Atividade industrial catarinense estagnou em junho/22

23/08/2022 13:04

Matheus Rosa*

A mais recente Pesquisa Industrial Mensal do IBGE (PIM-PF/IBGE) registrou resultado de estagnação da produção física industrial no Brasil e em Santa Catarina. Pela perspectiva da série mensal com ajuste sazonal, a variação nacional foi de -0,4%, reiterando os fracos resultados que se apresentam desde o início do ano. Em Santa Catarina, na mesma série, o resultado foi de 0,2%, o que consolida o ritmo verificado nos dois meses anteriores e mantém o acumulado anual negativo.

Regionalmente, a pesquisa mostra um quadro bastante dispare, ainda que com certa hegemonia das pequenas variações características do quadro estagnativo. Os destaques positivos do mês ficaram por conta das expansões verificadas no Pará (9,8%), na Bahia (2,4%) e em Pernambuco (1,0%), únicos estados que apresentaram expansões para além da estagnação. Mato Grosso (-2,8%), Rio de Janeiro (-2,4%), Espírito Santo (-2,3%), por outro lado, registraram as maiores retrações. Já o estado de São Paulo, detentor do maior parque industrial do país, apresentou variação de 0,8%, patamar que contribuiu decisivamente para o desempenho do agregado nacional.

A manutenção desse ritmo oscilante da produção física passa pela persistência dos fatores conjunturais que desestimulam a atividade industrial. O desemprego ainda elevado, a continuidade da opção de aumento da taxa básica de juros frente o avanço inflacionário, o cenário externo abalado pela pandemia e pela guerra na Ucrânia, além do nível de incerteza causado pelas tensões políticas internas e externas, são alguns desses fatores limitantes.

Neste texto, à luz da conjuntura, serão analisados os resultados da PIM-PF/IBGE divulgados no início de agosto e referentes ao mês de junho/22, com destaque para o desempenho verificado pelas diferentes bases de comparação disponíveis e pelos resultados dos setores de atividades.

A atividade industrial no Brasil em junho de 2022

A Tabela 1 apresenta os resultados da produção física industrial a partir das quatro bases de comparação presentes na PIM-PF/IBGE, no período dos últimos doze meses. Na série mensal com ajuste sazonal, a variação de -0,4% registrada em junho é a quinta seguida característica de uma conjuntura estagnativa, sendo precedida por uma tendência visível de perda de ritmo que se estabeleceu a partir de fevereiro/22. A retração que se verificou em janeiro (-1,9%), por fim, colabora para o quadro negativo que é captado pela série e que também se expressa no movimento do índice de produção física no ano, ou seja, uma variação de -0,6% na comparação com o patamar de encerramento de dezembro de 2021. No período exposto pela tabela, apenas em dezembro/21 pode-se falar de uma expansão de fôlego. Nos demais meses, os resultados foram de retração ou de estagnação.

Tabela 1: Variação da atividade industrial do Brasil em vários períodos

T1 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

A comparação com junho de 2021 também apresentou retração, com variação negativa da ordem de -0,5%. Com esse resultado, a série mensal com base de comparação nos meses do ano passado registrou retrações em todos os meses do corrente ano, à exceção apenas de maio/22, consolidando um ritmo visivelmente inferior ao verificado em 2021. Os resultados regionais da série, contudo, mostraram alguns desempenhos positivos, como os verificados no Mato Grosso (18,8%), na Bahia (11,9%) e no Paraná (7,3%). Por outro lado, Rio de Janeiro (-4,0%), Minas Gerais (-3,8%), Pará (-3,6%) e Amazonas (-3,2%) registraram retrações significativas.

