Mercado de trabalho: volta às aulas gera recontratação de professores que em dezembro foram mandados embora

10/05/2022 16:29

 Andrey de Paula e Silva[*] 

Victor Hugo Azevedo Nass[**]

Dando sequência aos acompanhamentos mensais publicados no blog do Necat, o objetivo deste texto é analisar o comportamento do mercado formal de trabalho do Brasil e de Santa Catarina em fevereiro de 2022, a partir dos resultados do Novo CAGED[1]. Para isso, serão analisados os saldos mensais e as variações relativas do emprego formal por grupamento de atividade econômica, gênero, escolaridade, faixa de remuneração e mesorregião geográfica.

De acordo com a Tabela 1, em fevereiro o Brasil apresentou saldo positivo de 328,5 mil vínculos formais de trabalho, obtendo uma expansão dos estoques em 0,8% no mês. Já Santa Catarina teve saldo positivo de 28,4 mil vínculos, e uma alta de 1,2% em seu estoque de vagas formais. O mês de fevereiro somado com janeiro, tanto em âmbito nacional quanto regionalmente, já apresenta expansão em relação às baixas realizadas em dezembro, por conta da reestruturação das empresas.

Tabela 1 – Evolução mensal de estoque, admissões, desligamentos, saldo e variação percentual (Brasil e Santa Catarina, fevereiro de 2021 a fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

No acumulado de 12 meses[2] foram abertas 2,5 milhões de vagas de trabalho formal no Brasil, o que representa um crescimento de 6,7% do emprego formal no país. Já em Santa Catarina foram abertas 154,2 mil vagas no último ano, crescendo até mais que o país, 7,1%.

Evolução do emprego formal no Brasil

Conforme os dados contidos na Tabela 2, o setor de serviços foi o que obteve o maior saldo em fevereiro, com 215 mil novas vagas formais de trabalho, com destaque para o setor de educação, que teve saldo de 122 mil, por conta da volta às aulas e do fato de que hoje uma grande parcela dos professores é contratada apenas na modalidade temporária. Ou seja, estes foram demitidos em dezembro e agora foram re-contratados, numa dinâmica que configura claro ônus em sua estabilidade e em seu direito de requerer melhores condições de trabalho. Em termos relativos, o setor teve alta de 1,1% no mês e de 7,2% no acumulado em 12 meses.

Tabela 2 – Saldo por grupamento de atividade econômica (Brasil, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

O setor industrial obteve o segundo maior saldo mensal, com 43 mil novas vagas. Isso equivale a uma alta no mês de 0,5% e um acúmulo anual de 5,1%. Se destacam neste setor a preparação de couros e a fabricação de artefatos de couro e artigos para viagem e calçados, que trouxeram 7,1 mil novas vagas formais de trabalho, assim como a fabricação de produtos do fumo que proporcionou 4 mil novos vínculos formais.

A construção chegou a 2022 com o melhor desempenho acumulado, com alta de 10,8%, e continua sustentando esse posto, tendo obtido a maior alta mensal em fevereiro, de 1,7%, com seu saldo de 39,4 mil vagas. O subsetor de construção de edifícios foi o protagonista desse desempenho positivo, sendo responsável por 44% do saldo, possuindo 17 mil novas vagas.

A agropecuária obteve saldo de 17,4 mil vagas no mês, registrando um crescimento da ordem de 1%. Vale o destaque para o cultivo de soja – cuja colheita se iniciou nas regiões centro-oeste e nordeste –  e cereais, que juntos, representam 4 mil novas vagas. O setor obteve alta de 7,9% no acumulado do ano.

O comércio apresentou o menor saldo e o menor crescimento no mês, de 13,2 mil vínculos e 0,1%, respectivamente. No acumulado de um ano, o comércio expandiu em 5,9% suas vagas, tendo a segunda menor expansão entre os setores. Os protagonistas para o resultado desse setor, que vinha em baixa nos últimos meses foram os comércios atacadistas. Isso se deveu muito pelo aumento dos custos do produtor, associado à incapacidade de repassar esse preço aos consumidores. Agora, com a pressão nos preços atacadistas sendo refreadas, a tendência é que os saldos do emprego formal no comércio melhorem[3].

