O setor de serviços no Brasil e em Santa Catarina no mês de maio

05/08/2020 11:12

Por: Lauro Mattei [1] e Vicente Loeblein Heinen [2]

A pandemia causada pelo novo coronavírus afetou a economia em praticamente todos os países do mundo, causando grandes quedas nas atividades ao longo do primeiro semestre de 2020. Com isso, organizações internacionais, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Nacional, estimam que o Produto Interno Bruto (PIB) da economia mundial poderá recuar em até cinco pontos percentuais no corrente ano, sendo que em alguns blocos regionais esse valor poderá atingir até 10 pontos negativos. Para o Brasil, esses organismos estimaram um resultado negativo entre 6 a 8 pontos percentuais.

Diante do peso do setor de serviços na composição do PIB brasileiro[3], é importante analisar a trajetória recente desse setor, tanto no país como em Santa Catarina, conforme Gráfico 1. Os indicadores relativos aos serviços nos últimos três anos (2017-2019) revelaram que, independentemente de algumas particularidades da economia catarinense, seu comportamento guarda estreita relação com os movimentos da economia nacional. De um modo geral, observa-se que em ambos os casos o volume de serviços registrado nos últimos anos ficou muito abaixo do patamar observado no período anterior à crise econômica iniciada em 2015. Com isso, nota-se que o volume de serviços auferidos no Brasil ao longo do ano de 2019 foi aproximadamente 10% inferior ao verificado no ano de 2014 (data-base da série histórica), enquanto o volume de Santa Catarina ficou cerca de 15% abaixo desse nível

Gráfico 1: Volume de serviços (índice base fixa com ajuste sazonal, 2014=100)

Gráfico 1

Além disso, as informações contidas no Gráfico 1 mostram que o volume de serviços no Brasil se manteve praticamente estável entre o início dos anos de 2017 e de 2020. Já em Santa Catarina observou-se uma leve tendência de crescimento no período posterior à greve dos caminhoneiros (maio de 2018) até os primeiros meses de 2019. A partir de então, houve uma estagnação do setor no estado, a qual se manteve até o início da pandemia.

É neste contexto que os dados e informações da Pesquisa Mensal dos Serviços (PMS) do IBGE, relativa ao mês de maio e divulgada em 10.07.20, precisam ser interpretadas. Para tanto, dando continuidade às análises já realizadas sobre esse setor pelo NECAT-UFSC, esse texto analisa o comportamento do setor de serviços no estado de Santa Catarina no mês de maio de 2020, à luz do comportamento nacional do referido setor. Os dados e informações têm como referência a Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) do IBGE.

O COMPORTAMENTO DOS SERVIÇOS POR TIPO DE ATIVIDADE NO BRASIL

O Quadro 1 (extraído da PMS de maio de 2020) apresenta o comportamento do setor de serviços no período entre março e maio, meses que as influências da pandemia causada pelo novo coronavírus mais exerceu suas influências. Assim, nota-se que a variação para esse período foi de -18,8% para o conjunto do país, sendo que o resultado foi negativo para todos os setores considerados pela PMS.

Quadro 1: Perda acumulada com a pandemia (%) – série com ajuste sazonal

Quadro 1

No âmbito do setor de Serviços prestados às famílias, que apresentou uma queda acumulada de -56,9%, destaca-se a queda de -62,2% do subsetor de Alojamento e alimentação, bem como de -45,6% do subsetor Outros serviços prestados às famílias. Já o setor de Transportes, serviços auxiliares dos transportes e correios apresentou a segunda maior queda no período (-21,6%), sendo que grande parte dela foi puxada pelo subsetor de transportes aéreos (- 78,6%) e pelo subsetor transporte terrestre (-24,1%). O setor de Serviços profissionais, administrativos e complementares apresentou a terceira maior queda (-17,3%), sendo que grande parte dela ocorreu devido à queda de 18,7% no subsetor de serviços administrativos e complementares. O setor de Serviços de informação e comunicação apresentou a menor queda dentre todos os setores (-6,6%), sendo que grande parte dela foi puxada pelo subsetor de serviços audiovisuais, de edição e agências de notícias. Finalmente, o setor de Outros serviços apresentou queda acumulada no período de 12,4%.

Em síntese, pode-se dizer que a queda acumulada no trimestre em que a pandemia mais exerceu seus impactos sobre as atividades econômicas (março-maio) deve-se, fundamentalmente, aos resultados negativos apresentados pelos subsetores de transportes aéreo e terrestre, pelos subsetores de alojamento e alimentação e de serviços prestados às famílias e pelo subsetor de serviços administrativos e complementares.

