Indústria catarinense registra pior queda entre as UFs e encerra ano marcado por instabilidade e fraco crescimento

24/02/2022 08:31

Por: Matheus Rosa[1]

A Pesquisa Industrial Mensal (PIM-PF/IBGE) divulgada em fevereiro, com dados referentes aos resultados de dezembro, reafirmou a tendência retrativa e a instabilidade que caracterizaram a produção industrial ao longo de todo o ano. Em âmbito estadual, o resultado catarinense apresentou retração de -2,7% na série mensal, revertendo parte da expansão verificada em novembro e consolidando o oitavo resultado negativo da série no ano. Já nos dados nacionais foi registrada expansão de 2,9%, resultado que indica uma breve reação, mas que no contexto das retrações dos meses anteriores representa apenas o suspiro de um ano agonizante para a indústria nacional.

No escopo dos demais resultados regionais ocorreram expansões em 9 das 14 Unidades da Federação (UFs) pesquisadas, sendo as de maior relevância localizadas em Amazonas (14%) – cujo resultado expressivo puxou em grande medida a taxa agregada -, Goiás (8,8%) e Paraná (7,6%). O resultado de São Paulo (3,8%) também contribuiu consideravelmente para o resultado nacional, dado que o estado concentra parte importante do parque industrial nacional. Das UFs restantes, 4 apresentaram resultados negativos e uma registrou estagnação. Santa Catarina obteve o pior resultado dentre todos os estados, com retração de -2,7%.

Os resultados de dezembro encerram um ano caracterizado por fracos resultados mensais e por uma perceptível instabilidade que percorreu todos os setores de atividades. Como consequência, o saldo anual de variação do índice de produção física é negativo nos dados nacionais (-4,3%) e catarinenses (-11,4%). Esse panorama demonstra que, a despeito das expressivas “expansões” registradas nas séries que utilizam os meses de 2020 como base de comparação, o parque industrial nacional ainda foi em 2021 duramente afetado pelos impactos econômicos da pandemia e pela insistente crise econômica brasileira, cujos efeitos na atividade industrial já eram evidentes ainda antes da Covid-19.

Nesse breve será apresentada uma análise da PIM-PF/IBGE de dezembro no contexto dos resultados obtidos ao longo do ano, bem como será constituído um prognóstico possível para os próximos meses, sob luz das possibilidades elencadas pelo atual cenário macroeconômico.

A atividade industrial do Brasil em dezembro de 2021

O Gráfico 1 ilustra a trajetória do índice de produção física industrial a partir de 2010. É nítida a tendência retrativa consolidada desde o início da série, cujas variações alcançaram patamar de certa estabilidade a partir de dez/15, porém num nível bastante reduzido na comparação com o início da década (redução de -15,8% na comparação com janeiro de 2010). O advento da pandemia ocasionou duas grandes retrações localizadas em março (-7,7%) e abril (-19,6%) de 2020, com impactos amplamente difundidos entre todos os setores de atividades. Nos meses seguintes ocorreu recuperação gradual até o reestabelecimento do mesmo patamar do pré-pandemia, contudo em nível ligeiramente inferior. Em dezembro de 2021 o saldo é de retração de -2,6% em relação a fevereiro de 2020, mês imediatamente anterior à deflagração da pandemia.

Gráfico 1: Índice de Produção Física Industrial, Brasil (2010=100)

G1

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Esse patamar alcançado em dezembro pode ser observado também pela ótica das quatro séries de comparação presentes na pesquisa, como aparece de forma sintética na Tabela 1. Na série mensal foi registrada variação de 2,9%, apenas o segundo indicador expansivo dentre todos os meses do ano (em janeiro e novembro ocorreram resultados não-negativos, porém signatários de estagnação). Com isso, o saldo de variação do índice em 2021 é de -4,3%, resultado sintomático do parco ritmo de produção alcançado no ano pelo setor.

Tabela 1: Variação da atividade industrial do Brasil em vários períodos

T1

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A série mensal com base nos meses de 2020 também registrou variação negativa, na magnitude de -5%. A dinâmica dessa série mostra como os resultados mensais foram positivos uma vez que comparados com os meses do primeiro semestre de 2020 e negativos a partir do segundo semestre. Esse quadro é compreensível dado que as bases de comparação no primeiro semestre de 2020 foram bastante deprimidas pelo momento inicial da pandemia e só se elevaram a partir de julho, quando os programas federais de incentivo à demanda começaram a impactar os níveis de produção industrial.

Já nas séries acumuladas, a expansão consolidada foi de 3,9%. Esse resultado é interessante pois compara o acumulado de 2021 com o acumulado do ano anterior, nivelando, portanto, os dois momentos diferentes de 2020 acima mencionados. Ainda que positivo, esse resultado não é exatamente animador, dado que em 2020 foram registradas as maiores retrações da série histórica, de modo que essa recuperação retratada nas séries acumuladas apenas realoca o índice no já rebaixado patamar anterior.

