Evolução do setor de serviços no Brasil e em Santa Catarina até agosto de 2021

16/11/2021 10:09

Por: Lauro Mattei[1]

Breves notas sobre o setor de serviços no Brasil no ano de 2021

O Gráfico 1 apresenta a variação do volume de serviços desde janeiro de 2018, destacando-se que a queda das taxas do volume de serviços se acelerou a partir do mês março de 2020 quando teve início a incidência da COVID-19, processo que se aprofundou ao longo de todo primeiro semestre  do referido ano. A partir daí o setor iniciou um processo de recuperação nos seis meses seguintes, ainda que de maneira lenta. Em função disso, o desempenho setorial agregado do país ao final do ano de 2020 ainda se encontrava abaixo do valor verificado no mês de janeiro, além de se situar bem abaixo do nível inicial da série em janeiro de 2018.

O ano de 2021 começou com a continuidade desse processo de recuperação, a qual perdurou apenas nos meses de janeiro e fevereiro. O crescimento nesse último mês da ordem de 3,7% representou o nono período seguido de alta do setor registrada pela Pesquisa Mensal de Serviços (PMS)[2] do IBGE nas comparações feitas com os meses imediatamente anteriores. Todavia, com o recrudescimento da pandemia no primeiro semestre de 2021, as atividades de serviços voltaram a ser afetadas. Com isso, o mês de março de 2021 representou a interrupção da sequência de resultados positivos que vinha sendo registrada desde o segundo semestre de 2020.

Para tanto, observa-se que três dos cinco grupos de atividades que compõem o estudo dos serviços no Brasil tiveram desempenho negativo no referido mês, destacando-se setor de serviços prestados às famílias, sem dúvida um dos mais afetados ao longo de toda a pandemia e o principal setor responsável pela queda geral dos serviços no país, além dos setores de serviços profissionais, administrativos e complementares, de serviços de transporte, auxiliares ao transporte e correios. Apenas os setores de serviços de informação e comunicação e de outros serviços apresentaram resultados positivos, porém sem conseguir redefinir o resultado agregado do setor de serviços no referido mês.

Gráfico 1: Índice do volume de serviços, Brasil (2018=100, com ajuste sazonal)

G1

Fonte: PMS-IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A partir do mês de abril é possível verificar a retomada mais efetiva do setor, conforme informações contidas na Tabela 1. Inicialmente é importante destacar que o processo de recuperação esboçado no ano de 2020, e seguido nos dois primeiros meses de 2021, foi lento e incapaz de reverter os grandes impactos verificados nos primeiros seis meses de incidência da Covid-19, destacando-se que os bons resultados obtidos em fevereiro de 2021 foram praticamente anulados no mês seguinte. Neste sentido, apresenta-se uma análise relativa aos quatro meses seguintes (abril a julho/21), período que corresponde ao processo de recuperação atual, cujas informações são reveladoras de distintas situações em curso. Assim, quando se considera o mês em relação ao mês anterior, nota-se que os percentuais desse período, embora positivos, são bastante baixos, indicando que a recuperação continuava patinando. Tal afirmação é corroborada pelo fato de que somente a partir de junho o setor superou o patamar registrado no período prévio ao início da pandemia. Já quando se considera esses meses em relação aos mesmos meses do ano anterior tem-se a falsa impressão de que ocorreu uma explosão de crescimento, uma vez que esses quatro meses do ano de 2020 foram aqueles com os maiores resultados negativos, fazendo com que a base de cálculo seja responsável por esses resultados positivos bastante expressivos no período aqui considerado, ou seja, se a base de comparação estiver em queda, qualquer recuperação mostrará resultados bons nos períodos próximos, porém ruins para períodos mais distantes. Tanto é assim que somente a partir do mês de abril/21 os resultados acumulados no ano passaram a ser positivos, enquanto os resultados acumulados nos últimos doze meses passaram a ser positivos somente a partir do mês de junho/21.

Tabela 1: Variação do volume de serviços no Brasil em diversos períodos

T1

Fonte: PMS-IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Em síntese, pode-se afirmar que esse período de quatro meses (abril a julho) apresentou como principais características: a interrupção de três quadrimestres negativos no acumulado do ano; a recuperação mais homogênea dos cinco grupos de atividades pesquisadas, especialmente a partir dos meses de junho e julho/21; uma recuperação mais consistente do grupo de atividades Serviços Prestados às Famílias, sem dúvida um dos setores mais afetados pela pandemia; e uma retomada a partir de julho acima do patamar existente em março/16, muito embora tal nível ainda permaneça 7,7% abaixo do patamar recorde obtido em novembro de 2014.

