Produção industrial catarinense regride novamente em outubro de 2023

12/12/2023 09:59

Matheus Souza da Rosa*

A produção física industrial catarinense regrediu em -0,6% na passagem entre setembro e outubro de 2023. Com essa retração, mantém-se a tônica de ritmo produtivo arrefecido com leve sinal negativo que tem caracterizado a conjuntura da indústria de Santa Catarina em 2023. Na comparação com o acumulado do mesmo período de 2022, aponta-se para uma retração de -2,1%, ao passo que o acumulado de doze meses registra queda de -2,6%. No curto prazo, portanto, está consolidado um quadro de debilidade do ritmo produtivo, o que alinha a trajetória catarinense ao movimento da indústria nacional no mesmo período.

O Gráfico 1 mostra a evolução do índice de produção física industrial em Santa Catarina e no Brasil entre 2020 e 2023. De início, houve nesse período um relativo descolamento entre as duas trajetórias, com o índice catarinense respondendo relativamente melhor entre o segundo semestre de 2020 e o primeiro semestre de 2022. Desde agosto de 2022, contudo, estabeleceu-se para a indústria catarinense uma trajetória acelerada de redução do ritmo produtivo, o que fez com que os índices, virtualmente, se igualassem. No saldo do período, registra-se, no Brasil e em Santa Catarina, um cenário de estagnação que dá o tom das dificuldades de crescimento que têm marcado o cenário do setor produtivo nos últimos anos.

Gráfico 1 – Índice de produção física industrial com ajuste sazonal (jan/20=100)

Fonte: IBGE – PIM-PF Regional. Elaboração: Necat/UFSC.

Essas dificuldades se relacionam com fatores dos mais variados, de origem nacional e internacional. Nacionalmente, a taxa de juros elevada segue sendo um empecilho. Isso porque, por um lado, o nível atual da Selic, que estabelece os juros reais de 6,9% a.a., constrange a demanda ao limitar os incentivos ao investimento produtivo, o que se converte em expectativas negativas sobre a demanda futura e, consequentemente, em reduções no nível produtivo do presente. Por outro lado, o recente ciclo de alta nos juros nominais (que fez com que a Selic permanecesse em 13,75% a.a. por doze meses ininterruptos) ainda é responsável por efeitos de defasagem sobre o nível de demanda, o que se soma ao mecanismo anterior. Outros fatores como o elevado endividamento das famílias e a baixa histórica nos volumes de formação bruta de capital fixo também são fatores explicativos relevantes[1].

Internacionalmente o cenário também é de demanda deprimida, o que se converte em perdas para os setores da indústria de transformação que são mais fortemente vinculados ao comércio exterior[2]. Segundo um relatório recente da OECD, a conjuntura de desaceleração do crescimento é consequência do movimento combinado de alta das taxas de juros nas principais economias do mundo, o qual tem sido impelido pela resiliência inflacionária[3] que está posta desde os choques causados pela pandemia da Covid-19 e pela guerra na Ucrânia (OECD, 2023).

Em termos gerais, a conjuntura é, portanto, de desaquecimento da atividade econômica e desaceleração especialmente do setor produtivo. Ainda assim, algumas das UFs conseguiram reagir positivamente em outubro, conforme indica o Gráfico 2. Das 14 UFs presentes na PIM-PF, 9 expandiram em outubro, com destaque para as variações no Pernambuco (12,4%), na Bahia (8,1%) e em Goiás (2,1%). As expansões de maior ritmo, contudo, foram essencialmente movimentos de recomposição das perdas dos meses anteriores. No outro polo, houve retrações no Espírito Santo (-3,1%), em Amazonas (-2,6%), no Rio de Janeiro (-2,0%), em Minas Gerais (-1,0%) e em Santa Catarina (-0,6%).

Gráfico 2 – Produção física industrial, variação mês imediatamente anterior, por unidade da federação (out/23)

Fonte: IBGE – PIM-PF Regional. Elaboração: Necat/UFSC.

No que concerne à variação catarinense, o Gráfico 3 mostra o cenário de acordo com os setores de atividades da indústria de transformação. Pela perspectiva mensal em relação a outubro de 2022, houve uma maioria expansiva, com 9 resultados positivos e 5 negativos. Destacaram-se entre as altas os resultados de produtos de borracha e de material plástico (18,1%), de produtos químicos (14,6%), de produtos de metal (14,2%), de produtos de madeira (9,3%) e de máquinas, aparelhos e materiais elétricos (8,8%). Já entre as quedas, despontaram as variações de produtos de minerais não metálicos (-9,3%), fabricação de móveis (-3,4%), veículos automotores, reboques e carrocerias (-2,4%), artigos de vestuário e acessórios (-1,6%) e celulose, papel e produtos de papel (-0,2%).