O quadro setorial desses resultados pode ser conferido a partir da Tabela 2, que apresenta as variações mensais dos diferentes setores de atividade a partir do segundo semestre. Em relação aos níveis de menor desagregação, aparecem as expansões registradas em dezembro nas indústrias extrativas (1,6%) e nas indústrias de transformação (2%). Em relação às indústrias extrativas, a variação mantém a tendência expansiva presente na maioria dos meses do segundo semestre. Já o resultado das indústrias de transformação representa apenas a primeira expansão dos últimos sete meses.

Nos setores em maior desagregação o saldo foi de expansões em 18 dos 25 setores pesquisados. Os melhores resultados ficaram por conta de veículos automotores (12,2%), equipamentos de informática (12%) e produtos diversos (5,3%). Importante destacar a relevante expansão do setor automotivo, principalmente considerando o ritmo crescente que é verificado a partir de setembro. Desde janeiro o setor vinha acumulando retrações preocupantes, mas o movimento a partir de setembro parece indicar o início de uma reversão tendencial. Já produtos farmoquímicos (-6,9%) e outros equipamentos de transporte (-4,1%) registraram as maiores retrações.

Tabela 2: Produção Física Industrial do Brasil por Setores de Atividades, mês a mês com ajuste sazonal

T2

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Com as variações de dezembro o acumulado do ano continuou majoritariamente positivo entre os setores, como mostra o Gráfico 2. É claro, a magnitude desses resultados é distorcida pelo péssimo desempenho de 2020, período cujo acumulado retorna baixíssima base de comparação. Com isso, o campo das indústrias extrativas (1,1%) e da indústria de transformação (4,3%) encerraram o ano com expansões na série acumulada. Dentre os setores, destacam-se máquinas e equipamentos (24,1%), veículos automotores (20,3%) e impressão e reprodução de gravações (18,1%). Os piores resultados ficam por conta de produtos alimentícios (-7,8%), manutenção, reparação e instalação de máquinas (-7,7%), produtos de limpeza e higiene pessoal (-5,1%). O encerramento do ano com forte taxa acumulada de retração no setor de produtos alimentícios – que é o setor mais representativo do parque industrial nacional – é fato sintomático das dificuldades do agregado setorial ao longo do ano.[2]

Gráfico 2: Produção física industrial do Brasil por setores de atividade, acumulado no ano

G2

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A atividade industrial catarinense em dezembro de 2021

Os últimos 24 meses da produção industrial catarinense são ilustrados pelo Gráfico 3, a partir da comparação mês a mês. Como se nota, o período após as quedas bruscas de março e abril de 2020 foi marcado por expansões sucessivas e em bom nível que se mantiveram até o final do ano. Com a entrada em 2021, porém, a diminuição dos programas de auxílio do governo, o aumento da inflação e a expansão do desemprego tiveram como reflexos para o setor industrial catarinense a diminuição do ritmo produtivo e o aumento da instabilidade nos resultados mensais. Apenas em agosto e em novembro foram registradas expansões, enquanto os demais meses retroagiram ou retornaram variações de estagnação.

Gráfico 3: Produção Física industrial em Santa Catarina, mês contra mês imediatamente anterior com ajuste sazonal

G3

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Como mostra a Tabela 3, que apresenta a síntese dos resultados da indústria catarinense em dezembro, a retração mensal foi de -2,7%, a maior queda dentre todas as UFs pesquisadas, revertendo em grande parte a expansão de novembro. Com isso, o saldo do índice entre janeiro e dezembro apresenta a significativa retração de -11,4%, variação bem mais negativa do que o saldo nacional.

Já a série mensal na comparação com o mesmo mês do ano anterior retorna a brusca retração de -10,1%, indicando claramente o descompasso entre o encerramento positivo que caracterizou a produção industrial no último ano e o atual cenário, marcado pelo baixo ritmo produtivo. Com isso, a comparação com os meses de 2020 retornou retrações nos últimos três meses do ano. Nos restantes, contudo, a comparação se mostrou majoritariamente positiva, fato compreensivo quando se colocam em contexto as fortes retrações do primeiro semestre de 2020.

Tabela 3: Variação da atividade industrial de Santa Catarina em vários períodos

T3

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

As séries acumuladas, por fim, apresentam em dezembro a expansão de 10,3%. Assim como no caso nacional, a forte expansão se explica em grande medida pelo fraco desempenho do período que configura a base de comparação dessa série. Fato interessante, contudo, e que vai em consonância com os resultados de fraco desempenho advindos da série mensal, é a diminuição do ritmo da taxa acumulada a partir de agosto, mostrando, também a partir da ótica captada pela série acumulada, as dificuldades do setor industrial catarinense no segundo semestre de 2021.