Por fim, apresentamos o cenário atual do setor com base nas informações da PMS de agosto/21.  Com relação ao mês anterior, observou-se um aumento de apenas 0,5%, indicando um processo de desaceleração da recuperação que vinha ocorrendo nos meses anteriores. De alguma forma, esse comportamento pode estar relacionado à crise econômica que já está exercendo todos os seus efeitos sobre o conjunto de atividades relativas à grande área de serviços. Mesmo assim, assinala-se que é a quinta taxa consecutiva com resultados positivos.

Na comparação com mesmo mês do ano anterior, verificou-se um resultado positivo pelo sexto período seguido, fazendo com o setor esteja 4,6% acima do patamar verificado em fevereiro/20. Já a comparação em relação aos últimos 12 meses apresentou um dos melhores patamares para o mês de agosto, indicando uma possível recuperação do conjunto do setor em níveis mais consistentes, uma vez que praticamente todos os principais setores dos cinco grupos de atividades apresentaram resultados positivos no mês considerado. Finalmente, no acumulado dos últimos 12 meses nota-se que somente a partir do mês de junho os resultados deixaram de ser negativos, fato que revela o quanto esse grupo de atividades foi afetado durante os períodos mais agudos da pandemia.

A Tabela 2 apresenta a evolução do setor segundo os grupos de atividades para o período entre junho e agosto/21. Embora não apresentando as informações completas para todo o período em análise (abril a julho), é possível apresentar alguns aspectos centrais desse período.  Em primeiro lugar, deve-se registrar que os resultados positivos apresentados a partir de abril/21 estão diretamente relacionados à recuperação dos Serviços prestados às famílias, o qual apresentou as maiores taxas dentre todos os grupos de atividades considerados pela PMS, ou seja, crescimento de 9,3% em abril, 17,9% em maio, 8,5% em junho e 3,8% em julho. Esse comportamento representou um ganho acumulado de aproximadamente 39% entre os meses de abril e julho/21. Neste caso, o destaque particular vai para o setor de Alojamento e Alimentação devido ao bom desempenho dos segmentos de hotéis, pousadas, bares, restaurantes, serviços de buffet, etc. Como são atividades que dependem da presença de público, sem dúvida alguma que o processo de expansão da vacinação contra a Covid-19 em todo o país atuou de forma consistente, uma vez que permitiu maior flexibilização do isolamento social levando a uma maior movimentação das pessoas em busca desses locais. Com isso, desde julho/20 esse grupo de atividades apresentou resultados positivos em todo período, exceto no mês de março/21. Mesmo com esses avanços, em julho/21 o setor ainda operava com percentual negativo de 23% em relação ao registrado em fevereiro/20, sendo a única atividade da área de serviços que ainda não tinha superado o nível pré-pandemia.

Tabela 2: Evolução do volume de serviços entre junho e agosto/21, segundo os grupos de atividades principais

T2

Fonte: PMS-IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Além do grupo de Serviços prestados às famílias, merece destaque nesse processo de recuperação o grupo de atividades de Transportes, serviços auxiliares de transportes e correio. Também favorecidos pelas novas condições de controle da pandemia no país, observa-se que os setores de transportes aéreo e rodoviário, transportes de cargas, correios, etc. apresentaram resultados positivos no período considerado. Mas é importante destacar que grande parte das atividades desse setor também é afetada pelos impactos negativos da crise econômica em curso, especialmente da elevação da inflação, fazendo que a recuperação passe a ser instável e em percentuais bem abaixo do que teria condições de apresentar.

Já o destaque negativo fica por conta do grupo de atividades de Serviços de Informação e Comunicação, uma vez que tem oscilado ao longo do período considerado, seja apresentando resultados negativos ou resultados positivos pífios.  Esse comportamento é influenciado pelos resultados negativos dos setores de audiovisuais, de notícias, de atividades de telecomunicações, etc.