A disparidade em relação ao ritmo de 2021 também é visível nas séries acumuladas. No acumulado do ano de 2022 a retração registrada em junho foi de -2,2%, mantendo-se o movimento negativo estabelecido na referida série desde janeiro. Pela perspectiva do acumulado dos últimos doze meses, a retração foi de -2,8%, resultado que amplia as perdas de abril e de maio e sinaliza uma tendência de queda para os próximos meses. Ambas as séries realçam as dificuldades do setor industrial em estabelecer uma retomada da produção física, seja na comparação com os resultados de 2021, ano no qual a produção física foi fortemente contida por limitações macroeconômicas decorrentes da pandemia, ou na comparação com os meses de 2020 que entram na base de comparação do acumulado de doze meses.[1]

Em termos gerais, a debilidade do ritmo produtivo em 2022 se explica pela manutenção de entraves conjunturais como o desemprego elevado, o ciclo de alta da taxa básica de juros, a complexificação da conjuntura internacional decorrente da pandemia, da guerra da Ucrânia e da desaceleração chinesa, além do elevado nível de incertezas que se desenvolve interna e externamente e se manifesta na queda dos níveis de confiança.[2] Como saldo, resta a inconstância da série mensal de curto prazo e as retrações registradas na comparação com 2021, ano que, por si só, já havia registrado baixo dinamismo (IEDI, 2022).

A desagregação das informações por grandes categorias econômicas auxilia na compreensão dos resultados de junho/22, como ilustra a Tabela 2. Na série mensal com ajuste sazonal foi captado um movimento expansivo na indústria de bens de consumo duráveis, que registrou alta de 6,4% na comparação com maio. Nos demais segmentos, contudo, o cenário foi de retração ou de estagnação, sendo a variação de -1,5% registrada pela indústria de bens de capital a mais negativa no mês. A despeito da alta mensal, o setor de bens duráveis representa o pior resultado pela ótica anual, com retração de -11,7% na comparação com o período jan/jun-21. Os demais segmentos também regrediram nessa série, corroborando a tônica que se manifesta nos resultados da indústria geral. Em síntese, portanto, a desagregação mostra que a debilidade do ritmo produtivo é generalizada entre os macrossetores, ainda que o principal motor da retração seja a indústria de bens de consumo duráveis.

Tabela 2: Variação da atividade industrial do Brasil em vários períodos, por Grande Categoria Econômica, em junho de 2022

T2 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Desagregando pelos setores de atividades da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2.0), observa-se um cenário ainda mais complexo, conforme o exposto na Tabela 3. Em junho, 17 dos 28 segmentos registraram variações negativas, sendo que as mais expressivas estavam localizadas nas atividades de produtos farmoquímicos e farmacêuticos (-14,1%), impressão e reprodução de gravações (-8,4%) e outros equipamentos de transporte (-5,5%). Já os melhores resultados do mês ficaram por conta de artigos de vestuário e acessórios (7,1%), veículos automotores, reboques e carrocerias (6,1%), celulose, papel e produtos de papel (4,5%) e produtos de limpeza, perfumaria e higiene pessoal (4,3%).

Tabela 3: Produção Física Industrial do Brasil por Setores de Atividades, mês a mês com ajuste sazonal

T3 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Cabe o destaque para a trajetória do setor de artigos de vestuário, que alcançou com a alta de junho a segunda expansão no ano. Nos demais meses, a tônica foi de pequenas variações negativas, uma retração efetiva (em março) e uma expansão (em abril, em reação à queda de março), o que dá peso ao resultado de junho como um ponto fora da curva da trajetória recente. Vale acompanhar, a partir das próximas pesquisas, se esse resultado representará, ou não, uma reversão do sinal da trajetória do setor no ano.

O desempenho acumulado no ano por esses setores é representado pelo Gráfico 1. De imediato é visível a predominância dos resultados retrativos, uma vez que 18 dos 28 setores apresentaram variações negativas na comparação com o acumulado de jan-jun/21. A despeito dessa hegemonia, as atividades de coque, produtos derivados do petróleo (10,8%), produtos de fumo (8,1%), e manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos (6,8%) se destacam positivamente, com expansões em bom nível. Já os setores de fabricação de móveis (-19,8%), produtos têxteis (-16,8%) e máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-14,8%) tiveram as retrações mais expressivas, contribuindo para retrair o acumulado agregado.

