Varejo catarinense registra maior queda do ano

24/08/2022 10:44

Guilherme Ronchi Razzini *

A Pesquisa Mensal do Comércio (PMC-IBGE), divulgada em agosto e com dados referentes ao mês de junho de 2022, encerrando os dados referentes ao primeiro semestre de 2022, apresentou forte retração no cenário nacional (-2,3%). No cenário estadual o resultado também foi de retração, porém de forma menos intensa (-1,2%). Na comparação com o cenário pré-pandemia, ou seja, no comparativo entre fevereiro de 2020 e junho de 2022, o setor apresentou retração em nível nacional (-3%) e expansão em nível estadual (11,7%).

O cenário macroeconômico explica a estagnação do setor, principalmente pela alta inflação que tem corroído o poder de compra, sobretudo, das famílias de baixa renda, e o aumento das taxas de juros que tem atingido o mercado de bens duráveis, os quais possuem maior dependência do crédito. Devido a isso, a produção e comercialização de bens registraram retração no mês de junho de 2022.

Nos resultados regionais, pela perspectiva da série mensal com ajuste sazonal, houve variações negativas em 23 das 27 Unidades Federativas (UFs), com destaque para Ceará (-5,2%), Minas Gerais (-4,6%) e Bahia (-4,5%). Em contraste, pressionaram de forma positiva o resultado agregado apenas 4 das 27 UFs, com destaque para Mato Grosso do Sul (1,2%), Mato Grosso (1%) e Pernambuco (0,5%).

Deste modo, o presente artigo tem como objetivo ilustrar o desempenho do comércio varejista ampliado no Brasil e em Santa Catarina, a partir dos dados disponibilizados pela PMC-IBGE, no contexto do atual estágio da pandemia e da conjuntura macroeconômica.

Atividade comercial do Brasil em junho de 2022

A Figura 1 apresenta a trajetória do volume de vendas do comércio varejista ampliado no Brasil, desde 2014 até o período atual. Nesta figura é possível perceber as variações do setor em resposta à atividade econômica do país e os distintos períodos da pandemia da Covid-19.

O setor apresenta duas trajetórias consolidadas que estão ilustradas na Figura: primeiro, uma trajetória de retração entre 2014 e meados de 2016, período em que o setor sofreu retração de aproximadamente -18% no volume de vendas; na sequência, a partir do segundo semestre de 2016, há uma tendência de expansão até fevereiro de 2020, quando há a interrupção em virtude da pandemia do Covid-19, nesse período o setor acumulou expansão aproximada de 21%.

Figura 1 – Variação do volume de vendas no comércio varejista ampliado no Brasil entre janeiro de 2014 e junho de 2022 (2014=100)

F1

Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

A partir de 2022 é possível perceber uma trajetória de estagnação. Com os dados de junho o acumulado no ano apresentou variação de 0,3% frente o período jan-jun/2021, num movimento que ilustra a dificuldade em criar uma sólida tendência de expansão e de recuperar a máxima histórica, ou até mesmo de se manter em patamares acima do pré-pandemia.

A Tabela 1 apresenta as quatro séries da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) ao longo dos últimos doze meses. No indicador mês a mês com ajuste sazonal, o que melhor caracteriza o ritmo da atividade no curto prazo, foi registrada retração significativa de -2,3% no volume de vendas. Com isso, o acumulado do ano recuou de 1% para 0,3% no mês de junho, indicando que o ritmo de expansão está apenas levemente acima do verificado no ano passado.

Tabela 1: Variação do volume de vendas do comércio varejista ampliado no Brasil (junho de 2021 a junho de 2022)

T1 V

Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Na comparação com o mesmo mês do ano anterior, houve retração de -3,1% no volume de vendas. Essa foi a terceira retração registrada neste indicador no ano, ilustrando uma relativa disparidade na comparação com o ritmo de vendas de 2021. No acumulado em doze meses, o saldo saiu de uma expansão de 0,3% para uma retração de -0,8%, primeiro saldo de retração nos últimos doze meses.[1]

Os resultados apontam para a incapacidade do setor se expandir em níveis superiores aos registrados no ano anterior. Tal fato é explicado, pelo baixo crescimento econômico, a persistente inflação elevada e a manutenção do desemprego, fatores que reduzem a demanda dos consumidores e consequentemente o volume de vendas do comércio varejista. O ciclo de alta da taxa de juros, da mesma forma, desestimula o consumo e retém a demanda por crédito, o que afeta diretamente o volume de vendas de diversos setores do varejo. (IEDI, 2022)

A Tabela 2 auxilia na compreensão dos impactos da conjuntura sobre os setores do comércio varejista, a partir dos resultados mensais com ajuste sazonal. Foram registradas retrações em 9 dos 10 setores analisados pela PMC, sendo as maiores retrações nos setores de tecidos, vestuário e calçados (-5,4%), veículos, motocicletas, partes e peças (-4,1%) e livros, jornais, revistas e papelaria (-3,8%). Por outro lado, houve expansão no volume de vendas em apenas um setor, sendo o segmento de artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, de perfumaria e cosméticos (1,3%).