Por fim, apresentamos o cenário atual desses grupos de atividades com base nas informações da PMS de agosto/21. Na análise comparativa com o mês imediatamente anterior verifica-se que quatro grupos de atividades apresentaram resultados positivos, porém três deles com percentuais bastante baixos, como é o caso do setor de transportes e do setor de serviços de informação e comunicação, que se recuperou do resultado negativo do mês anterior. Já o setor dos serviços profissionais, administrativos e complementares apresentou resultado negativo, sendo que nos mês anterior o resultado tinha sido praticamente nulo. Novamente, o grupo de atividades de serviços prestados às famílias foi determinante para a obtenção do resultado positivo em agosto/21. Todavia, no comparativo com o mesmo mês do ano anterior, nota-se uma desaceleração dos percentuais quando se leva em conta os mesmos resultados apresentados em julho/21. Finalmente, o setor de serviços prestados às famílias foi o único com resultados negativos quando se considera o acumulado dos últimos doze meses. Em grande parte, esse resultado decorre dos grandes déficits provocados por alojamento e alimentação, subsetores que só recentemente começaram a se recuperar dos impactos da pandemia.

O comportamento do setor de serviços em Santa Catarina até agosto de 2021

O gráfico 2 apresenta a evolução do volume de serviços em Santa Catarina desde o mês de janeiro de 2018, destacando-se que a trajetória é muito semelhante ao comportamento verificado para o país (Gráfico 1). Após uma forte queda no primeiro semestre de 2020, ocorreu uma expressiva recuperação nos meses seguintes, porém com uma desaceleração entre os meses de novembro e dezembro do referido ano, mesmo que tenham sido registrados oito resultados positivos. Com isso, o setor de serviços do estado fechou o ano de 2020 no nível próximo ao verificado em meados de 2019. O ano de 2021 iniciou com dois meses bastante positivos para, na sequência, ocorrer dois meses com resultados negativos, chamando atenção para o percentual oposto no mês de abril (negativo) em comparação com o resultado do país. Como consequência, interrompeu-se uma recuperação que havia sido iniciada no primeiro mês do ano, condição que colocou o setor no mesmo patamar verificado no primeiro semestre de 2016. Na sequência, observam-se novamente dois meses (maio e junho) com percentuais positivos muito expressivos, inclusive bastante superiores ao próprio resultado do agregado nacional, porém com mais dois com crescimento praticamente zerado, fazendo com que a curva de crescimento do setor se estabilizasse, comportamento muito distinto do país, que segui sua expansão por cinco meses seguidos. Em síntese, as informações dos primeiros oito meses de 2021 do setor de serviços em Santa Catarina revelaram um comportamento muito instável e incerto.

Gráfico 2: Índice do volume de serviços, Santa Catarina (2018=100, com ajuste sazonal)

G2

Fonte: PMS-IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A Tabela 3 apresentação a variação do volume de serviços nos últimos doze meses. Quando se compara o mês com o imediatamente anterior para o primeiro semestre de 2021, nota-se que durante quatro meses ocorreram resultados positivos, sendo que o princípio do ano indicava uma aceleração da expansão do setor de serviços, a qual foi fortemente interrompida nos meses de março e abril. Em grande medida, esse comportamento pode estar associado ao processo de recrudescimento da pandemia exatamente nesses dois meses, o qual obrigou a reforçar algumas medidas preventivas, dentre as quais se destaca o isolamento social. Já a comparação com os mesmos meses do ano anterior revela percentuais bastante expressivos, os quais precisam ser minimizados, tendo em vista os severos impactos da pandemia nos primeiros meses de 2020. Esse aspecto aparece quando se considera o acumulado dos últimos 12 meses, uma vez que somente a partir de abril de 2021 surgiram os primeiros resultados positivos, ainda que em níveis bastante tímidos.

Já os resultados dos dois primeiros meses do segundo semestre de 2021 foram decepcionantes, uma vez que o ritmo de crescimento registrado nos dois meses anteriores não se manteve. Esse comportamento provocou uma queda do ritmo de crescimento quando comparado aos mesmos meses do ano anterior, período em que o setor de serviços apresentou forte recuperação após os grandes impactos dos primeiros meses de incidência da pandemia. Mesmo assim, quando da divulgação desses resultados pífios, autoridades estaduais preferiram ficar enaltecendo o crescimento comparativo em relação ao ano anterior, chegando a afirmar que as informações divulgadas pelo IBGE revelaram que o setor de serviços estava se recuperando firmemente.