A Tabela 3 apresenta o saldo de vínculos formais de trabalho por sexo no Brasil. Houve maior participação da força de trabalho feminina  no mês de fevereiro (saldo de 174 mil mulheres, face a 154 mil homens), e ainda que no agregado de 12 meses a participação masculina obtenha maior saldo (diferença de 82 mil vagas a mais para os homens) as mulheres apresentam crescimento 1,1 p.p. maior que o dos homens.

Tabela 3 – Saldo por sexo (Brasil, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED e RAIS (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

A Tabela 4 apresenta a distribuição do saldo de empregos formais por nível de escolaridade. A faixa dos trabalhadores que possuem ensino médio completo teve o maior saldo e também a maior taxa de crescimento em um ano, 192 mil novas vagas e 7,9%, respectivamente. Essa faixa é responsável por mais de 70% de todas as vagas abertas no último ano. Obtendo o segundo maior saldo, as novas vagas formais para a faixa de ensino superior completo atingiram 66 mil,  uma variação de 2,3% em 12 meses.

Tabela 4 – Saldo por nível de escolaridade (Brasil, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED e RAIS (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

A Tabela 5 apresenta a distribuição do emprego formal por faixa de remuneração. Em fevereiro, foram abertas 206,7 mil vagas com remuneração entre 1 a 2 salários mínimos, o que corresponde a 62% do saldo mensal. Essa faixa de remuneração possui a segunda maior taxa de crescimento em um ano, com 13,5%. Complementarmente, foram geradas 71 mil novas vagas formais de trabalho na faixa de 0,5 a 1 salários mínimos. Todavia, mesmo sendo o segundo maior saldo no mês, foi registrado saldo negativo de 194 mil vagas no acumulado de 12 meses, o que representa uma queda de 4,9% para a faixa. A faixa de até 0,5 salários mínimos surpreende, possuindo a  maior taxa de crescimento, com variação de 16,3%.

Ao se observar o crescimento das faixas de até 0,5 SM e de 1 a 2 SM, cria-se um alerta sobre a situação dos trabalhadores, ainda mais com uma inflação que chegou a fevereiro acumulando em 12 meses aumento de 10,5%, segundo o IPCA. Os trabalhadores concentrados nessas menores faixas salariais muito dificilmente conseguirão contemplar suas necessidades mais elementares, haja vista, por exemplo, que o valor médio da cesta básica alcançou R$ 550 em fevereiro[4].

Tabela 5 – Saldo por faixa de remuneração (Brasil, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED e RAIS (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

Nota: Faixas de remuneração em salários mínimos de 2022 (R$ 1.212).

Evolução do emprego formal em Santa Catarina

Conforme os dados da tabela 6, o setor de serviços foi o que obteve o maior saldo no mês de fevereiro (16,1 mil). Além disso, o setor teve também a segunda maior variação mensal (1,9%). Nas suas atividades, os melhores resultados foram registrados nas áreas de administração pública e de educação (esta última pelo mesmo motivo visto nacionalmente), as quais obtiveram saldo de 4,5 mil e 3,1 postos formais de trabalho, respectivamente. No acumulado em 12 meses o setor de serviços apresentou a segunda maior taxa de crescimento, de 8,3%.

 Tabela 6 – Saldo por grupamento de atividade econômica (Santa Catarina, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

Na tabela 6, observamos que a indústria obteve o segundo maior saldo de fevereiro, com registro de 7 mil vagas. Obteve destaque a confecção de artigos do vestuário e acessórios, com saldo positivo de 1,6 mil vagas, e a participação considerável das fabricações de produtos alimentícios e madeira, que em conjunto somaram 1,4 mil vínculos. Apesar do segundo maior saldo mensal, o setor da indústria teve, de maneira inversa, o segundo menor resultado acumulado anual, atingindo 5,4% de expansão.

