Após quedas sucessivas, indústria catarinense reage em novembro

25/01/2022 09:12

Por: Matheus Rosa[1]

A tendência retrativa da produção física industrial brasileira se confirmou, mais uma vez, em novembro último, como mostra a mais recente Pesquisa Industrial Mensal do IBGE (PIM-PF). Nacionalmente, a retração na série mensal com ajuste sazonal foi de -0,2%, o sexto resultado negativo seguido da produção física nessa série, deixando inequívoco o cenário de perdas que acomete o agregado nacional do setor. Em Santa Catarina, diferentemente, os resultados de novembro apresentaram indicador de considerável reação, com expansão de 5%, o que, em parte, reverte as quedas dos dois meses anteriores. Contudo, esse é apenas o terceiro registro expansivo presente entre os resultados mensais de 2021, mostrando que a tônica retrativa também foi norma em âmbito estadual durante o último ano.

O saldo das demais UFs mostra a disparidade que se consolidou na taxa agregada de -0,2%. Das 14 UFs, 7 apresentaram resultados positivos e outras 7 registraram resultados negativos. Os melhores saldos são advindos de Mato Grosso (14,6%), Santa Catarina (5%), Pará (3,5%) e Rio Grande do Sul (1,2%). Por sua vez, as maiores retrações ficaram por conta de Amazonas (-3,5%), Ceará (-2,5%), Rio de Janeiro (-2,2%) e Bahia (-1,7%). Já São Paulo, que conta com o parque industrial mais relevante do país, registrou variação de 1%. A forte expansão de Mato Grosso, evidentemente, foi o destaque do mês, com resultado catalisado pelos setores de produtos alimentícios e de produtos de madeira.

De modo geral, o quadro constituído pela pesquisa de novembro é de desigualdade nos resultados regionais e setoriais, com expansões localizadas, via de regra, em cenários anteriores de retração difundida. Assim, os resultados positivos registrados são responsáveis apenas pela reversão parcial das quedas anteriores, as quais expressaram a continuidade dos impactos da pandemia na atividade econômica, a resistência do desemprego elevado e o avanço da inflação. Desse modo, essas variações positivas não chegam, ainda, a representar tendências expansivas efetivas.

Nesse breve texto será construída uma análise a partir dos resultados da pesquisa, com intuito de lançar luz sobre a conjuntura estabelecida para o setor industrial e projetar os cenários mais prováveis para os próximos meses.

A atividade industrial do Brasil em novembro de 2021

A Tabela 1 apresenta uma síntese dos resultados da pesquisa a partir das quatro séries cultivadas. Na série mensal com ajuste sazonal, a mais adequada para verificar o ritmo de curto prazo da atividade industrial, registrou-se a variação negativa de -0,2%. Essa é a sexta retração seguida da série e o nono resultado negativo do ano, evidenciando a baixa capacidade de tração que caracterizou o setor industrial em 2021. Com isso, o saldo atual entre os meses de janeiro e novembro é de -7,7% e a comparação com fevereiro de 2020, último mês do pré-pandemia, é de retração de -4,3%, dados que mostram que ainda há um caminho considerável até a superação efetiva dos impactos da pandemia no setor.

Tabela 1: Variação da atividade industrial do Brasil em vários períodos

T1

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Na comparação com novembro de 2020, a partir da série que toma como base de comparação os resultados dos mesmos meses dos anos anteriores, a retração foi de -4,4%. Assim como nos três meses anteriores, os quais também registraram retrações, esse resultado é sintomático da forte diferença de desempenho verificada entre o segundo semestre de 2020 e os últimos meses de 2021. Enquanto neste o ritmo é de vacilância com leve tendência de queda, naquele a tônica era de recuperação após os piores meses da pandemia, com altas sustentadas em diversos setores. Em âmbito regional, os resultados dessa série também foram hegemonicamente negativos. Das 14 UFs, 9 apresentaram retrações, sendo bastante expressivas as que foram localizadas em Bahia (-15,7%), Amazonas (-13%), Ceará (-11,1%) e São Paulo (-6,9%). Positivamente se destacaram Mato Grosso (28%), Espírito Santo (4,7%) e Rio de Janeiro (4,6%).