Tabela 3: Variação do volume de serviços de Santa Catarina em diversos períodos

T3

Fonte: PMS-IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A Tabela 4 apresenta a variação percentual das atividades de serviços até o mês de agosto de 2021. Quando se considera o resultado do mês (agosto) com o mês imediatamente anterior, nota-se a expressiva recuperação do setor de serviços prestados às famílias, seguida pela expansão do setor de transportes, os quais são responsáveis pelos resultados positivos no referido mês, ainda que possam ser considerados bastante pífios diante dos resultados registrados em maio e junho. Já o acumulado no ano mostrou-se bastante favorável, sendo que os melhores resultados foram apresentados pelos setores de transportes e de serviços profissionais, administrativos e complementares.

Todavia, quando se analisa os resultados acumulados ao longo dos últimos doze meses, verifica-se que os serviços prestados às famílias, apesar das expressivas taxas de crescimento no segundo trimestre de 2021, ainda continuam apresentando um percentual negativo. Tal fato se deve ao longo período de isolamento social a que uma parcela expressiva da população foi submetida como forma de controle da pandemia. E isso afetou fortemente as atividades desse grupo de atividades, especialmente dos setores de alimentação e habitação.  Já no sentido oposto, observa-se que o setor de Serviços profissionais, administrativos e complementares apresentou um acumulado expressivo até o mês de agosto. Tal comportamento pode estar associado ao retorno das atividades administrativas empresariais em vários setores de atividades, com ampliação de novos serviços profissionais.

Tabela 4: Variação (%) das atividades de serviços em Santa Catarina entre junho e agosto de 2021

T4

Fonte: PMS-IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Considerações Finais

O volume de serviços do país nos primeiros oito meses de 2021 apresentou um processo de recuperação extremamente importante, considerando-se que o setor terciário é responsável por aproximadamente 60% do PIB Nacional. Após cinco taxas positivas seguidas, nota-se um ganho de 65,5% no corrente ano. Com isso, o grupo de atividades de serviços está 4,6% acima do patamar registrado antes do início da pandemia. Mesmo assim, o setor continua 7,1% abaixo do recorde histórico obtido no mês de novembro de 2014.

É importante registrar que esses percentuais estão atrelados ao processo de recuperação observado a partir do mês de abril de 2021. Neste caso, destaca-se o papel decisivo da vacinação contra a Covid-19, a qual permitiu que as pessoas aumentassem sua mobilidade, arrefecendo o isolamento social em que se encontravam desde o início da pandemia. Com efeito, a recuperação do grupo de atividades de prestação de serviços às famílias e do grupo de atividades de transportes foi decisiva para a obtenção dos resultados positivos apresentados pela PMS de agosto de 2021.

No entanto, duas características desse processo devem ser registradas: por um lado, os resultados são muito distintos entre as diversas unidades da federação, sendo que no mês de agosto/21 apenas 16 das 27 unidades federativas apresentaram resultados positivos e, por outro, os grupos de atividades de serviços apresentam comportamentos muito distintos, muito embora todos eles já tenham atingido e/ou superado os patamares existentes no período pré-pandemia.

No caso particular de Santa Catarina, observa-se que os dois últimos meses (julho e agosto) revelaram um comportamento bem adverso em relação aos resultados do conjunto do país, um vez que enquanto nesse era positivo, o estado catarinense apresentou taxas praticamente nulas. Mesmo que o cenário nacional mostre algumas unidades da federação em condições muito piores que a catarinense, deve-se destacar que os últimos meses revelaram certo esgotamento das taxas diferenciais desse setor catarinense em relação ao restante do país. Além disso, os primeiros oito meses mostraram um setor altamente instável, sendo que em dois meses as taxas foram negativos e em outros dois elas foram praticamente nulas. Esses elementos revelam uma tendência incerta desse setor também no estado de Santa Catarina, especialmente após o aprofundamento da crise econômica atual.


[1] Professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais e do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador Geral do NECAT-UFSC e Pesquisador do OPPA/CPDA/UFRRJ. Email: l.mattei@ufsc.br

[2] É importante registrar que a PMS organiza as informações a partir de 5 Grupos de Atividades que são divididos em 166 tipos de serviços pesquisados em todo o país.