou que 8 milhões de pessoas mencionaram ter tido algum sintoma de síndrome gripal, sendo que 61% delas (4,8 milhões) declararam que buscaram algum atendimento médico. Registre-se que os serviços públicos de saúde (prontos-socorros e hospitais do SUS) foram os locais mais procurados para aqueles que buscaram algum tipo de atendimento. 

Quanto à testagem, até novembro 28,6 milhões de pessoas declaram ter feito o teste para diagnosticar a Covid-19, sendo que destes, 6,5 milhões testaram positivo, ou seja, 22,7% do total de pessoas que fizeram a testagem, sendo que esse montante de contaminados representava 3,1% da população total. Adicionalmente, informa-se que somente no mês de novembro (último mês da pesquisa), 2,9 milhões de pessoas fizeram o teste, sendo que destas 754 mil testaram positivo para a Covid-19.

Em relação aos tipos de testes realizados, observa-se uma diversidade de situação, sendo que 12,7 milhões de pessoas fizeram o teste Swab e destes 27% testaram positivo. Outros 12,4 milhões fizeram o teste rápido com coleta de sangue por meio de amostra do dedo, sendo que 17,2% destes testaram positivo. Finalmente, 3,5 milhões de pessoas fizeram o teste de coleta de sangue por meio da veia do braço, sendo que 25,5% deles testaram positivo.

Alguns quesitos qualitativos adicionais relativos às pessoas que fizeram a testagem. Do ponto de vista de gênero, o percentual de homens e de mulheres que fizeram algum teste foi praticamente idêntico. Já por faixas etárias, nota-se que 18,2% foram pessoas entre 30 e 59 anos de idade; 15,8% de pessoas entre 20 e 29 anos; 12,2% entre pessoas de 60 anos ou mais de idade. Quanto ao nível de escolaridade, observou-se que o maior percentual de pessoas que fez algum teste (28%) diz respeito àquelas com nível superior completo ou com pós-graduação. Já o percentual para as pessoas da faixa sem instrução até ensino fundamental incompleto foi de 7,3%. Finalmente, do ponto de vista da renda domiciliar per capita, nota-se que quanto maior for esse nível de renda maior é o percentual de pessoas que realizaram algum tipo de teste. Assim, 13,5% do primeiro decil de renda (mais pobres) fizeram o teste e destes 22,7% apresentaram resultados positivos. Já 27,5% do décimo decil (os mais ricos) fizeram o teste e destes apenas 20,5% tiveram resultado positivo.

Na sequência, disponibiliza-se o mapa da testagem no país com os respectivos percentuais de cada unidade da federação publicado pela PNAD COVID19.

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A testagem da COVID-19 na população Santa Catarina

Quanto à testagem, até novembro de 2020, aproximadamente 870 mil pessoas declararam ter feito alguma testagem para diagnosticar a Covid-19 em Santa Catarina, significando apenas 12% da população total do estado. Dos que fizeram o teste, 25% deles apresentaram resultado positivo, ou seja, 219 mil do total de pessoas testadas. Em outubro esse percentual era de 23,1%, significando um total de 171 mil pessoas. Ou seja, entre esses dois meses mais 48 mil pessoas testaram positivo no estado. Com esse resultado de novembro, o estado de Santa Catarina ficou em 19º posição dentre todas as unidades da federação que realizaram algum tipo de testagem de suas populações.

No âmbito do país, DF (25,6%); GO (20,7%) e PI (20,6%) foram os estado que mais testaram suas populações. Já AL (10,3%); PE (9,3%) e AC (8,8%) foram as três unidades da federação que menos testaram suas populações.

Alguns quesitos qualitativos das pessoas que fizeram a testagem em SC. Do ponto de vista de gênero, o percentual de homens que fizeram algum teste foi de 48% (418 mil), enquanto o percentual de mulheres foi de 52% (452 mil). Já por faixas etárias, nota-se que 15,3% foram de pessoas entre 20 e 29 anos; 15,6% foram pessoas entre 30 e 59 anos de idade; e 9,9% foram pessoas de 60 anos ou mais de idade. Quanto ao nível de escolaridade observou-se que o maior percentual de pessoas que fez algum teste (20,2%) diz respeito àquelas com nível superior completo ou com pós-graduação, sendo que este percentual foi de 6,3% para as pessoas da faixa sem instrução até ensino fundamental incompleto. Finalmente, do ponto de vista da renda domiciliar per capita, nota-se que quanto maior for esse nível de renda maior é o percentual de pessoas que realizaram algum tipo de teste. Assim, 22,1% das pessoas com renda de 4 salários mínimos ou mais fizeram o teste, enquanto apenas 7,9% daqueles com renda de até 1 salário mínimo fizeram o teste.

Além disso, a PNAD apresenta três sintomas referenciados conjugados à COVID-19: a) perda de cheiro ou sabor; b) tosse, febre e dificuldade para respirar; c) tosse, febre e dor no peito. O percentual da população catarinense com pelo menos um desses três sintomas foi de 0,6%, sendo que em novembro 46 mil pessoas apresentaram esses sintomas conjugados, significando um aumento de 12 mil pessoas em relação ao mês de outubro. Outra informação importante em relação a essas 46 mil pessoas é que 28 mil delas (74%) procuraram por algum estabelecimento de saúde, percentual que no mês anterior tinha sido de 82,3%.

Quanto ao atendimento de saúde, a PNAD revelou que 1,93 milhões de catarinenses tinham algum plano de saúde, o que corresponde a 26,6% da população estadual. Esse indicador para o país foi de 27%, ou seja, 57,7 milhões de pessoas no país possuíam algum plano de saúde ao final do ano de 2020.