Esses percentuais anteriores são distribuídos no tempo, conforme Quadro 2, que apresenta comparações dentre os setores para vários períodos. Desta forma, verifica-se que nos meses de março e abril todos os setores e seus respectivos subsetores apresentaram variações negativas, conforme análise mencionada no documento referenciado na nota de rodapé número 3. Tal fato resultou em queda expressiva no agregado nacional. Todavia, no mês de maio, ocorreram diversas alterações, com alguns setores e subsetores reagindo ao cenário anterior e apresentando resultados positivos.

Quadro 2: Variação do índice de volume de serviços, por atividades de serviços e suas subdivisões (Brasil, março a maio de 2020, em %)

Quadro 2

Assim, quando se utiliza o corte temporal do mês em apreço (maio) com relação ao mês anterior (abril), verifica-se que dois setores (Serviços prestados às famílias, com 14,9%, e Transportes, serviços auxiliares aos transportes e correio, com 4,6%) apresentaram resultados positivos. Em grande medida, esse comportamento se deve à recuperação do subsetor de serviços de alojamento e alimentação (4,1%), no primeiro caso, e a recuperação do subsetor de transporte aéreo (9,2%) e terrestre (6,6%), no segundo caso. Já três setores (Serviços de informação e comunicação, com -2,5%; Serviços profissionais, administrativos e complementares, com -3,6%; e Outros serviços, com -4,6%) apresentaram resultados negativos, razão pela qual a variação se manteve negativa em 0,9%.

Porém, quando se compara os resultados de maio de 2020 com igual mês do ano anterior, a queda agregada para o país salta para 19,5%. Neste caso, nota-se que todos os setores de serviços apresentaram resultados negativos e de forma expressiva. Os principais subsetores responsáveis por esse comportamento foram: alojamento e alimentação, outros serviços prestados às famílias, transportes aéreos, transporte terrestre, serviços administrativos e complementares e serviços audiovisuais, de edição e agências de notícias.

Por fim, o resultado acumulado nos últimos doze meses também se mostrou negativo (- 2,7%), sendo que apenas dois setores apresentaram resultados positivos: serviços de informação e comunicação, com 0,8%, e outros serviços, com 6,4%.

Esse comportamento decorre de reações distintas observadas nas unidades da federação no último mês, conforme Gráfico 5 extraído da PMS de maio de 2020 que compara informações desse período com mês anterior, apresentando as informações com série ajustada sazonalmente. Verifica-se a existência de dois grupos de unidades federativas: o primeiro, composto por quinze estados mais o Distrito Federal (DF), apresentou resultados negativos, destacando-se o caso do DF com uma taxa de -13,9% em relação ao mês anterior. Já o segundo grupo, composto por outras onze unidades da federação, apresentou resultados positivos, cujos valores vão de 0,5% (PR) até 6,4% (SC), o maior percentual positivo. Segundo o IBGE, esse valor obtido pelo estado catarinense decorre do melhor desempenho nos segmentos de transportes rodoviário de cargas e de alojamento e alimentação. Todavia, deve-se registrar que tal resultado de SC, quando comparado a igual mês do ano anterior, teve variação negativa de 20,5%, valor superior, inclusive, ao do agregado nacional, que foi de 19,5%.

Quadro 5

O COMPORTAMENTO DO SETOR DE SERVIÇOS EM SANTA CATARINA

O Quadro 3 apresenta a variação percentual de diversos indicadores de volume de serviços em Santa Catarina, comparativamente ao país. Do ponto de vista da variação no mês de maio em relação ao mês anterior, nota-se que Santa Catarina apresentou uma variação positiva de 6,4%, enquanto o país apresentou uma variação ligeiramente negativa (-0,9%). Todavia, ao se considerar essas informações em relação ao mesmo mês do ano anterior, verifica-se que a variação negativa ocorrida em Santa Catarina (-20,5%) foi maior que aquela apresentada pelo conjunto do país (-19,5%).

Quando se considera o acumulado do ano com igual período do ano anterior, nota-se que no período de janeiro-maio a variação negativa novamente foi maior em Santa Catarina (-9,0%), comparativamente ao conjunto do país (-7,6%). Além disso, quando se considera o mês de maio em relação aos últimos 12 meses anteriores, observa-se que a variação negativa de Santa Catarina (-4,2%) também foi superior à varia negativa do país (-2,7%).