Por fim, as duas últimas séries ilustram os resultados acumulados. A primeira, cuja base de comparação é o acumulado do ano anterior, registra a expansão de 4,7%, enquanto a segunda, que compara o acumulado dos últimos doze meses com o acumulado dos doze meses precedentes, apresentou expansão de 5%. Em ambos os casos, as taxas positivas são decorrentes das bases de comparação deprimidas ao longo de 2020 e do carregamento estatístico da segunda metade de 2021, quando medidas de auxílio emergencial deram respiro provisório à economia nacional. Como mostra recente estudo do IEDI, esses resultados são bastante ilusórios, de modo que “para além das aparências”, o quadro verdadeiro é constituído por quedas, estagnações e desconfianças dos empresários do setor. (IEDI, 2021).

Portanto, os resultados de novembro mais uma vez corroboram a conjuntura hegemonicamente negativa que hoje acomete o setor industrial. A série mensal com ajuste sazonal, em especial, reflete esse cenário ao ilustrar a vacilância dos resultados de curto prazo e sua incapacidade de formação de uma tendência estável e positiva que reverta as quedas registradas ao longo de todo o ano. Já a comparação com os meses de 2020 mostra que o ritmo atual é bastante inferior ao verificado no segundo semestre daquele ano, além de ilustrar a importância e o potencial de uma bem direcionada política econômica de incentivo à demanda para os índices de produção industrial na conjuntura da crise.[2] De modo geral, é possível afirmar que os principais fatores para esse cenário adverso se encontram nos atuais dilemas macroeconômicos brasileiros, a saber, a manutenção do desemprego elevado, a baixa expectativa de crescimento econômico e a aceleração do processo inflacionário. Além disso, problemas nas cadeias de fornecimento do setor industrial – os quais foram em grande medida causados pelo impacto da pandemia – também potencializam a crise. Exemplo desses entraves foi a escassez de supercondutores que durante vários meses atravancou a produção de setores estratégicos para o saudável funcionamento do setor industrial.

A análise do desempenho dos setores de atividade expande o escopo da análise, como ilustra a Tabela 2, que mostra os resultados mensais na série com ajuste sazonal. De pronto, se destaca o bom resultado do conjunto das indústrias extrativas, com expansão de 5%. A maior representatividade da indústria de transformação, contudo, com sua retração de -0,4%, acaba por ser responsável pela taxa agregada negativa. Em relação aos setores em maior nível de desagregação, a pesquisa de novembro apresentou expansão em 13 dos 25 setores pesquisados, sendo os destaques positivos por conta de produtos alimentícios (6,8%) – que reage após meses de quedas sucessivas -, produtos de fumo (4,9%) e produtos de madeira (3,6%). Já produtos de borracha (-4,8%), produtos diversos (-4,5%) e produtos de limpeza e higiene pessoal (-4,5%) apresentaram os piores resultados. Em nível geral, o quadro setorial apresenta falta de uniformidade, com bastante disparidade entre os resultados obtidos pelos ramos de atividade.

Tabela 2: Produção Física Industrial do Brasil por Setores de Atividades, mês a mês com ajuste sazonal

T2

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

O acumulado dos setores na série anual, contudo, continua majoritariamente positivo, o que também se explica, em grande medida, pelas bases de comparação deprimidas, como mostra o Gráfico 2. As indústrias extrativas registram acumulado de 1%, na comparação com o acumulado do mesmo período de 2020. Já as indústrias de transformação consolidaram acumulado de 5,2%. No âmbito dos subsetores de atividades, destacam-se fabricação de máquinas e equipamentos (26,8%), veículos automotores, reboques e carrocerias (23,2%) e impressão e reprodução de gravações (19,2%).[3] Aparecem negativamente os setores de produtos alimentícios (-8,5%), manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos (-6,8%) e produtos de limpeza e higiene pessoal (-4,8%). Vale notar, ainda, que a retração de produtos alimentícios puxa grande parte da taxa acumulada da indústria geral, já que esse é o setor de maior participação no parque industrial nacional. A relativa resiliência que o setor apresentou em 2020, regredindo menos que a maioria dos setores, e as dificuldades para o consumo interno que se apresentam em 2021, em especial decorrentes do processo inflacionário, explicam esse resultado.