Gráfico 1: Produção física industrial do Brasil por setores de atividade, acumulado no ano

G1 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

A atividade industrial catarinense em junho de 2022

O Gráfico 2 mostra os resultados de curto prazo da produção física industrial catarinense desde o início de 2020. Em junho/22, a variação de 0,2% caracterizou um movimento estagnativo na sequência das expansões registradas em abril e maio. De um ponto de vista mais amplo, o dado de junho é positivo por representar uma terceira variação positiva em sequência, fato que não ocorria desde janeiro de 2021. Por outro lado, é visível que houve uma perda do ritmo das expansões, indicando que novas retrações poderão estar presentes nos próximos meses.

Gráfico 2: Produção Física industrial em Santa Catarina, mês contra mês imediatamente anterior com ajuste sazonal

G2 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A síntese dos resultados da indústria catarinense nos últimos doze meses pode ser consultada através da Tabela 4, a partir das bases de comparação disponíveis na pesquisa. Para além do desempenho da série mensal com ajuste sazonal já destacado, a comparação com junho de 2021 também revelou um resultado estagnado, com variação de 0,6%. Essa é segunda variação positiva da série no ano, mostrando que, assim como no cenário anual, o ritmo produtivo catarinense no ano de 2022 é consideravelmente inferior ao que foi verificado no ano anterior.

As séries acumuladas também apontam para um cenário similar, com retrações tanto pela perspectiva do acumulado anual como pela ótica do acumulado de doze meses. Em junho/22, o acumulado anual da produção física catarinense registrou retração de -5,4%, mantendo a tendência de diminuição das retrações que se apresenta desde janeiro, porém ainda consideravelmente distante de um saldo expansivo. O acumulado de doze meses, por sua vez, registrou queda de -3,8%, superando o volume de retração de -2,3% registrado em maio/22.

Tabela 4: Variação da atividade industrial de Santa Catarina em vários períodos

T4 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Setorialmente, os resultados podem ser conferidos por meio da Tabela 5, que mostra os resultados pela comparação com os mesmos meses do ano anterior. Dos 12 setores presentes na pesquisa, sete deles registraram retrações, sendo as mais expressivas localizadas nas atividades de produtos de madeira (-19,2%), produtos têxteis (-15,1%) e metalurgia. Registraram expansões positivas os segmentos de produtos alimentícios (14,3%), artigos de vestuário e acessórios (13,7%) e produtos de metal (8,5%).

Chama atenção a continuidade da expansão do nível do setor de produtos alimentícios, atividade que nos meses anteriores a abril/22 se encontrava em regressão. Ao reverter tal tendência, nota-se que esse setor registrou expansões de 1,4% (abril), 15,2% (maio) 14,3% (junho) na comparação com os respectivos meses de 2021. A forte expansão de artigos de vestuário também é uma boa notícia, uma vez que parece indicar uma possível reversão do movimento de quedas que tinha sido registrado entre dezembro e março.[3] Em compensação, as trajetórias dos setores de metalurgia e de máquinas, aparelhos e materiais elétricos aparecem como as mais preocupantes. No caso do setor metalúrgico, a retração de -10,9% reforça as quedas que vêm se reeditando desde o mês de dezembro/21. Ainda pior é a conjuntura para o setor de máquinas, aparelhos e materiais elétricos, que vem registrando retrações significativas desde junho de 2021.