De modo geral, os resultados de dezembro confirmam a tendência retrativa dos meses anteriores e mantém a trajetória da indústria catarinense pari-passu ao cenário nacional. É verdade que os impactos dessa tendência são sentidos em Santa Catarina com maior intensidade, o que se comprova pela maior magnitude do saldo retrativo do índice de produção física (-11,4% em Santa Catarina e -4,3% no Brasil). Em termos econômicos, contudo, as dificuldades se originam das mesmas fontes para ambos os parques industriais, a saber: o avanço da inflação, a manutenção do desemprego elevado, o parco crescimento econômico e os gargalos nas cadeias de distribuição e fornecimento ocasionados pela pandemia.

Em relação ao desempenho setorial, pode-se observar a Tabela 4, que elenca os setores a partir dos resultados na comparação com os mesmos meses de 2020. O destaque de dezembro é a retração da indústria metalúrgica catarinense (-22%), a primeira registrada no segundo semestre do ano e que, dada sua expressiva magnitude, anula parte das altas consolidadas nos meses anteriores. Já máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-20,1%) continua com desempenho preocupante, apresentando a sexta retração seguida na série e aumentando, mês após mês, o ritmo das retrações. Positivamente desponta o setor de veículos automotores, reboques e carrocerias (14,6%), apresentando a sétima expansão seguida a partir de junho. Ainda que essas expansões precisem ser relativizadas a partir do contexto das fortes quedas que afetaram o setor nos meses do segundo semestre de 2020, reduzindo de forma expressiva a série que serve como base de comparação. O setor de produtos de madeira (10,8%) também apresentou bom resultado em dezembro e, a parte o resultado de outubro, configurou uma tendência expansiva consolidada desde junho.

Tabela 4: Produção Física Industrial de Santa Catarina por Setores de Atividades, variação mensal em relação ao mesmo mês do ano anterior

T4

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Por fim, a reação dos setores aos resultados acumulados do ano passado pode ser conferida no Gráfico 4. Dos 12 setores presentes na pesquisa em Santa Catarina, 11 apresentaram expansões consideráveis, fato de certo modo esperado em decorrência de todos os conhecidos percalços que acometeram o setor industrial catarinense em 2020. Os melhores resultados se localizam nos setores de metalurgia (42,3%), veículos automotores, reboques e carrocerias (39,2%) e máquinas e equipamentos (22,5%). A única retração acumulada ficou por conta da indústria de produtos alimentícios, com queda consolidada de -10,4%. Assim como em âmbito nacional, o setor representa a parcela mais importante e representativa do parque industrial de Santa Catarina, fato que agrava o contexto da retração e localiza o setor como o principal vetor do fraco desempenho da indústria catarinense ao longo de 2021.

Gráfico 4: Produção física industrial em Santa Catarina por setores de atividades, acumulado no ano

G4

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Considerações Finais

Os resultados de dezembro de Pesquisa Industrial Mensal, portanto, encerram um ano marcado por instabilidade e fraco crescimento. A variação nacional na série mensal, mesmo sendo positiva, é ainda insuficiente para que se visualize uma efetiva e sustentável retomada nos níveis de produção. Já em Santa Catarina, a retração de dezembro corrobora os resultados negativos acumulados nos meses anteriores e reverte, em parte, a expansão que ocorreu no mês de novembro. Esse quadro geral de desempenho vacilante é o motivo pelo qual a indústria se destacou como o setor de pior recuperação em relação às perdas de 2020 na comparação com o setor de serviços e de comércio. (IEDI, 2022).

Cabe ainda destacar o fechamento negativo do acumulado do ano no setor de produtos alimentícios, no Brasil e em Santa Catarina, como um dos fatores principais para o baixo crescimento registrado ao longo do ano. As dificuldades desse setor importantíssimo para o parque industrial nacional, que se concentraram sobretudo no primeiro semestre, acabaram causando reflexos diretos nas variações mensais agregadas.

Por fim, é evidente que a origem do fraco desempenho do setor alimentício – e, em maior ou menor nível, também dos demais setores – se encontra na crise econômica brasileira e sua atual faceta de desemprego elevado, inflação crescente e corrosão de poder de compra do consumidor. Esses fatores aliados aos gargalos das cadeias produtivas e ao aumento dos custos potencializados pela pandemia foram determinantes para o fraco desempenho de 2021. Para o próximo ano, um eventual prognóstico positivo passa necessariamente pelo enfrentamento desses dilemas.

Referências Bibliográficas

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física (PIM). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, dezembro de 2021.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal da Indústria. Produção Física Regional (PIM Regional). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, dezembro de 2021.

IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. Carta IEDI  1129. São Paulo (SP). Disponível em: <https://www.iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_1129.html>


[1] Graduando em Ciências Econômicas na UFSC e bolsista do NECAT. Email: matheusrosa.contato@outlook.com.

[2] Em 2020 a indústria de produtos alimentícios apresentou relativa resiliência devido ao seu perfil de demanda contínua e aos programas de auxílio do governo federal que vigoraram ao longo do segundo semestre. Em 2021, com o avanço inflacionário e o encerramento dos programas fomentadores da demanda do consumidor, o setor não apresentou bons resultados.