Varejo registra retração novamente e contraria expectativa do mercado

28/09/2022 12:17

Guilherme Ronchi Razzini*

A Pesquisa Mensal do Comércio (PMC-IBGE) divulgada em setembro e com dados referentes ao mês de julho de 2022 apresentou resultados na contramão das expectativas do mercado para o comércio varejista, as quais previam expansão de cerca de 0,30% na comparação mês a mês, porém o resultado foi de uma retração de -0,7%. No cenário estadual, também houve retração, porém de forma menos intensa (-0,1%). Na perspectiva da série interanual houve retração em ambos cenários, com queda de -6,1% no volume de vendas nos dados nacionais, e de -8,1% no estado catarinense. Na comparação com o cenário pré-pandemia, ou seja, no comparativo entre fevereiro de 2020 e julho de 2022, o setor apresentou retração em nível nacional (-3,8%) e expansão em nível estadual (11,4%).

            Nos cenários regionais a pesquisa ilustra um cenário com hegemonia de retrações nas Unidades da Federação (UFs). Apenas 4 das 27 UFs apresentaram expansão pela perspectiva da série mensal com ajuste sazonal, tais resultados foram registrados nos estados do Espirito Santo (0,8%), Paraíba (0,7%), Amapá (0,1%) e Pernambuco (0,1%). Cabe destaque que nenhum estado registrou expansão acima de 1%, evidenciando a tônica de estagnação do volume de vendas no mês pesquisado. Sergipe (-5,7%), Rondônia (-5,3%) e Tocantins (-4,2%), por outro lado registraram as maiores retrações.

A persistência de resultados fracos no setor está relacionada com o cenário macroeconômico nacional debilitado que enfraquece o poder de compra e desestimula o consumo no varejo. A corrosão do poder de compra, o avanço das taxas de juros que dificulta o acesso ao crédito, o ainda elevado desemprego, e a elevada inflação disseminada na maioria dos setores são alguns dos fatores que limitam o desempenho do setor.

Deste modo, o presente artigo tem como objetivo ilustrar o desempenho do comércio varejista ampliado no Brasil, e em Santa Catarina, a partir dos dados disponibilizados pela PMC-IBGE, no contexto do atual estágio da pandemia e da conjuntura macroeconômica.

Atividade comercial do Brasil em julho de 2022

A Figura 1 apresenta a trajetória do volume de vendas do comércio varejista ampliado no Brasil, desde 2010 até o mês de julho de 2022. Nesta figura é possível perceber as variações do setor em resposta à atividade econômica do país e os distintos períodos da pandemia da Covid-19.

O setor apresenta três trajetórias consolidadas que estão ilustradas na Figura: primeiro, uma trajetória de expansão entre janeiro de 2010 até meados de 2014, período em que o setor cresceu aproximadamente 26%; na sequência é possível visualizar que uma trajetória de retração entre 2014 e meados de 2016, período em que o setor sofreu retração de aproximadamente -18% no volume de vendas; posteriormente, a partir do segundo semestre de 2016, há uma tendência de expansão que segue até o início da pandemia em fevereiro de 2020. Neste intervalo de tempo o setor acumulou expansão de aproximadamente 20%.

Figura 1: Variação do volume de vendas no comércio varejista ampliado no Brasil entre janeiro de 2010 e julho de 2022 (2014=100)

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Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Após a queda intensa e significativa nos meses que sucederam o início da pandemia no país, no segundo semestre de 2020 houve uma expansão acelerada que recuperou o volume de vendas e registrou expansão na comparação com o período pré-pandemico, porém tal expansão foi diluída com a queda dos programas de auxilio de renda e a piora no cenário macroeconômico. Com os dados de julho o acumulado no ano apresentou retração de -0,8% frente o período jan-jul/2021, num movimento que ilustra a dificuldade em criar uma sólida tendência de expansão e de recuperar a máxima histórica, ou até mesmo de se manter em patamares acima do pré-pandemia.

A Tabela 1 apresenta as quatro séries da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) ao longo dos últimos doze meses. No indicador mês a mês com ajuste sazonal, o que melhor caracteriza o ritmo da atividade no curto prazo, foi registrada retração significativa de -0,7% no volume de vendas. Com isso, o acumulado do ano recuou de 0,3% para -0,8% no mês de julho, deste modo o volume de vendas se encontra atualmente em um estado inferior ao do ano anterior.

Tabela 1: Variação do volume de vendas do comércio varejista ampliado no Brasil (julho de 2021 a julho de 2022).

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Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Na comparação com o mesmo mês do ano anterior, houve retração de -6,8% no volume de vendas. Essa foi a quarta, e a maior retração registrada neste indicador no ano, ilustrando uma relativa disparidade na comparação com o ritmo de vendas de 2021. No acumulado em doze meses, houve uma piora do saldo de retração que saiu de -0,8% para -1,9%.