Na ótica anual, contudo, se nota uma leve predominância negativa, com retrações em 8 dos 14 agrupamentos de indústria. As retrações nessa base de comparação se concentraram especialmente nas atividades de fabricação de móveis (-17,1%), artigos de vestuário e acessórios (-10,1%), produtos de minerais não metálicos (-9,9%), metalurgia (-7,7%) e produtos de madeira (-6,4%). Entre os setores em expansão em 2023, obtiveram maior ritmo as atividades de produtos de borracha e de material plástico (7,9%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (5,8%), máquinas e equipamentos (3,3%) e produtos químicos (2,9%).

No saldo dessas variações setoriais, aparecem como indicadores particularmente positivos as boas expansões de máquinas, aparelhos e materiais elétricos e máquinas e equipamentos na base anual, ambos estes setores que possuem destaque no parque industrial catarinense em termos de contribuição ao valor da transformação industrial, em participação relativa no emprego e em presença na pauta exportadora. Por outro lado, as retrações de artigos de vestuário e acessório e produtos têxteis, setores também destacados da indústria de transformação catarinense, são preocupantes, especialmente ao se considerar que essas atividades são intensivas em mão de obra e, já há alguns anos, enfrentam uma trajetória consolidada de declínio. A falta de tração na indústria de produtos alimentícios, no mesmo sentido, é um ponto negativo, dado que esse setor puxa o agregado da indústria catarinense em grande medida, dada sua elevada participação relativa.

Gráfico 3 – Produção física industrial em Santa Catarina, variação por setores de atividades em duas bases de comparação (out/23)

Fonte: IBGE – PIM-PF Regional. Elaboração: Necat/UFSC.

Assim, os resultados da PIM-PF Regional de outubro para Santa Catarina mostraram um cenário de desaceleração do ritmo produtivo pela ótica mensal e de manutenção das perdas em relação a 2022 pela base de comparação anual. Setorialmente, o que se notou foi uma leve hegemonia retrativa na perspectiva anual, sendo especialmente preocupantes as trajetórias nas indústrias têxteis e de vestuário. Para os próximos meses, seguem como fatores condicionantes do ritmo produtivo as oscilações da demanda em âmbito interno e externo, o que por sua vez provavelmente será condicionado pelo comportamento da inflação. Caso se confirmem as projeções de crescimento para o ano que vem[4], pode-se esperar uma leve retomada do ritmo produtivo no Brasil e em Santa Catarina, ainda que certamente essa retomada não vá ter o fôlego necessário para fazer frente as perdas dos últimos anos em boa parte dos segmentos industriais. Uma análise mais detalhada dos resultados da pesquisa será publicada no Informativo NECAT de dezembro de 2023.

Referências bibliográficas

BACEN – Banco Central do Brasil. Focus – Relatório de Mercado, 8/12/2023. Disponível em: <https://www.bcb.gov.br/publicacoes/focus>. Acesso em: 11 de dezembro de 2023.

CNI – Confederação Nacional das Indústrias. Indicadores CNI. Disponível em: <https://indicadores.sistemaindustria.com.br/>. Acesso em: 14 de setembro de 2023.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PIM-PF Regional. Rio de Janeiro (RJ): IBGE, outubro de 2023.

MDIC – Ministério do Desenvolvimento da Indústria, Comércio e Serviços. COMEX STAT. Disponível em: < http://comexstat.mdic.gov.br/pt/home>. Acesso em: 8 de dezembro de 2023.

OECD – Organization for Economic Co-operation and Development. OECD Economic Outlook: restoring growth, november 2023. Disponível em: < https://www.oecd.org/economic-outlook/november-2023/>. Acesso em: 8 de dezembro de 2023.


* Economista pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisador do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense (Necat/UFSC). Email: matheusrosa.contato@outlook.com.

[1] É relevante perceber que todos esses fatores atuam, essencialmente, através dos mecanismos de demanda. Não surpreende, portanto, a tendência de queda no indicador de capacidade instalada que é verificada para a indústria nacional. Segundo a CNI, em outubro a utilização capacidade instalada da indústria brasileira era 78,8%, marcando redução de -3,4 pontos percentuais em relação a abril de 2021, mês de maior nível na série no período a partir de janeiro de 2020 (CNI, 2023).

[2] Em Santa Catarina esses setores são: produtos alimentícios (42,14% da pauta exportadora em 2023), produtos de madeira (10,36%), máquinas e aparelhos e materiais elétricos (9,40%) e veículos automotores (7,52%) (MDIC-Comex STAT, 2023).

[3] Os preços da cesta de bens que configura o chamado “núcleo da inflação”, especialmente, têm se mostrado resistentes ao esperado efeito desinflacionário decorrente da política monetária restritiva.

[4] De acordo com o Boletim Focus mais recente, projeta-se 2,84% de crescimento para o PIB em 2023. Para 2024, a estimativa atual aponta para uma expansão em 1,50%. Nesse mesmo boletim se projeta o fechamento da Selic em 11,75% a.a. em 2023. Há expectativa de continuidade no atual ciclo de queda, consolidando a projeção de 9,25% a.a. para a Selic no encerramento de 2024 (Bacen, 2023).

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