O setor de construção, que apresentou saldo de 3,4 mil vínculos formais de trabalho criados em fevereiro, foi quem mais se destacou nas taxas de crescimento, atingindo 3,1% no mês e 13,4% no ano. O subsetor de construção de edifícios foi quem protagonizou esse destaque.

O setor de comércio voltou a apresentar saldo positivo, com registro de 1,3 mil vagas, uma variação de 0,3% dos estoques e um crescimento de 6,9% no acumulado de doze meses. As vagas abertas em fevereiro foram principalmente nos comércios por atacado, também por causa da diminuição da pressão inflacionária nos preços atacadistas.

A agropecuária foi o setor que apresentou o menor saldo, com somente 465 novas vagas formais criadas, das quais o cultivo de maçã representou quase a totalidade do saldo, com 319 vínculos. O setor apresentou taxa de 1% de crescimento no mês e de 1,9% no ano.

Conforme a Tabela 7, no mês de fevereiro em Santa Catarina, as mulheres tiveram maior participação nas contratações mensais (16 mil vínculos) em relação aos homens (12 mil vínculos). Essa vantagem feminina se dá pelas contratações – ou re-contratações – no setor de serviços, como a educação. No acumulado, os dois têm resultados parecidos no absoluto (uma diferença de cerca de 3,5 mil vagas), mas, no relativo, a mão de obra feminina tem um crescimento bem maior que a masculina.

Tabela 7 – Saldo por sexo (Santa Catarina, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED e RAIS(2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

Conforme indicam os dados contidos na Tabela 8, o grau de escolaridade mais comum entre as novas vagas formais de emprego foi o de ensino médio completo, tendo sido criados 7,9 mil vínculos somente nessa faixa. Em seguida, as faixas de ensino médio incompleto e ensino fundamental incompleto apresentam valores semelhantes, com 5,2 e 5,3 mil novas vagas cada, respectivamente. A faixa de analfabetos foi a que apresentou o menor valor, com somente 143 novos postos formais de trabalho.

Tabela 8 – Saldo por nível de escolaridade (Santa Catarina, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED e RAIS (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

Analisando o panorama anual, a faixa de ensino médio completo representa 65% do acumulado, com saldo de 100 mil novos vínculos, configurando grande concentração de vínculos nessa faixa de escolaridade. Com isso, essa faixa foi a segunda que mais cresceu nos últimos 12 meses, com uma expansão de 8,7% no número de trabalhadores com ensino médio completo, ficando atrás do ensino médio incompleto, que cresceu 11,5%. A Tabela 9 apresenta a distribuição do emprego formal por faixa de remuneração. A faixa de 1 a 2 salários mínimos continua tendo o maior saldo, tendo aberto em fevereiro 19 mil vínculos formais, representando 70% do saldo total. O segundo maior saldo ocorreu na faixa de 0,5 a 1 salário mínimo, com saldo de 4,1 mil vagas.

No acumulado do ano a faixa de 1 a 2 salários mínimos concentra quase todo o saldo estadual, com 150 mil vínculos formais de trabalho. As faixas salariais que mais cresceram nos últimos meses foram as que vão até 2 salários mínimos. Isso levanta o mesmo problema visto nacionalmente, até porque, em fevereiro, Florianópolis teve a segunda cesta básica mais cara do país, consumindo mais de 60% do salário mínimo na sua compra[5], e a inflação abala o poder de compra das famílias do exato mesmo modo que foi visto nacionalmente. A pauperização dos trabalhadores está aumentando cada mês mais também no estado Barriga Verde.

Tabela 9 – Saldo por faixa de remuneração (Santa Catarina, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED e RAIS (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

Com relação à distribuição mesorregional dos empregos formais (Tabela 10), destaca-se inicialmente a região do Vale do Itajaí, que registrou o maior saldo do mês de fevereiro, mediante a abertura de 9,5 mil vagas. Em termos relativos, esse foi o maior crescimento regional, com 1,5%.O bom desempenho do Vale do Itajaí foi impulsionado novamente pelo setor de serviços, com destaque para o segmento de administração pública, defesa e seguridade social. No acumulado anual, a região cresceu 8,4%.