Tabela 5: Produção Física Industrial de Santa Catarina por Setores de Atividades, variação mensal em relação ao mesmo mês do ano anterior

T5 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Como saldo setorial tem-se, por fim, o exposto no Gráfico 3, que mostra o acumulado anual dos setores. Apenas o setor de produtos alimentícios registrou expansão a partir dessa base de comparação, com variação de 5,1% na comparação com o acumulado de jan-jun/21. Produtos de metal (0%) e veículos automotores (-0,1%), por sua vez, apresentaram resultados caracteristicamente estagnativos. A maioria dos resultados, porém, é bastante negativa, sendo as maiores quedas concentradas nas atividades de fabricação de produtos têxteis (-21,6%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-14,3%) e produtos de borracha e de material plástico (-12,5%).

Gráfico 3: Produção física industrial de Santa Catarina por setores de atividade, acumulado no ano

G3 I

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: Necat-UFSC.

Considerações Finais

Os resultados da produção física no mês de junho/22 revelam uma estagnação da atividade industrial. Nacionalmente, o patamar de -0,4% na série mensal com ajuste sazonal, seguindo um contexto de cinco resultados estagnativos seguidos, dá o tom da tendência estabelecida no momento. Já no estado de Santa Catarina a variação de 0,2% mostra que o ritmo de maio se manteve, sem ganhos ou perdas relevantes. Para os próximos meses, porém, fica o alerta de perda de ritmo que esse resultado sinaliza, podendo ser bastante provável a ocorrência de retrações.

O fundamental do momento é a percepção de uma espécie de “tempestade perfeita” que se formou para o setor industrial, o que passa pelos complexificadores macroeconômicos como o desemprego elevado e o ciclo de alta da taxa básica de juros e pela crescente incerteza advinda do setor externo. Todos esses fatores são desestimulantes para a atividade produtiva e criam limitações, tanto pela perspectiva da oferta como pela da demanda. Como resultado, tem-se um quadro de desaceleração que se estabeleceu desde o início da pandemia e que parece estar se agravando no ano de 2022 (IEDI, 2022).

Mesmo assim, existe a possibilidade de que nos próximos meses ocorra uma pequena reação do nível produtivo em decorrência dos melhores indicadores de emprego e da inflação observados nos meses de julho e agosto. Contudo, a manutenção do cenário externo instável e a escalada de incertezas que se forma rotineiramente num ano eleitoral devem condicionar o ritmo dessa reação. Da mesma forma, o que se desenha como a continuidade do aperto monetário estadunidense deve atuar como um fator crescentemente limitante da demanda do setor externo, o que por sua vez também poderá afetar negativamente a produção física da indústria no Brasil e em Santa Catarina.

Referências

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física (PIM). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, agosto de 2022.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física Regional (PIM Regional). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, agosto de 2022.

IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. Amenização das perdas industriais no 2º trim/22 Carta IEDI: edição 1155. Disponível em: <https://www.iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_1155.html>. Acesso em: 15 de agosto de 2022.

IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. Panorama da indústria de transformação na primeira metade de 2022. Análise IEDI. Disponível em: <https://www.iedi.org.br/artigos/top/analise/analise_iedi_20220816_industria.html>. Acesso em: 16 de agosto de 2022.


* Graduando em Ciências Econômicas na UFSC e bolsista do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense (Necat/UFSC). Email: matheusrosa.contato@outlook.com

[1] Aqui se trata eminentemente dos resultados do segundo semestre de 2020. O sinal de queda observado na série se explica, justamente, por conta do ritmo positivo verificado durante esses meses, em larga medida por conta dos programas emergenciais de estímulo à demanda.

[2] Em junho/22 os indicadores de confiança do empresário industrial auferidos pela CNI (-3%) e pela FGV (-8%) registraram retrações na comparação com o mesmo período de 2021.

[3] Produtos alimentícios é o setor de maior peso no Valor da Transformação Industrial (VTI) de Santa Catarina, com participação de 23,75%. Artigos de vestuário também é atividade importante para a indústria catarinense, representando 6,96% do VTI estadual. Especialmente por conta disso, merecem destaque os bons sinais desses setores em junho/22.