Quadro 3: Variação % de indicadores do volume de serviços no Brasil e em Santa Catarina, maio de 2020

Quadro 3

A figura seguinte, retirada da PMS/IBGE de maio de 2020, apresenta o comportamento dos cinco setores de serviços pesquisados no estado de Santa Catarina, segundo o volume desses serviços. Como vimos anteriormente, a variação do mês de maio em relação ao mesmo mês do ano anterior foi negativo em 20,5%. Dentre os diversos setores de serviços, destaca-se que os Serviços prestados às famílias apresentaram uma variação negativa da ordem de 45,4% quando esse resultado é comparado ao igual mês do ano anterior. Porém, quando se considera o acumulado de janeiro a maio em relação ao mesmo período do ano anterior, nota-se que a variação negativa ficou em 22,4%. Por fim, o resultado atém maio em relação aos doze meses anteriores foi de -9,6%.

Já o setor de Transportes, serviços auxiliares de transportes e correio apresentaram um resultado negativo da ordem de 17,1% quando comparado ao igual mês do ano anterior. Já quando se considera o acumulado entre janeiro-maio em relação ao mesmo período do ano anterior, verifica-se que a queda foi de 6,6%.

Quanto às atividades de serviços profissionais, administrativos e complementares, nota-se que apresentaram um resultado negativo da ordem de 21,4% quando comparado ao igual mês do ano anterior. Já quando se considera o acumulado no período janeiro-maio, verifica-se que a queda foi de 7,8% em relação ao mesmo período do ano anterior. Por fim, o resultado até maio em relação aos últimos doze meses anteriores foi negativo da ordem de 4%.

quadro 4

As demais atividades, nos respectivos períodos anteriormente mencionados, apresentaram os seguintes resultados, respectivamente: Serviços de informação e comunicação com -19,4%, – 9,4% e -6%; Outros serviços com -6,3%, 1,1 e 4,5%.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As informações disponibilizadas pela PMS de maio de 2020 revelaram a importância do setor de serviços para produção agregada do país, bem como para todas as unidades da federação, dado o peso decisivo das atividades de serviços na dinâmica econômica atual. Portanto, no contexto da crise econômica em que se encontra o país, entendemos que qualquer melhoria dependerá do comportamento do setor de serviços nos próximos períodos. Caso os efeitos da pandemia sejam mais prolongados que aqueles inicialmente previstos, dificilmente esse setor terá fôlego suficiente para reverter os resultados negativos previstos para o conjunto da economia do país no ano de 2020. Isto porque o setor terciário da economia responde por mais de 70% da produção.

Nesta direção, os dados de maio para o conjunto do país continuaram pouco alentadores, uma vez que o resultado no trimestre em que a pandemia mais exerceu seus impactos sobre as atividades econômicas (março-maio) continuou negativo, ainda que tenham ocorridas melhorias pontuais em diversos subsetores como o de transportes aéreo e terrestre e os subsetores de alojamento e alimentação e de serviços prestados às famílias. Mesmo assim, a variação do mês atual em relação a igual mês do ano anterior foi negativa da ordem de 19,5%.

No caso particular de Santa Catarina, apesar de apresentar uma variação positiva de 6,4% no mês de maio em relação ao mês anterior, deve-se registrar que quando se compara esse mês (maio) a igual período do ano anterior, observa-se um resultado negativo da ordem de 20,5%. Além disso, o acumulado de janeiro-maio em relação ao mesmo período do ano anterior foi negativo em 9,0%.

Portanto, esses dados e informações particulares de Santa Catarina não explicitam nenhum motivo para comemoração, a exemplo do que fez a administração atual do estado ao divulgar apenas um dado pontual de maio desconectado de toda a trajetória negativa dos períodos anteriores. Isto porque todas as comparações metodológicas definidas pela PMS são amplamente desfavoráveis ao desempenho atual desse setor no estado.

REFERÊNCIAS 

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Indicadores IBGE: Pesquisa Mensal de Serviços. Rio de Janeiro: IBGE, maio de 2020.


[1] Professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais e do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador Geral do NECAT-UFSC e Pesquisador do OPPA/CPDA/UFRRJ. Email: l.mattei@ufsc.br

[2] Estudante de Economia na UFSC e bolsista do NECAT. E-mail: vicenteheinen@gmail.com

[3] Para maiores esclarecimentos, veja artigo “A queda do setor de serviços no Brasil e em Santa Catarina no mês de abril de 2020”, publicado no blog do NECAT em 19.06.2020.