Tabela 2: Variação mês a mês com ajuste sazonal do volume de vendas no comércio varejista ampliado e suas subdivisões no Brasil (janeiro de 2022 a junho de 2022).

T2 V

Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC. 

Diferente do mês anterior quando as quedas estavam concentradas nos setores de bens duráveis, no mês de junho houve queda em quase a totalidade dos setores, com exceção do segmento de artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, de perfumaria e cosméticos, o qual vem sendo beneficiado pelo aumento da demanda de seus produtos durante a pandemia. Além disso, o resultado é reflexo de que os produtos do setor não são substituíveis, desse modo se aumenta o dispêndio de uma família que pode ter que gastar neste segmento e diminuir o consumo em outros segmentos.

Com os resultados do mês de junho é possível analisar os resultados do primeiro semestre de 2022, que estão ilustrados na tabela abaixo. Na comparação com o mesmo semestre do ano anterior, entre 10 setores que compõe o comércio varejista ampliado, foram registradas expansões em 7 segmentos, com destaque para os setores de livros, jornais, revistas e papelaria (18,4%) e tecidos, vestuário e calçados (17,2%).

Tabela 3: Indicador semestral do volume de vendas do comércio varejista ampliado, segundo grupo de atividades.

T3 V

Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Por outro lado, houve queda em 3 dos 10 segmentos, sendo essas disseminadas nos grupos de móveis e eletrodomésticos (-9,3%), material de construção (-7,3%) e outros artigos de uso pessoal e doméstico (-2,8%). Assim, apesar da queda no indicador mensal e anual, o varejo ampliado acumulou leve expansão de 0,3% no volume de vendas no primeiro semestre do ano, indicando a dificuldade em estabelecer um ritmo de crescimento sólido.

A dificuldade de acesso ao crédito tem dificultado a expansão dos setores e afetado diretamente o setor de outros artigos de uso pessoal e doméstico, que incluem lojas de departamento, que necessitam de crédito para alavancar seu volume de vendas, além da elevada taxa de juros e a corrosão do poder de compra que tem afetado o comércio de bens duráveis e semiduráveis, ilustrados na queda do setor de móveis e eletrodomésticos, e na estagnação do segmento de veículos e motos.

Por outro lado, com a normalização das atividades e a maior circulação de pessoas favoreceu a expansão do volume de vendas no segmento de tecidos, vestuário e calçados que registrou forte expansão no primeiro semestre. Assim como a volta às aulas presenciais contribuiu para o avanço significativo do setor de livros, jornais, revistas e papelaria que registrou expansão de 18,4%, melhor resultado entre os grupos pesquisados.

Atividade comercial em Santa Catarina em junho de 2022

No estado de Santa Catarina, houve retração no volume de vendas assim como registrado no cenário nacional. Na passagem do mês de maio para junho, houve retração de -1,2% no volume de vendas com ajuste sazonal.

Os resultados da PMC estão ilustrados na Tabela 4, que apresenta as quatro principais séries temporais da pesquisa, onde estão presentes os dados na série mês a mês com ajuste sazonal, na comparação com o mesmo mês do ano anterior, no acumulado do ano e no acumulado de doze meses.

Tabela 4: Variação do volume de vendas do comércio varejista ampliado em Santa Catarina (junho de 2021 a junho de 2022)

T4 V

Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Na comparação com o mesmo mês do ano anterior foi registrado expansão de 1,2%, resultado esperado tendo em vista as baixas bases de comparação com o primeiro semestre de 2021. Com esse resultado, foram registradas expansões em todos os meses do ano nessa série, o que indica que, ao menos na comparação com o desempenho mensal do primeiro semestre de 2021, o cenário é positivo.

No acumulado do ano houve desaceleração do movimento expansivo, tendo o saldo regredido de 6,2% para 5,3% Ainda assim, a expansão acumulada de 5,3% continua consideravelmente acima do resultado nacional.