Os resultados apresentados na PMC-IBGE de julho de 2022 evidenciam a dificuldade enfrentada pelo setor em nível nacional de se expandir em níveis superiores aos registrados no ano anterior, ilustrado com a queda expressiva de -6,8% na comparação com julho de 2021. Tais resultados são explicados, pelo elevado desemprego, a persistente inflação, baixo dinamismo econômico, e a ascensão das taxas de juros, fatores que reduzem a demanda dos consumidores e de modo direto o volume de vendas do comércio varejista ampliado. O esgotamento de medidas anticíclicas, como liberação do FGTS e antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas também contribui para a queda generalizada nos segmentes no mês, porém a expectativa é para expansão no volume de vendas em agosto com a injeção dos recursos da PEC das Bondades, como o aumento do Auxilio Brasil, vale gás, e as transferências para algumas categorias, como caminhoneiros e taxistas.

A Tabela 2 auxilia na compreensão dos impactos da conjuntura nos segmentos do varejo ampliado, a partir dos resultados mensais com ajuste sazonal. Foram registradas retrações em 9 dos 10 setores analisados pela PMC-IBGE, sendo as maiores retrações nos setores de tecidos, vestuário e calçados (-17,1%), móveis e eletrodomésticos (-3,0%) e veículos, motocicletas, partes e peças (-2,7%). A única exceção ficou a cargo de combustíveis e lubrificantes, que registrou forte alta de +12,2%, sob influência da redução de preços ensejada pela redução do ICMS estabelecida na Lei Complementar 194/22. Refletindo este processo, a receita nominal das vendas deste ramo caiu -3,4% no período. (IEDI, 2022)

Tabela 2: Variação mês a mês com ajuste sazonal do volume de vendas no comércio varejista ampliado e suas subdivisões no Brasil (janeiro de 2022 a julho de 2022).

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Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

O resultado preocupa especialmente em quatro setores que representam 40% do volume de vendas no varejo, nestes setores as vendas estão em declínio há pelo menos três meses consecutivos na série com ajuste sazonal: material de construção e veículos e autopeças desde mar/22, outros artigos de uso pessoal e doméstico desde fev/22 e móveis e eletrodomésticos desde abr/22. O segmento de hipermercados e supermercados também preocupa com resultados fracos ao longo de todo o ano, o setor representa cerca de 1/3 do volume de vendas do varejo, e sofre com o impacto negativo da inflação, porém devido ao caráter essencial de seus produtos, os consumidores tendem a reduzir o consumo em outros setores e manter o patamar de compras no segmento.

A Figura 2 apresenta os resultados do acumulado no ano, ou seja, na comparação com o mesmo período do ano anterior, para o Brasil e suas respectivas UFs, até o mês de julho 15 das 27 UFs apresentam saldo de expansão, sendo de forma mais intensa nos estados de Roraima (7,5%), Mato Grosso do Sul (5,3%) e Ceará (4,4%). Por outro lado, houve retração em 12 das 27 UFS, sendo as maiores retrações registradas em Pernambuco (-6,7%), Bahia (-4,8%) e Paraná (-4,2%). O estado de São Paulo que representa a maior parcela do volume de vendas do varejo apresenta retração de -2,3% na comparação com o mesmo período do ano anterior.

Figura 2: Variação acumulada no ano no Brasil e nas suas respectivas UFs em julho de 2022.

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Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Atividade comercial em Santa Catarina em julho de 2022

A Figura 3 ilustra o desempenho do comércio varejista ampliado desde 2010 no estado catarinense, é possível visualizar a trajetória do setor ao longo dos anos e traçar diferentes cenários ao longo dos anos, o período compreendido entre 2010 e 2014 foi de expansão moderada, interrompida pela crise econômica. A partir de 2014, o volume de vendas segue em retração até meados de 2016, a partir deste período o saldo segue em expansão em ritmo acelerado até fevereiro de 2020.

Com o início da pandemia no estado, o volume de vendas registra uma intensa retração entre os meses de fevereiro e maio, a partir de junho e até os dias atuais o setor apresenta um cenário de expansão, apresentando volume de vendas de aproximadamente 11% superior a fevereiro de 2020.

Figura 3: Variação do volume de vendas no comércio varejista ampliado em Santa Catarina entre janeiro de 2010 e julho de 2022 (2014=100)

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Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

No estado de Santa Catarina, houve retração no volume de vendas assim como registrado no cenário nacional, porém em menor intensidade. Na passagem do mês de junho para julho, houve retração de -0,1% no volume de vendas com ajuste sazonal.

Os resultados da PMC estão ilustrados na Tabela 3, que apresenta as quatro principais séries temporais da pesquisa, onde estão presentes os dados na série mês a mês com ajuste sazonal, na comparação com o mesmo mês do ano anterior, no acumulado do ano e no acumulado de doze meses.

Tabela 3: Variação do volume de vendas do comércio varejista ampliado em Santa Catarina (julho de 2021 a julho de 2022).