Gráfico 1: Produção física industrial do Brasil por setores de atividade, acumulado no ano

G1

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A atividade industrial de Santa Catarina em novembro de 2021

A trajetória da produção física industrial catarinense nos últimos 24 meses pode ser observada pelo Gráfico 3. Após as bruscas quedas de março e abril de 2020, meses iniciais da pandemia, a atividade industrial observou um período de altas sustentadas até dezembro, em decorrência, principalmente, dos programas de incentivo à demanda promovidos pelos entes estatais. Com a entrada em 2021, e o encerramento de boa parte desses programas, a produção física arrefeceu e adentrou um novo ciclo de retrações, perdurando de fevereiro até julho. Nesse período também se intensificaram os problemas relativos ao desemprego elevado e à inflação, de modo que a esfera macroeconômica acabou influenciando diretamente os índices de produção. Em agosto foi registrada uma alta localizada, cuja magnitude foi capaz apenas de reverter uma parcela muito pequena das perdas dos meses anteriores. Nos dois meses seguintes, novas retrações deram continuidade no ciclo de retrações. Por fim, novembro registrou expansão de 5%, resultado que, ainda que positivo, possui força apenas para anular parte da perda consolidada em outubro. Com isso, o saldo entre os períodos de janeiro e novembro registra a forte retração de -8,5%, sintomática do cenário negativo acima referido.

Gráfico 2: Produção Física industrial em Santa Catarina, mês contra mês imediatamente anterior com ajuste sazonal

G2

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Os resultados consolidados das quatro séries presentes na pesquisa podem ser vistos na Tabela 3. A série mensal com ajuste sazonal registrou em novembro a citada expansão de 5%, a qual representou a terceira variação não-negativa de 2021. Nos outros nove meses, todos os resultados foram de retração, ilustrando o fraco ritmo da atividade industrial catarinense em 2021.

A série mensal com base nos mesmos meses de 2020 também expressa esse cenário negativo. A partir de maio, mês no qual os resultados ainda eram positivos, já era visível uma diminuição no ritmo de altas, causado, por um lado, pelo desempenho sucessivamente negativo em 2021 e, por outro lado, pelo ritmo crescente que inflou as bases de comparação a partir do segundo semestre de 2020. Outubro foi o primeiro mês de retração da série no ano, e novembro, com retração de -2,6%, consolidou a tendência de quedas até o final do ano. Essa série mostra, assim como nos dados nacionais, a forte diferença de desempenho entre o segundo semestre de 2020 e os últimos seis meses de 2021.

Por fim, as séries acumuladas continuam apresentando resultados positivos, ainda que também apresentem uma diminuição sucessiva do ritmo das expansões. Na ótica do acumulado no ano, a expansão é de 12,4%, enquanto na série de doze meses o resultado é de 12,8%. Em ambos os casos as variações são superiores aos resultados nacionais, indicando que, ao menos relativamente, a produção catarinense tem reagido melhor aos impactos sofridos em 2020.

Com isso, fica nítido que o ano de 2021 também não tem sido positivo para a atividade industrial em Santa Catarina. Ainda que os indicadores acumulados apontem para taxas positivas, a sucessão de resultados negativos nas séries mensais e a até agora inexistente visualização de uma contratendência de altas demonstram os diversos problemas que acometeram o parque industrial catarinense ao longo do último ano. Assim como no caso nacional, o principal motor desse fraco desempenho é a debilidade macroeconômica que caracteriza a economia brasileira nos últimos anos e, ainda com mais força, após a eclosão da pandemia. Os problemas do desemprego, da queda nos níveis de renda, da inflação crescente e do baixo crescimento econômico, afetam de maneira decisiva as possibilidades de investimento e aumento da produção no setor industrial. Em Santa Catarina não é diferente.