No acumulado em doze meses também houve diminuição do ritmo das expansões, sendo o resultado de 4,8% o menor registrado no período de doze meses ilustrado pela tabela. Em parte, isso ocorre pela nova retração da série mensal com ajuste sazonal, mas também aparece como consequência da reconfiguração das bases de comparação da série, que a partir de junho deixam de contar com os meses do primeiro semestre de 2020 e, por isso, tendem a retornar resultados menos expressivos.

A Tabela 5 apresenta os saldos acumulados no ano (janeiro a junho de 2022) em Santa Catarina para os dez grupos de atividades que compõem o comércio varejista ampliado.   Em junho, 6 dos 10 setores apresentam saldo de expansão no acumulado no ano em junho de 2022 no estado catarinense, com destaque para as altas nos segmentos de equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (25,3%), livros, jornais, revistas e papelaria (20%) e veículos, motocicletas, partes e peças (15,6%). Em contraste, 4 dos 10 setores apresentaram saldo negativo, com maior intensidade nos segmentos de tecidos, vestuário e calçados (-3,7%) e material de construção (-3%).

Tabela 5: Variação do volume de vendas por grupo de atividades do comércio varejista ampliado em Santa Catarina, acumulado no ano (janeiro de 2022 a junho de 2022)

T5 V

Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC. 

Por fim, a Figura 2 compara o resultado catarinense em relação aos demais desempenhos acumulados por UF. Com saldo de expansão de 5,3%, juntamente com Tocantins, o estado catarinense registra o quarto melhor desempenho entre as UFS, atrás somente de Roraima (8,6%), Mato Grosso do Sul (6,8%) e Ceará (6,1%).

Figura 2: Variação acumulada no ano no Brasil e nas suas respectivas UFs em junho de 2022.

F2

Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

A partir da Figura 2, ainda, é possível concluir que das 16 das 27 UFs apresentam saldo de expansão no corrente ano, as com maiores destaques já supracitadas. Por outro lado, 11 das 27 UFs registram retração no acumulado no ano, com destaque para Pernambuco (-5,3%), Bahia (-3,1%) e Amapá (-3%).

Considerações finais

Os resultados da PMC divulgados neste mês com dados que encerram os resultados para o primeiro semestre do ano apontam para a estagnação do setor em nível nacional, conjuntura que se explica pelo quadro macroeconômico ainda desfavorável ao setor, com a taxa de inflação alta e persistente, as taxas de juros em patamares altos que dificultam o acesso ao crédito e a continua corrosão do poder de compra da população. Em Santa Catarina, por sua vez, a despeito da instabilidade na série mensal com ajuste sazonal, as comparações com o desempenho de 2021 mostram um cenário expansivo que, ao menos na comparação com a média nacional, é positivo.

As expectativas para o segundo semestre são otimistas, com a injeção dos recursos oriundos da PEC das Bondades, a ampliação do Auxílio Brasil, a redução do ICMS em itens essenciais, tais medidas devem impulsionar o volume de vendas do varejo. Entretanto, alguns setores ainda devem enfrentar dificuldades nos próximos meses, os setores de bens duráveis e semiduráveis tem amargado consecutivos resultados negativos frutos do difícil acesso ao crédito e a contínua elevação dos juros no mercado, este impacto deve ser ainda mais significativo no estado catarinense, onde tais segmentos do varejo tem grande peso no volume de vendas do setor.

Com o término do primeiro semestre de 2022, porém, o comércio varejista ampliado não registrou grandes avanços, com um bom primeiro trimestre compensado pelas perdas no segundo trimestre, com o controle da pandemia e a retomada das atividades presenciais, alguns setores registraram alta como tecidos, vestuário e calçados. Porém, assim como a indústria, o varejo ampliado não obteve resultados exitosos no primeiro semestre do ano, em contraste o setor de serviços registrou bons resultados frutos da normalização das atividades.

Referências

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal do Comércio. (PMC). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, junho de 2022.

IEDI – INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Análise IEDI: Comércio Varejista Sem avanços. [S. l.], 15 ago. 2022. Disponível em: https://www.iedi.org.br/artigos/top/analise/analise_iedi_20220810_varejo.html Acesso em: 15 ago. 2022.


* Graduando em Ciências Econômicas na UFSC e bolsista do NECAT. E-mail: guilhermerazzini33@gmail.com

[1] A partir de junho, os meses de maior impacto negativo da pandemia sobre o volume de vendas (primeiro semestre de 2020) saem da base de comparação do acumulado de doze meses. Com isso, os resultados tenderão a ser negativos no segundo semestre.