Tabela 10 – Saldo por mesorregião (Santa Catarina, fevereiro de 2022)

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Fonte: Novo CAGED (2022); Elaboração: NECAT/UFSC.

Na sequência, a região Norte apresentou um saldo positivo de 5,9 mil vínculos, sendo o segundo maior saldo, com crescimento de 1,3%. O setor que puxou esse saldo, assim como na região do Vale do Itajaí, foi o setor de serviços, com ênfase nas atividades de limpeza, que apresentaram aproximadamente 1,3 mil vagas do saldo.

O Sul Catarinense abriu 4,1 mil vagas em janeiro, adicionando 1,4% em suas vagas formais de trabalho. Os serviços administrativos e atividades complementares lideraram o crescimento da mesorregião. Com isso, a região atingiu um saldo anual de 19 mil vínculos formais de trabalho e um aumento de 7,1% no ano.

No Oeste, o saldo foi de 4 mil vagas em fevereiro, o que representa uma expansão de 1% do estoque de vagas formais. Esse resultado foi muito influenciado pela administração pública em geral. O acumulado do ano da mesorregião foi de 4,5%.

A Grande Florianópolis teve saldo de mais de 3,5 mil trabalhadores formais no segundo mês do ano, um acréscimo de 0,8% no seu estoque de postos formais de trabalho. Esse crescimento foi causado principalmente pelo setor de serviços, em específico o setor da educação infantil e ensino fundamental. Seu acúmulo do ano foi o maior entre as mesorregiões, atingindo 8,7%.

Por último, a região Serrana foi a que obteve a segunda maior variação percentual mensal juntamente com o sul catarinense, de 1,4%, acumulando alta de 6,8% nos últimos 12 meses. O crescimento mensal na região contou com participação intensa do setor agropecuário, em especial o cultivo de maçãs.

Em síntese, os dados de fevereiro mostram que o emprego formal em Santa Catarina continua  a tendência de expansão do mercado formal de trabalho que era vista até novembro do último ano. Isto porque cada vez mais os postos de trabalho têm menos qualidade e isto é visível observando a estabilidade do emprego. Por exemplo: em dezembro são fechados 3 mil postos de trabalho formais de profissionais da educação e em fevereiro se contratam 3,1 mil profissionais da mesma área. Trata-se de uma reorganização do mercado de trabalho, em vistas de privar os trabalhadores de seus direitos.

Regionalmente, os maiores destaques ficam por conta do desempenho das regiões do Vale do Itajaí e do Norte Catarinense. O setor de serviços foi o protagonista tanto nacionalmente quanto regionalmente para o saldo atingido no mês, tendo sido o carro chefe da grande maioria das mesorregiões, valendo o destaque para o subsetor da educação. Além disso, segue intocada a tendência de geração de empregos de baixa qualidade: de baixa  escolaridade e baixa remuneração (salários mínimos entre 1 e 2). A concentração da renda em faixas muito pequenas, aliada à inflação galopante, levanta o problema cada vez maior da pauperização do trabalho no estado.


[*] Estudante de Economia na UFSC e bolsista do Necat.

[**]  Estudante de Economia na UFSC e bolsista do Necat.

[1] Todos os dados apresentados neste texto foram coletados junto à base de dados do Ministério da Economia em 28/03/2022. Em razão das declarações fora do prazo e das revisões periódicas da base de dados, os dados podem divergir ligeiramente dos divulgados nas análises anteriores.

[2] A variação acumulada em 12 meses refere-se ao crescimento do estoque de empregos formais entre março de 2021 e fevereiro de 2022.

[3] Para mais: Desaceleração dos preços no atacado tende a melhorar cenário do varejo em 2022

[4] Para mais: Valor da cesta básica aumenta em todas as capitais em fevereiro.

[5] Ver nota 6.