Considerações finais

Desde o início da pandemia a OMS alertou sobre a importância dos países fazerem testagem de suas populações sobre a virose. Isto porque, segundo a Fiocruz (2020), a realização de testes massivos da população permitiria monitor e avaliar adequadamente a pandemia provocada pelo novo coronavírus. Desta forma, resultados positivos expressivos estariam indicando que o processo epidêmico estava se alastrando e poderia sair de controle, caso as autoridades públicas não adotassem as medidas sanitárias recomendadas. Além disso, testagens adequadas permitiriam entender melhor como a doença estava se disseminando em uma determinada região e/ou país, consistindo em importante ferramenta para a adoção de medidas necessárias para controlar a pandemia. Por fim, locais com alta positividade dos testes indicariam as tendências da epidemia e possibilitariam a realização de um planejamento mais adequado, tanto dos recursos humanos como dos financeiros necessários ao enfrentamento da pandemia.

Infelizmente esses desígnios não foram seguidos pelo Brasil, país que no ranking global de testagem apresenta um dos mais baixos percentuais de testes realizados para a Covid-19. Na escala de testes para cada 100 mil habitantes, o Brasil fica muito distante de países, como Chile, Itália, Irã, Reino Unido, etc. Segundo a Fiocruz (2020), existe um conjunto de fatores que explicam esse baixo desempenho, destacando-se:

a) A descentralização da compra e distribuição dos testes pode ter onerado excessivamente os cofres públicos, uma vez que, se centralizadas, poderiam ter seus custos bem reduzidos;

b) A falta de comunicação clara sobre a importância da testagem levou a um aumento expressivo dos testes rápidos em detrimento dos testes RT-PCR, o que possibilitou uma maior disseminação do vírus por todas as regiões do país;

c) Os postos de triagem organizados nas diversas unidades da federação que ofereciam testes rápidos aglomeravam pessoas e apenas identificavam indivíduos já contaminados, porém sem deter a capacidade de transmissão;

d) A falta de investimentos públicos nos laboratórios centrais dos estados (Lacen) afetou a validade de parte dos testes realizados devido à baixa capacidade operacional de análise dos exames efetivados.

Além desses aspectos anteriormente mencionados, entende-se necessário agregar a questão da realidade econômica e social do país nestas análises. Isto porque, como vimos tanto para o país como para SC, há uma clivagem social entre os participantes das testagens realizadas, sobretudo em termos do desnível de acesso à educação e ao diferencial de renda entre os diversos segmentos sociais. Com isso, pessoas dos estratos sociais superiores tiveram acesso aos melhores testes e puderam se precaver de forma mais adequada. Por isso, a realização de testes para Covid-19 também é mais um termômetro que serve para mensurar a desigualdade social brasileira.

Em síntese, o Brasil cometeu um conjunto de erros que podem ter contribuído para o elevado número de óbitos verificado até o momento, sendo que muitos deles poderiam ter sido evitados. E hoje os altos percentuais positivos da testagem mais servem para mostrar que a circulação do vírus está num estágio muito elevado, ao mesmo tempo em que indicam que a pandemia está fora de controle no país.

No caso particular de Santa Catarina, observa-se claramente que não houve, por parte do governo estadual, uma política articulada nesta esfera para todo o horizonte da unidade da federação, além do que os níveis de investimento público neste caso foram extremamente baixos. Na prática o que se observou foi o governo estadual jogar essa responsabilidade (testagem) para as administrações municipais, sendo que a grande maioria delas sequer possuem equipes técnicas qualificadas, além de possuir uma baixa disponibilidade de recursos financeiros. Portanto, a posição ocupada atualmente pelo estado catarinense no ranking nacional de testagem da população não é obra do acaso, mas sim de uma falta de compreensão, por parte das autoridades estaduais, da importância da temática da testagem da população para o controle da pandemia.

Neste sentido, as informações captadas pela última PNAD COVID19 divulgada em 23.12.2020 contrastam com a opinião de autoridades públicas estaduais. Por exemplo, nesse mesmo dia de dezembro quando a pesquisa estava sendo divulgada, o governador do estado, ao ser indagado sobre o expressivo número de casos da doença no estado em entrevista a uma rede de TV (naquela data SC passou a ser o 3º estado do país com maior número de pessoas contaminadas), simplesmente respondeu que o estado que têm maior número de casos é porque ele testou mais sua população, sendo esta uma tentativa de justificar a elevada contaminação da população devido a um amplo programa de testagem. A realidade está aí para desqualificar essa afirmação do governador, aliás, como tantas outras que vêm sendo ditas durante a pandemia. Portanto, senhor governador, os números não mentem, conforme sua afirmação na mesma entrevista!


[1] Professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais e do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador Geral do NECAT/UFSC e Pesquisador do OPPA/CPDA/UFRRJ. E-mail: l.mattei@ufsc.br. Artigo escrito em 08.01.2021.

[2] Esse e os próximos dois parágrafos foram transcritos da seção introdutória da PNAD COVID19, conforme referência bibliografia ao final desse artigo.

[3] SARS em inglês significa Severe Acute Respiratory Syndrome

Referências

FIOCRUZ-OBSERVATÓRIO COVID-19 (2020). Cobertura e positividade dos testes para Sars-CoV2: evolução, tendências recentes e recomendações. Rio de Janeiro: FIOCRUZ (Nota Técnica 16, 28 de dezembro de 2020).

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). INVESTIGAÇÕES EXPERIMENTAIS – PNAD COVID19, NOVEMBRO DE 2020