Tabela 3: Variação da atividade industrial de Santa Catarina em vários períodos

T3

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A Tabela 4 complemente esse cenário ao apresentar os resultados setoriais, na comparação com os mesmos meses de 2020. Dos 10 setores de atividade presentes na pesquisa regional de Santa Catarina, 5 apresentaram resultados positivos. Máquinas e equipamentos (14%), veículos automotores, reboques e carrocerias (12,9%) e metalurgia (4,6%), consolidaram os melhores resultados, desempenhando bem em relação a novembro de 2020. Já produtos alimentícios (-7,9%), outros produtos químicos (-7%), produtos de minerais não-metálicos (-6,6%) apresentaram as maiores retrações. O desempenho de produtos alimentícios é especialmente preocupante, dado que o setor representa quase 20% do Valor da Transformação Industrial de Santa Catarina. O setor tem acumulado quedas sucessivas desde junho, sendo em quase todos esses meses a pior retração entre os setores do parque industrial do estado. É difícil imaginar uma recuperação efetiva da atividade industrial de Santa Catarina sem uma mudança radical do rumo no setor de produtos alimentícios.

Tabela 4: Produção Física Industrial de Santa Catarina por Setores de Atividades, variação mensal em relação ao mesmo mês do ano anterior

T4

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC

Assim como nos dados nacionais, os acumulados setoriais registram resultados hegemonicamente positivos em decorrência do péssimo desempenho de 2020. O fraco desempenho de produtos alimentícios (-11,3%) também se expressa por essa ótica, sendo o setor o único a registrar retração na comparação com o acumulado de 2020. Em relação aos demais setores, são expressivas as expansões de metalurgia (49,5%), veículos automotores, reboques e carrocerias (41,2%) e máquinas e equipamentos (27,1%).

Gráfico 3: Produção física industrial em Santa Catarina por setores de atividades, acumulado no ano

G3

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Considerações Finais

A tônica da produção industrial evidenciada pelos resultados de novembro é de desaceleração do ritmo de atividades. Em nível nacional, a desaceleração se mostra a partir do novo resultado negativo presente na série mensal com ajuste sazonal e pela forte retração na comparação com novembro de 2020. Em Santa Catarina, a despeito da recuperação relevante na série mensal, com expansão de 5%, a tendência dos meses anteriores e a retração em relação a novembro do ano retrasado mostra que para os próximos meses o cenário mais provável é de manutenção da tendência de quedas.

Em nível setorial, o setor de produtos alimentícios representa a maior das preocupações por registrar, em nível nacional e estadual, os piores resultados. Ainda que essas retrações sejam em parte consequência da relativa resiliência que o setor demonstrou em 2020, a sucessão de resultados negativos durante todo o ano de 2021 constrói um saldo bastante negativo para o setor, deixando poucas perspectivas de reversão dessa tendência no curto prazo.

É claro, a recuperação dos setores só poderá ocorrer a partir de uma reversão geral nos rumos da economia nacional. Continua fundamental o estabelecimento de políticas macroeconômicas que enfrentem o desemprego, a queda de renda e a aceleração da inflação. Sem essas medidas é difícil visualizar um cenário de retomada do crescimento econômico, o que, por sua vez, afeta diretamente a confiança dos empresários e capacidade de investimento, fatores que afetam diretamente os níveis de produção industrial.

Referências Bibliográficas

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física (PIM). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, novembro de 2021.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física Regional (PIM Regional). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, novembro de 2021.

IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. Carta IEDI 1124: Para além das aparências. Disponível em: https://www.iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_1124.html.


[1] Graduando em Ciências Econômicas na UFSC e bolsista do NECAT. Email: matheusrosa.contato@outlook.com

[2] Lembrando que durante o segundo semestre de 2020 foram vigentes as políticas de auxílio emergencial direcionadas aos cidadãos de baixa renda, desempregados ou economicamente fragilizados pela pandemia. Essas políticas sustentaram de maneira provisória o consumo das famílias e, dada a maior expectativa de renda, aumentaram também a confiança dos macrossetores da economia para incremento da produção.

[3] Note-se que dos 6 setores com maior acumulado, 5 foram signatários das maiores quedas na produção física decorrentes da pandemia. Veículos automotores e máquinas e equipamentos, especialmente, foram setores que praticamente paralisaram a produção nos meses de março e abril de 2020.