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Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Na comparação com o mesmo mês do ano anterior foi registrada intensa retração de -8,1%, a maior queda na série analisada. No acumulado do ano houve desaceleração do movimento de expansão, com o saldo retraindo de 5,3% para 3,1%, mesmo com tal queda, o saldo estadual é superior ao nacional que apresenta retração de -0,8%.

No acumulado em doze meses também houve diminuição do ritmo das expansões, com o saldo de 2,4%, o menor registrado no período ilustrado pela tabela. Em parte, isso ocorre pela nova retração da série mensal com ajuste sazonal, mas também aparece como consequência da reconfiguração das bases de comparação da série, que a partir de junho deixam de contar com os meses do primeiro semestre de 2020 e, por isso, tendem a retornar resultados menos expressivos.

A Tabela 4 apresenta os saldos acumulados no ano (janeiro de 2022 a julho de 2022) em Santa Catarina para os dez grupos de atividade que compõem o comércio varejista ampliado. Em julho, assim como no mês anterior, 6 dos 10 setores apresentaram saldo de expansão na comparação com janeiro a julho de 2021, com destaque para os saldos expansivos nos segmentos de equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (25,6%), livros, jornais, revistas e papelaria (20,1%) e veículos, motocicletas, partes e peças (15,6%). Em contraste, 4 dos 10 segmentos apresentaram saldo negativo, com maior intensidade nos segmentos de tecidos, vestuário e calçados (-6,6%) e material de construção (-3,9%).

Tabela 4: Variação do volume de vendas por grupo de atividades do comércio varejista ampliado em Santa Catarina, acumulado no ano (janeiro de 2022 a julho de 2022).

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Fonte: PMC-IBGE (2022); Elaboração NECAT-UFSC.

Contudo, 7 dos 10 segmentos tem apresentado retração no saldo acumulado no ano, o que indica uma desaceleração de tais segmentos frente ao mesmo período do ano anterior, resultado que respalda a queda do setor na comparação mês a mês com ajuste sazonal. Tais resultados demonstram que assim como no cenário nacional, o varejo catarinense tem apresentado quedas no volume de vendas.

Considerações finais

Com os resultados divulgados da PMC-IBGE no mês de setembro com dados referentes a julho de 2022, apontam para a retração do varejo no cenário nacional, resultado que reflete o quadro macroeconômico desfavorável ao setor, com a continuidade da alta da taxa de juros básica, a alta inflação persistente, a dificuldade de acesso ao crédito e a corrosão do poder de compra. No estado catarinense, por sua vez, foi registrada a segunda retração consecutiva, que sinaliza uma desaceleração do cenário expansivo no estado, porém na comparação com os resultados nacionais, o estado ainda continua em patamares superiores.

Apesar dos péssimos resultados no primeiro mês do segundo semestre de 2022, as expectativas para o período são otimistas, a partir de agosto o setor deve ter expansão significativa com a injeção dos recursos provenientes da PEC das Bondades, como a ampliação do Auxilio Brasil, vale gás, e as transferências para algumas categorias, como caminhoneiros e taxistas. Além disso, com a redução dos preços dos combustíveis que tem corroído grande parte da renda da população, outros segmentos devem ser impulsionados pela redução dos custos e aumento do consumo.

Com os dados recentes a Confederação Nacional do Comércio (CNC) revisou a expectativa de crescimento no ano de 1,7% para 1,3%, após a expectativa de crescimento de 0,3% ser frustrada por uma queda de -0,7% no mês de julho. Porém a entidade se mostra otimista, com a PEC das Bondades e com eventos extraordinários como a chegada do 5G e o Mundial de Futebol que tendem a aquecer a demanda em determinados segmentos, no decorrer de 2022. (CNC, 2022)

Deste modo, nos próximos meses o varejo deve receber um fôlego com os recursos previstos, e que devem ter uma parcela direcionada ao consumo, o setor trabalha com essa hipótese para reverter os recentes resultados negativos, e estabelecer um ritmo de crescimento solido.

Referências

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Mensal do Comércio. (PMC). Rio de Janeiro (RJ): IBGE, julho de 2022.

IEDI – INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Análise IEDI: Comércio Varejista No vermelho novamente. [S. l.], 14 set. 2022. Disponível em: https://www.iedi.org.br/artigos/top/analise/analise_iedi_20220914_varejo.html Acesso em: 19 set. 2022.

CNC – CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO COMÉRCIO. DEFLAÇÃO NÃO IMPULSIONOU VENDAS NO VAREJO. [S. l.], 14 set. 2022. Disponível em: https://www.portaldocomercio.org.br/publicacoes/analise-cnc-da-pesquisa-mensal-do-comercio-julho-de-2022/440907. Acesso em: 21 set. 2022.


* Graduando em Ciências Econômicas na UFSC e bolsista do NECAT. E-mail: guilhermerazzini33@gmail.com